(*) Marli Gonçalves –
Os retos estão rotos, e os ratos na rota. No ninho da mafagafa, tem muito mais do que sete mafagafinhos, e quem desmafaguizar, bom desmafaguizador será. O momento nacional está totalmente trava-línguas, e o embate está de botar a língua para fora, fora que tem um monte de língua presa aí no meio. Eu não sou robô, viu?
Perigo, perigo, Will Smith! Alertaria B9, aquele robô enorme e bonachão de Perdidos no Espaço, batendo descoordenadamente seus braços. “Vocês estão cercados”, diria. “Perigo, perigo”. Mas aquele lá era inofensivo e os com os quais esbarramos hoje por aí não o são. Foram robôs muitas daqueles e daquelas “pessoas” que tentaram ou – talvez até – tenham conseguido influenciar você nas redes sociais espalhando elogios para a presidente que queriam reeleita e disparando torpedos contra quem quer que fosse tentar puxar você, mostrar, alertar, contando que a verdade não era bem aquela tão linda, doce e de progresso que apresentavam. Robôs, alimentados com contrainformação por blogs e sites, estes capitaneados por gente de carne e osso, programando enxames. Até o humorista levaram a peso de boladas, debaixo de moedas tilintantes. Dá hipnose coletiva.
Os milhares de robôs que atuaram foram revelados esses dias, em documento oficial do governo que sem querer foi passear nas redações para se mostrar. Fiquei até pensando (e me apavorando com a simples ideia da possibilidade de vida própria dos robôs, inteligência artificial, essas coisas) se essa, esse vazamento, não foi uma armação dos próprios robôs, solidários com os seus iguais. Afinal, pelo documento ficamos sabendo que a imensa maioria deles havia sido desligada depois da campanha, e havia uma proposta para que os religassem. Robô também gosta de viver. Vai ver foi isso, foram eles que vazaram o documento. Mostraram que quando pararam de mentir, como exército de zumbis, a popularidade caiu dentro do poço.
Encafifei com os tais robôs. Minha imaginação chegou a desenhá-los em forma de traços com retratos 3 X 4 falsos e nomes e vidas falsas. Mas a coisa e séria, os robôs estão dominando o mundo e não só no campo virtual. Melhor saber mais deles. Pior foi que vi que nem robô quando ligado aqui no Brasil anda na linha.
Descobri que já nasceram com regras, uma espécie de Constituição dos robôs, as leis propostas por Isaac Asimov, o escritor e bioquímico que é o pai literário das crianças. Primeira Lei: “Um robô não pode ferir um ser humano ou, por omissão, permitir que um ser humano sofra qualquer mal”. Segunda Lei: “Um robô deve obedecer as ordens que sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei”. Terceira Lei: “Um robô deve se defender, mas desde que para tal não entre em conflito nem com a Primeira e nem com a Segunda Lei”.
Na verdade, os robôs são escravos submetidos aos humanos, e agora é que eu vou ficar mesmo com medo deles, pensando numa possível revolta. Se tiver pesadelos, a culpa será do governo, dos governos, todos. Eu disse todos.
Mas deixando de lado os robôs, que beleza está a vida real, animada e quase folclórica, para não dizer teatral. Senão, vejamos: Collor recebe e discute pacote anticorrupção; na Pátria Educadora, Vagas para Ministro, entregue seu curriculum na portaria; senador diz que CIA financia protestos. Milhões saem às ruas, e outro mafagafo, ops!, ministro, primeiro fala que é “fotografia”, depois diz que precisamos virar a página, sendo que nem a lemos ainda, muito menos nos revelamos todos.
Dona Marta joga bombas e tachinhas na estrada que percorreu. Zé Celso encena com fezes. Humanas. Feitas ali, na hora, por outro ator, para “trazer ao palco uma grandeza que é da nossa essência mais íntima”, assegura o defecador, com ardor.
Um mafagafinho arretado e me parecendo muito medicado – queria até saber o que foi que ele tomou – todo poderoso, deixa o hospital, viaja e tal qual Quixote, lança em punho e dedo apontado, adentra o Congresso da Távola Redonda, diz poucas e boas e sai. Para sair da História. Arroubo.
Sobre os rombos, uma senhora idosa, a Dona Corrupção, entra em cena. Trazida pela presidente numa conversa fiada em horário desestipulado, perfeito para tentar desestimular o batucar das panelas que têm falado alto o quanto tudo precisa mudar, a começar pela insistente cegueira. Acompanhada de surdez. Na muda e na miúda estamos nós.
Nem me fale das arrobas. Essas estão mais inquietas ainda.
São Paulo, 2015
(*) Marli Gonçalves é jornalista – Conto que mafagafos são monstrinhos imaginários, desses que a gente inventa pra criança temer? Ou conto que significa abrigo de malandros?
Tenho um blog, Marli Gonçalves, divertido e informante ao mesmo tempo, no http://marligo.wordpress.com. Estou no Facebook. E no Twitter @Marligo