Escândalo envolvendo a compra de medicamento contra um tipo de câncer deve chacoalhar o governo

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Um novo escândalo está prestes a eclodir na Esplanada dos Ministérios. O imbróglio tem como foco a compra de medicamentos para tratamento da Leucemia Linfoblástica Aguda (LLA), doença que afeta principalmente crianças. A LLA é um tipo de câncer em que a medula óssea produz de forma excessiva linfócitos não maduros (um tipo de glóbulo branco) que acabam por atacar os glóbulos brancos e vermelhos, além das plaquetas.

Em abril de 2013, o Ministério Público Federal em São Paulo recomendou ao Ministério da Saúde a adoção imediata de medidas que garantissem a continuidade do abastecimento do medicamento L-asparaginase na rede de hospitais públicos e privados do País. A L-asparaginase, cujo nome comercial é Elspar, é o mais indicado para o tratamento de Leucemia Linfoide Aguda. Em crianças, a chance de cura com a utilização da L-asparginase é de 80% a 90%.

A droga deixou de ser fabricada pelo fornecedor do Laboratório Bagó, importador do medicamento para o Brasil, mas até agora nada foi feito para permitir o abastecimento regular nos hospitais públicos e privados. De tal modo, o Bagó, à época dos fatos, diante da dificuldade de encontrar um novo medicamento, recomendou aos profissionais de saúde do País que “reavaliassem o protocolo de tratamento da Leucemia Linfocítica Aguda” durante os seis meses restantes de distribuição do remédio. A distribuição foi interrompida em junho daquele ano.

Infelizmente, o presidente Michel Temer (PMDB) não cumpriu a promessa de formar um governo com profissionais que são referência em suas áreas, sendo obrigado a, repetindo a antecessora, lotear de maneira escandalosa a Esplanada dos Ministérios.

Causou espécie na formação do governo atual a decisão do presidente da República de entregar o Ministério da Saúde ao deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), que nada entende do setor e tem no currículo alguns casos polêmicos, inclusive de corrupção e peculato.

Não obstante, alguns próceres do Partido Progressista só endossaram a nomeação de Barros com a condição de fazer indicações na pasta. É nesse exato ponto que reside o problema maior, pois o objetivo das indicações, como se sabe, é pouco republicano. E não custa lembrar que o PP é, pelo menos por enquanto, o partido com o maior número de políticos flagrados no Petrolão e investigados na Operação Lava-Jato.

O problema em relação à L-asparaginase está no baixo valor de comercialização do medicamento e a pequena demanda. Mesmo assim, o medicamento é essencial para milhares de crianças brasileiras que sofrem de Leucemia Linfoblástica Aguda. Segundo a médica Carmem Vergueiro, presidente da Associação da Medula Óssea no Estado de São Paulo, “o medicamento tornou-se barato e, com demanda restrita, imaginamos, não lucrativo para a produção industrial”.

A importação é, hoje, a única solução imediata para o problema. “A perspectiva é sombria: não temos droga similar no mercado nacional. Segundo informações informais da indústria farmacêutica, a produção do medicamento no país levaria em torno de dois anos”, completou a médica.


Cerca de 3 mil pessoas recebem anualmente tratamento contra leucemia linfóide aguda no Brasil. Segundo a médica Carmem Vergueiro, a leucemia linfóide aguda é o câncer de maior frequência na infância. O índice de cura atinge 95% nas crianças e de 30% a 60% entre jovens e adultos.

Em 2013, procuradora da República Adriana Scordamaglia enviou ofício para a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, em Brasília, solicitando informações sobre “quais medidas estavam sendo tomadas para garantir a regularidade do fornecimento da medicação”. O objetivo era evitar que os pacientes fossem expostos “ao risco da redução de chances de cura, que será a consequência da falta da medicação”.

A procuradora também enviou recomendação à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que o órgão emitisse parecer sobre a importação direta do medicamento Aginasa, substituto do Elspar fabricado pelo laboratório alemão Medac. A legislação brasileira veda a importação de medicamentos sem manifestação favorável da Anvisa, mas o laboratório alemão já foi inspecionado e aprovado pela agência. O Aginasa é comercializado em 180 países, o que mostra a eficácia do medicamento.

Agora, quase quatro anos depois de solucionado o problema, o Ministério da Saúde está mergulhado em uma operação que, pela aparente concepção, remete ao polêmico Laboratório Labogen. Para quem não se recorda, o Labogen pertencia ao doleiro Alberto Youssef e cujo objetivo era, com a aquiescência do então ministro da pasta e o apoio de petistas ilustres, produzir a versão genérica do estimulante sexual Viagra. Um escândalo sem precedentes e que certamente causaria enorme prejuízo aos cofres públicos.

Voltando ao caso da Leucemia Linfoblástica Aguda… O Ministério da Saúde encontra-se em fase avançada nas negociações com o laboratório farmacêutico uruguaio, que também produz medicamento para o tratamento da mencionada doença. Contudo, o laboratório uruguaio não tem aprovação da Anvisa e sequer recebeu visita de autoridades brasileiras para checar as condições de produção do medicamento. Um graduado servidor do Ministério da Saúde, que ocupa lugar de destaque na estrutura da pasta, em conversa com pessoas próximas, disse sem constrangimento: “O que vale é o preço, as crianças que morram”.

Tal afirmação, estapafúrdia e criminosa, é fruto de uma diferença nos preços dos medicamentos dos laboratórios alemão e uruguaio. O Aginasa (alemão) é mais caro, mas tem sua eficácia comprovada por autoridades e profissionais de saúde de 180 países, ao passo que o medicamento uruguaio, que é fabricado na China, não conta sequer com o endosso da Anvisa.

O que se tenta com essa operação é credenciar o laboratório uruguaio no Brasil, o que abriria um vasto e rentável caminho para novas negociações envolvendo medicamentos diversos. Algo parecido com que Youssef tentou fazer com o misterioso e finado Labogen.

Não se trata de questionar a idoneidade do laboratório uruguaio, mas a fala do integrante do Ministério da Saúde sugere que há algo errado nessa história. Segundo apurou o UCHO.INFO, o assunto teria chegado ao quarto andar do Palácio do Planalto e irritado o presidente Michel Temer.

É importante ressaltar que Temer planeja para breve uma reforma ministerial, possivelmente em fevereiro. Isso significa que, a essa altura dos acontecimentos, o Ministério da Saúde já entrou no radar da dança de cadeiras. E salve-se quem puder!

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