Boas intenções também ardem no inferno

(*) Percival Puggina

(Foto: Nadia Raupp Meucci)
(Foto: Nadia Raupp Meucci)
Em discurso tão inflamado quanto lhe permite a dificuldade de expressão, a presidente Dilma justificou as pedaladas fiscais perante uma plateia amiga. O fato aconteceu no último dia 13, em São Bernardo do Campo, durante a abertura oficial do 1º Congresso Nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores. Como tem feito nos últimos meses, saiu de casa para falar em casa. É o jeito de escapar das vaias.

Disse a presidente que as pedaladas foram usadas para pagar o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida, os dois maiores programas sociais do governo. Quer dizer, ela teria agido sob o manto das mais nobres intenções. E, apesar disso, concluo eu, os nove ministros “golpistas” do Tribunal de Contas da União lhe rejeitaram as compassivas contas. Esse discurso da presidente escamoteou pelo menos dois fatos.

Primeiro, além de dar sumiço no dinheiro, deu sumiço no motivo pelo qual faltou dinheiro para aqueles programas. Refiro-me às irresponsáveis injeções de esteroide anabolizante que ela aplicou, como doping, em outras ações do governo para dar-lhes musculatura financeira, multiplicar o número de beneficiários e trombeteá-las como medalhas de ouro durante a campanha eleitoral. O leitor destas linhas haverá de lembrar que Dilma e todos os candidatos da corte governista, eleitoralmente beneficiados com tal esbanjamento, percorreram o país discursando, à exaustão, sobre a prodigalidade oficial que se expressava, entre outros, nos programas FIES, Pronatec e Minha Casa Melhor. Com isso, empilharam votos e elegeram as numerosas bancadas que agora se veem às voltas com necessárias explicações que ditas boas intenções passam a exigir.

Segundo, escamoteou algo que é óbvio perante toda consciência bem formada: a necessária compatibilidade moral entre os meios e os fins. Se lá na ponta da decisão de sair pedalando com os recursos públicos havia um fim bom (atender dois programas sociais para os quais os recursos haviam secado) e um melhor ainda (angariar votos para a presidente e seu partido), o meio usado para isso foi ilícito e contrário à norma constitucional. A manobra tornou-se ainda mais óbvia a partir do momento em que, obtido o resultado eleitoral, a tesoura se apresentou furando os inflados programas eleitoreiros de 2014 do mesmo modo como tentam fazer com os pixulecos em 2015.

(*) Percival Puggina é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de “Crônicas contra o totalitarismo”; “Cuba, a Tragédia da Utopia”, “Pombas e Gaviões” e “A Tomada do Brasil – Pelos maus brasileiro”. Integrante do grupo Pensar+ e membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

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