Bolsonaro “não nasceu para ser presidente”, mas quer a reeleição; parlamentarismo fora de cogitação

Que Jair Bolsonaro não escreve, sentado, o que fala em pé todos sabem. Que o presidente da República é um tremendo trapalhão quando o assunto é política também não resta dúvida. O pior, para complicar ainda mais o cenário atual, é que o capitão tem dificuldade para interpretar pesquisas de opinião, mesmo que ele não queira “perder tempo com o Datafolha”.

Eleito na esteira da fanfarronice que marcou sua campanha à Presidência da República e sem ter como entregar o que prometeu aos eleitores, Bolsonaro vem apostando no recrudescimento do discurso de ódio, que provoca a divisão da sociedade, como forma de continuar no Poder e manter intacta a parcela radical dos seus apoiadores.

Na segunda-feira (8), em entrevista à rádio Jovem Pan, Jair Bolsonaro admitiu a possibilidade de se candidatar à reeleição, em 2022. Contudo, o presidente condicionou uma eventual candidatura à reeleição à aprovação de uma reforma política para reduzir o tamanho da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Além disso, Bolsonaro afirmou que só será candidato se seu quadro de saúde continuar evoluindo positivamente.

“A pressão está muito grande para que se eu estiver bem, que me candidate à reeleição”, disse o presidente à Jovem Pan, em entrevista concedida no Palácio do Planalto.

A mais recente pesquisa Datafolha mostra de maneira clara e absolutamente inequívoca que a aprovação de Bolsonaro junto à opinião pública despencou desde sua chegada ao Palácio do Planalto, portanto não pode haver “pressão muito grande” para que ele tente a reeleição. Esse discurso é misto de devaneio com desespero de quem começa a sentir os efeitos colaterais da própria incompetência.


Além disso, causa estranheza o fato de Bolsonaro falar em pressão para um novo mandato, pois ele mesmo afirmou, na última sexta-feira (5), em evento com servidores palacianos, que “não nasceu para ser presidente, mas para ser militar”. Ora, se alguém não tem vocação para determinada função, insistir em permanecer no cargo é teimosia ou excesso de masoquismo. Em suma, o discurso é embusteiro e como tal não convence.

Não obstante, o palavrório de Bolsonaro, se analisado por outro prisma, explica suas recentes atitudes e declarações na direção da classe política, mas precisamente o Congresso Nacional. Ao atacar os parlamentares, com quem não consegue construir um diálogo positivo e favorável ao País, o presidente joga para o seu eleitorado, que mais adiante sairá às ruas, em número reduzido, para cobrar sua reeleição.

No momento em que enfrenta sérias dificuldades para costurar um acordo político no Congresso que garanta a aprovação da reforma da Previdência, Bolsonaro retoma o discurso provocativo e volta a atacar os parlamentares.

Ao afirmar que, em caso de eventual candidatura, não fará como muitos políticos, cuja reeleição torna-se uma espécie de “desgraça” que viabiliza-se à sombra de “acordos espúrios que levam a escândalos de corrupção”, o presidente resgata o “toma lá, dá cá”, que há dias ele prometeu não mais utilizar.

Bolsonaro prometeu que, caso seja candidato, fará diferente de outros políticos brasileiros, cuja reeleição, segundo ele, acaba se tornando uma espécie de “desgraça”, e que só se tona possível por meio de “acordos espúrios que levam a escândalos de corrupção”.

Não se pode fechar os olhos para o fato de que Bolsonaro, ao falar sobre a possibilidade de concorrer a novo mandato presidencial, após três conturbados meses de governo, está mandado uma mensagem cifrada ao Congresso e à sociedade: que ninguém ouse falar em parlamentarismo. Afinal, o presidente já mostrou as garras. Resta saber se são afiadas o suficiente para intimidar quem está do outro lado da Praça dos Três Poderes. A conferir!