Prisão em 2ª instância: ironia de Alcolumbre tornou-se algo sério no rastro de explicações desnecessárias

A primeira declaração do presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sobre a convocação de uma nova Constituinte para solucionar a panaceia que se formou no entorno da prisão após condenação em segunda instância certamente foi marcada por ironia, como ele próprio afirmou. O que era para ser uma sugestão bem-humorada acabou ganhando contornos oficiais quando Alcolumbre aceitou a provocação dos jornalistas e decidiu explicar o que não carecia de explicação, apenas de uma provocação aos que discordam da Carta Magna.

É preciso que políticos, autoridades e a população em geral aceitem que a formação de culpa se dá apenas após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, como determina a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LVII. Qualquer tentativa de mudança do texto constitucional, violando os direitos e garantias constitucionais, é oportunismo barato mesclado a devaneio jurídico.

Que a política brasileira existe sobre os pilares da polarização todos sabem, mas querer mudar uma cláusula pétrea da Constituição ou violar o preceito da presunção da inocência é mais um golpe rasteiro de quem supostamente defende a moralidade, ao mesmo tempo em que desrespeita a lei máxima do País. A Constituição, como já afirmamos em matéria anterior, é um tratado, fruto de longos estudos, para que a sociedade consiga conviver harmoniosa e pacificamente, sem que direitos sejam violados de parte a parte.

A insistência de alguns políticos em, reverberando a sanha persecutória que brota na sociedade, defender a prisão em segunda instância é algo tão enfadonho, que o mínimo que se pode fazer é sugerir aos inconformados que convoquem uma Constituinte para mudar o texto da Carta. O próprio editor do UCHO.INFO já sugeriu isso àqueles que não desistem do tema. Até porque, se os incomodados não querem se mudar, como prega o adágio popular, que tentem de alguma maneira promover uma mudança.

É fato que a propositura de nova Constituinte não cabe no cenário atual da nação, em especial porque a Carta completou recentemente três décadas, tempo exíguo para se sonhar com uma mudança no texto da lei maior da nação. Caso isso acontecesse, em risco estariam muitas das liberdades conquistadas pelo cidadão a partir de 1988, o que não é bom para a democracia nem para o Estado de Direito.


A polêmica envolvendo a declaração de Alcolumbre passa pela necessidade de se mostrar aos defensores da prisão em segunda instância que isso só será possível com uma nova Constituinte, já que na Carta em vigência o tema está muitíssimo bem abrigado em cláusula pétrea, o que impossibilita mudanças no texto, por maior que seja o bamboleio interpretativo dos afoitos.

Propor a convocação de nova Constituinte é uma aberração se o assunto for levado a sério, mas configura dura resposta – talvez definitiva – aos que não abandonam a cantilena em favor da prisão em segunda instância. Se os parlamentares se dedicassem com o mesmo afinco a outros assuntos de interesse do País, por certo o Brasil não estaria encontrado dificuldades para sair do atoleiro da crise econômica.

Muito tem se falado sobre a situação financeira privilegiada de alguns réus que conseguem contratar bons e caros advogados, o que permite, em tese, sucesso na interposição de recursos judiciais, mas faz-se necessário ressaltar que não é essa a realidade dos fatos. Recente pesquisa revelou que defensores públicos têm conseguido melhor índices de sucesso do que os advogados particulares quando recorrem ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra decisões de instâncias inferiores do Judiciário.

Em outras palavras, é falaciosa a afirmação de que apenas os ricos conseguem recorrer com sucesso às instâncias superiores da Justiça. Diante dessa constatação, fica claro que a recente decisão do STF de barrar a prisão em segunda instância foi não apenas acertada, mas, acima de tudo, isonômica. Até porque, os menos privilegiados financeiramente também têm direito à presunção de inocência. De igual modo, é mentirosa a firmação que circula na rede mundial de computadores que a decisão do Supremo colocará nas ruas homicidas, estupradores e outros criminosos perigosos.

Para concluir, já considerando que a barafunda chamada Brasil é seara para profissionais, até mesmo para ser irônico é preciso competência. Como reza a sabedoria popular, “quem não tem competência. não se estabelece”.