STF é cobrado por causa de crucifixo no plenário, mas sociedade esquece sumiço no Palácio do Planalto

Dois lados – Do que padece o brasileiro quando o assunto é política? Desinteresse ou memória curta. Sem esses dois instrumentos é impossível manter em condições mínimas o que muitos insistem em classificar de Estado Democrático de Direito.

Há dias, o Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, atendendo a pedido da Liga Brasileira de Lésbicas e de algumas outras entidades, decidiu pela retirada dos crucifixos e outros símbolos religiosos das repartições da Justiça gaúcha. Na decisão, o Conselho justificou que o Estado é laico.

Aproveitando a decisão dos magistrados da terra de chimangos e maragatos, o presidente da Ordem dos Advogados do Rio de Janeiro (OAB-RJ), Wadih Damous, afirmou que o crucifixo existente no plenário do Supremo Tribunal Federal é inconstitucional. De acordo com Damous, além ignorar a separação entre Igreja e Estado, “princípio republicano básico”, o objeto, neste caso o crucifixo, desrespeita os que adotam crenças diferentes.

“Não cabe a qualquer órgão público de qualquer esfera impor esse ou aquele símbolo religioso”, afirmou o presidente da OAB-RJ em nota. “Não existe religião oficial do Estado. Por este motivo, foi acertada a decisão tomada pelo Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul de retirar crucifixos e demais símbolos dos espaços públicos dos prédios da Justiça estadual gaúcha”, completou o advogado na nota distribuída pela instituição.

Surrupio palaciano

Se a mais nova preocupação desses vigilantes das leis tem no cardápio os símbolos religiosos existentes nas repartições públicas, que esses atentos cidadãos cobrem de Luiz Inácio da Silva explicações sobre o sumiço do crucifixo que estava fixado no gabinete presidencial do Palácio do Planalto.

Tão logo o ex-metalúrgico desocupou o Palácio do Planalto, dando vaga à companheira Dilma Rousseff, o ucho.info publicou matéria alertando para o misterioso desaparecimento do objeto que fazia parte da decoração do gabinete. A polêmica só veio à tona porque suspeitou-se que a presidente Dilma tivesse ordenado a retirada do crucifixo e de uma cópia da Bíblia de seu gabinete. Para evitar novos conflitos com a comunidade cristã, que ficou estremecida com a defesa de Dilma em favor do aborto, a assessoria palaciana foi célere ao explicar os fatos.

Disse a assessoria de imprensa presidencial, à época, que o exemplar da Bíblia continuava no gabinete presidencial e que o tal crucifixo pertencia ao ex-presidente Lula. Ministra-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, a jornalista Helena Chagas informou no Twitter, como é possível conferir nas imagens abaixo, que “a peça é do ex-presidente Lula e que foi na mudança”. Em outra postagem, a ministra informa que o crucifixo é de origem portuguesa e foi presenteado a Lula por um amigo.

Patrimônio público

Na ocasião, este site destacou que se a nota enviada pela assessoria de Dilma merece crédito, assim como a ministra Helena Chagas também – o ucho.info prefere acreditar que sim -, alguém precisa explicar o fato de o tal crucifixo aparecer em foto do então presidente Itamar Franco no mesmo gabinete presidencial. A mencionada imagem está disponível na rede mundial de computadores, que já serve de palco para uma campanha batizada como “Devolve, Lula!”.

Há nesse caso três hipóteses. A primeira delas, mencionada acima, é que Dilma Rousseff, que se viu em apuros com a comunidade cristã por ter defendido a legalização do aborto, não quer novamente entrar em rota de colisão com os seguidores do Cristianismo. E por conta disso usou a desculpa de que Lula teria levado o crucifixo como forma de justificar o sumiço da peça decorativa de seu gabinete.

A segunda hipótese é que Luiz Inácio da Silva pode ter se apropriado de um patrimônio público, o que, fosse ele um cidadão comum, já teria rendido um ruidoso inquérito policial. Se a suposta apropriação indébita de fato ocorreu, está explicado o tamanho da mudança do outrora primeiro-casal, que despachou de Brasília para São Bernardo do Campo, no Grande ABC, nada menos do que dez caminhões com objetos pessoais, presentes recebidos durante os dois mandatos e outras tantas quinquilharias. Há quem garanta, inclusive, que presentes e joias ofertados por estadistas estrangeiros e que foram devida e legalmente incorporados ao acervo da Presidência da República agora repousam no duplex que o arrogante Lula mantém na cidade da Grande São Paulo que é tida como berço do sindicalismo nacional.

A terceira hipótese, a mais absurda delas, é que pode existir no Brasil um santeiro com boas relações palacianas, que presenteia os presidentes da República sempre com o mesmo crucifixo. E nesse rol de agraciados com o mimo está o ex-presidente Itamar Franco.

Resumindo, ou a presidente Dilma revela a verdade, dizendo que seu pensamento não coaduna com a pretérita pregação do mais ilustre frequentador da Galiléia, ou Lula deve assumir desde já a sua porção de gatuno, não sem antes devolver aquilo que até então parece ser de propriedade do povo brasileiro. No contraponto, se essa tese estiver equivocada, Lula deve vir a público e aplicar uma carraspana na sua pupila, pois do contrário jamais saberemos se alguém mentiu ou surrupiou.

Cristo Redentor, Buda, Xangô…

O advogado Wadih Damous, presidente do capítulo fluminense da OAB, tem o direito e o dever de cobrar o estrito cumprimento das leis. A Constituição Federal considera como direito fundamental a liberdade religiosa e classifica o Brasil como um país laico. Ou seja, o Estado deve proporcionar a seus cidadãos um clima de perfeita compreensão religiosa, proscrevendo a intolerância e o fanatismo. De igual modo deve existir uma divisão muito acentuada entre o Estado e as religiões, não podendo existir nenhuma religião oficial. Diz ainda a Carta Magna que o Estado deve prestar proteção e garantia ao livre exercício de todas as religiões. Assim sendo, a legislação vigente deve ser cumprida.

Considerando que seu preciosismo tem lugar ao sol, Damous deveria, por questões democráticas e de isonomia, cobrar da administração da cidade do Rio de Janeiro a imediata retirada do Cristo Redentor.Afinal, nem todos os que na Cidade Maravilhosa vivem são cristãos. Do contrário, que o causídico consiga com as mesmas autoridades cariocas um local para se fincar uma imagem de Buda, outra para Xangô e assim sucessivamente. Até porque, se todos os cidadãos gozam da mesma liberdade religiosa, como garante a Constituição, não há porque privilegiar uma religião em detrimento de outra em locais públicos.