A aprovação da Lei Antifumo em São Paulo é mais que restrição ao cigarro: evidencia um problema de saúde publica e causa medo de desemprego
(*) Ana Carolina Castro e Karina Trevizan
Sancionada no último dia 7 pelo governador José Serra, a Lei Antifumo entra em vigor no estado de São Paulo em 6 de agosto deste ano. De acordo com a nova lei, fica proibido fumar em locais de uso coletivo, públicos ou privados, como bares, restaurantes e shoppings, sendo permitido o fumo apenas em áreas ao ar livre. O posicionamento diante da restrição, entretanto, não foi o mesmo entre as entidades ligadas ao setor de Bares e Restaurantes. Enquanto o Sindicato dos Trabalhadores de Hotéis, Bares e Restaurantes (Sinthoresp) se posiciona a favor da nova lei, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) considera a medida “absurda e inconsistente”.
O professor de Direito Constitucional Luiz Tarcísio Teixeira Ferreira, especialista em Direito de Estado, afirma que a proibição não cabe ao Estado, mas sim à União. “Em se tratando de atividade lícita, é ao município que cabe a responsabilidade de legislar, preservando o direito de quem fuma e a saúde do não fumante”, ressalta. “Não pode o Estado proibir simplesmente, a não ser que tal conduta seja criminalizada por lei pela União.”
A Abrasel entrou com ação de inconstitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) na última terça-feira (13), argumentando que a lei desrespeita a Constituição, que permite a existência de fumódromos. O governo de São Paulo alegou que a Lei Antifumo se vale de um tratado da OMS (Organização Mundial da Saúde), referendado pelo congresso do Brasil. O STF rejeitou o pedido da Abrasel na noite da mesma terça-feira.
A preocupação da Abrasel é com a queda no movimento dos estabelecimentos e o consequente aumento do desemprego no setor. Presidente da Associação, Paulo Solmucci argumenta que “só em relação aos empregos, são mais de seis milhões de vagas. É preciso saber que é grande o prejuízo para o setor”. Em carta aberta enviada à imprensa, a Abrasel afirma que “medidas paliativas e demagógicas [como a Lei Antifumo] não resolverão os problemas da população e ameaçam milhares de empregos brasileiros”.
O Sinthoresp, por sua vez, declara-se a favor da restrição ao fumo. Tendo se posicionado desde o início a favor da Lei Antifumo com a justificativa de priorizar a saúde, o sindicato reiterou sua opinião depois de pesquisa realizada com os trabalhadores. A assessora de imprensa do Sindicato, Rosana Grant, explicou que o Sinthoresp “pensa na saúde dos trabalhadores em primeiro lugar, […] e é legitimo pra falar em nome do trabalhador”. O levantamento feito pelo Sinthoresp, com cerca de 500 trabalhadores em 156 estabelecimentos, mostra que 80,6% dos trabalhadores de restaurantes, bares e hotéis aprovam a restrição ao fumo.
As novidades para os restaurantes, na prática, são poucas. Nas ruas do centro velho de São Paulo, por exemplo, próximas à Praça da Sé, como a XV de Novembro, São Bento e Direita, há muitos restaurantes e lanchonetes. A reportagem deste site esteve nesses locais e não encontrou um estabelecimento sequer com área interna para fumantes. Os restaurantes que tinham espaço reservado ao fumante designam o lado de fora para a clientela tabagista, nas varandas e terraços. A Lei Antifumo, de nova, só terá o nome para esses estabelecimentos. Maitre de um dos restaurantes que não tem área para fumantes, o Bovinus, Valdocir Damin conta que já há aproximadamente 5 anos que foi erradicada a área para fumantes no estabelecimento. “O movimentou aumentou. As pessoas se incomodam com o cheiro do cigarro”, justifica.
Entretanto, especialistas concordam que a Lei Antifumo em nada ajuda para a prevenção ou no combate ao tabagismo. Terapeuta e acupunturista, Laura Coelho, que trata de fumantes que desejam livrar-se da dependência de nicotina, acredita que “qualquer proibição para o fumante é violenta e pouco educativa”. Para ela, “[a lei] beneficia o fumante passivo naquele ambiente, mas não vai à raiz do problema”.
O professor Luiz Tarcísio Teixeira Ferreira também atenta para o tabagismo como um problema mais complexo. Para Ferreira, o foco deveria ser o desenvolvimento de um programa de saúde pública, incentivando o fumante a largar o vício. “A indústria tabagista continua vendendo cigarro”, destaca o professor. “E, não podendo ou não querendo atingir a indústria, o projeto não ataca o problema central, penalizando apenas fumantes e estabelecimentos comerciais”, explica.
Laura e Ferreira compartilham a ideia de que a Lei Antifumo deveria ser acompanhada de medidas mais educativas que punitivas. “Eu não sou contra a lei, mas eu acho que não deve se encerrar aí. Deve ser problematizada uma questão mais profunda”, diz a terapeuta. Ferreira conclui que “se o cigarro é uma droga, os responsáveis pela saúde pública devem estimular [o abandono do vício] muito mais do que proibir, muito mais do que multar”. Fumante paulistano, Jorge José da Silva diz: “Eu pretendo deixar de fumar, mas não por causa da lei”.