Circo sem pão na “Mamma África”

(*) Ucho Haddad –

Diferentemente do que acontece na imprensa nacional, que diante de câmeras e microfones nega torcer contra a seleção brasileira de futebol, assumo tal postura sem medo de críticas e ofensas. Muitos são os jornalistas esportivos que torcem contra o onze canarinho, mas por questões contratuais acabam vilipendiando a própria consciência.

Como sempre faço, apelo mais uma vez para Nelson Rodrigues na tentativa de entender a seleção brasileira. Disse o polêmico dramaturgo que “a seleção é a pátria de chuteiras”, o que cada vez mais se torna uma verdade suprema. O Brasil é um país que vive de embustes diários, o mesmo acontecendo no universo tupiniquim do futebol. Uma coisa é torcer contra a seleção, outra é torcer contra o Brasil. Torcesse eu contra a minha terra natal, minha pátria amada, jamais teria enfrentado durante anos a fio a ira criminosa aspergida pelo poder.

Horas antes de comandar uma pífia apresentação diante dos egípcios, Carlos Verri, o Dunga, disse de forma arrogante que chegou ao comando da seleção para um período de dois meses, mas que lá está há três anos. Dono de um nanismo técnico sem precedentes – o que justifica a alcunha – Dunga é um incompetente presunçoso.

Mas o atual técnico não pode ser responsabilizado isoladamente pelo vexatório estado em que se encontra o futebol nacional. Sempre ávida por dinheiro, a parte comprometida da mídia tem sua parcela de culpa. Agir no inconsciente coletivo através de bordões produzidos em conluio com os interessados é a forma encontrada por alguns desses comprometidos para fazer com que a massa ignara se dê por satisfeita com pouco, muito pouco. Todo esse movimento de involução do futebol começou no momento em que os interesses financeiros sobrepujaram a disputa, a vitória.

Muitos têm dito que Dunga, mesmo aos solavancos, tem conquistado as vitórias necessárias, mas isso é nada para um povo que tem na memória esportiva uma seleção impecável como a que conquistou o tricampeonato no México. A vitória sempre acenará para o futebol brasileiro, seja pela história, seja pelo peso da camisa. Deixando o folclore de lado, a seleção verde-loura pode até vencer, mas não convence nem mesmo os neófitos na matéria. E vencer sem convencer é muito pior que perder.

Quando a seleção brasileira conquista uma vitória qualquer, daquelas que deixam o torcedor cheio de dúvidas e com pouca empolgação, os aduladores de plantão, que agem como trânsfugas da lógica e do bom senso, passam a exaltar o que não merece atenção. Mas por trás de toda essa encenação há interesses comerciais bisonhos. Desde quando o futebol virou negócio, um gol marcado passou a ser comemorado com escandalosos apelos comerciais. Tal situação fez com que a vitória se transformasse em uma mercadoria rara e custosa. E se a vitória tem preço, a derrota também pode ser negociada.

No caso da partida contra o Egito, o atacante Kaká ficou devendo uma exibição à altura da badalação que o cerca desde que sua transferência para o Real Madrid foi oficialmente anunciada. Agora de “salto alto”, Kaká já admite ser um dos mais importantes jogadores da equipe de Dunga. O que não significa muita coisa, pois o time brasileiro é escandalosamente incompetente.

Como se isso não bastasse, há dentro da equipe brasileira uma notória necessidade dos jogadores aparecerem cada vez mais. E isso tem acontecido especialmente quando um atleta está na mora de um clube rico e importante ou tem um contrato milionário de patrocínio a ser cumprido. Tanto é assim, que a cobrança de faltas e penalidades tem proporcionado rusgas silenciosas dentro de campo, mas que nos vestiários ganham uma sonoridade incomum. Tudo porque a seleção brasileira, apesar dos resultados, está há três longos anos sem convencer.

Como o peso do cachimbo sempre será a desculpa para a boca torta, o técnico brasileiro arrumou uma explicação sinestésica para a nada empolgante apresentação de seus comandados: cansaço e fuso horário. O que seria desnecessário se a obrigação desses semideuses de araque fosse uma noitada na África do Sul.

Enganar o povo a partir de palanques eleitorais já é uma conhecida tradição no Brasil, mas de uns tempos para cá as arenas desportivas conquistaram a simpatia de farsantes badalados. Em outras palavras, armaram um espetáculo ridículo e sem precedentes na África do Sul, mas esqueceram de passar na padaria da esquina. Afinal, circo sem pão não funciona.