(*) Gilmar Corrêa –
A manhã está ensolarada. O frio da madrugada ainda é persistente, e obriga os competidores a envergar agasalhos reforçados. Uma névoa fina encobre as elevações próximas quando os primeiros conjuntos dão a largada para uma prova de 90 quilômetros de extensão. É o início da quarta etapa do enduro equestre do Distrito Federal.
Aguardam a chamada para a largada os cavaleiros mirins e adultos que disputarão outras provas de regularidade e velocidade livre. As distâncias serão menores, de no máximo 65 quilômetros divididos em três anéis, que são trilhas com dificuldades que variam de acordo com a topografia do terreno.
Nos caminhos que impõem mais dificuldade, é preciso cuidado e atenção. Na estrada batida, imprime-se velocidade. No final das provas, foi possível verificar a velocidade média dos conjuntos: Entre 15 e 18 quilômetros horários.
O desempenho dos cavaleiros e dos cavalos, a maioria da raça Árabe (resistente e própria para esse tipo de competição), coloca Brasília numa posição de crescimento no Brasil. Depois de São Paulo, é provavelmente o núcleo de mais destaque e com bom índice técnico.
Prova disso é que alguns cavaleiros já estão sendo escolhidos para representar o Brasil em provas no exterior. Um deles é Felipe Guidi, de 15 anos. Ele vai para o Chile em setembro, depois de competir na Copa das Nações em São Paulo. Felipe sofreu um acidente grave no Rio de Janeiro há alguns anos, quando montava Cherizina. A égua derrubou o cavaleiro que, mesmo assim, fez dela a grande paixão.
O diretor de Enduro da Federação de Hipismo de Brasília, Heitor Coelho, atesta a qualidade dos cavaleiros. “Estamos progredindo bem na questão técnica”, diz o apaixonado pelo esporte que influenciou a filha, Maria Eduarda, de 12 anos. Ela cavalga há cinco e, na última etapa de Brasília, disputou (e bem) a prova Curta “A” Mirim, de 65 quilômetros.
E como os colegas da mesma idade veem a menina que monta? “Todo mundo acha estranho. Acham que é coisa de outro mundo”, explica Maria Eduarda. Os meninos fazem muita brincadeira (talvez assustados com a coragem). As coleguinhas perguntam mais sobre o que é o enduro e como é ser uma boa amazonas.
Hélcio Arci de Andrade Filho tem 47 anos, e há dois se “apaixonou” pelo enduro. Em Minas Gerais, onde nasceu e morou até pouco tempo atrás, gostava das cavalgadas. Ao se transferir para Brasília, trocou a montaria de cavalo Mangalarga Marchador para o Árabe, um animal bem mais “quente” e mais “duro” de andar. Mas não se arrependeu. É um dos competidores nos 65 quilômetros adulto.
Hélcio é o “cozinheiro” da equipe Fênix, talvez a maior dentre duas dezenas que disputam as medalhas e troféus. “Tenho o maior prazer de cozinhar, especialmente para minha esposa”, esmorece. Assim, Cibeli é compensada pelas horas e horas que o marido dedica no fim de semana à sua paixão. “Ela não gosta, mas respeita”, observa o empresário do ramo de embalagens.
Montar quilômetros e quilômetros num enduro equestre não é como tomar refresco no bar da esquina. O esporte obriga o competidor a superar desafios físicos e a estar sob constante preparação. Odimar Reis e Renata Ramos, por exemplo, fazem musculação diariamente. É para preparar especialmente a musculatura das pernas para as distâncias com o trote elevado – aquele em que o cavaleiro encosta muito pouco na cela. Renata reforça o lado físico com corridas diárias de seis quilômetros.
No enduro equestre não há uma premiação em dinheiro, mas as competições são bem acirradas. Por isso, os cavalos também passam por regimes de treinamento e condicionamento. São animais-atletas muito bem cuidados com alimentação adequada.
Além dos cavaleiros e dos cavalos, o enduro envolve questões de infra-estrutura e pessoal de apoio. Uma dessas pessoas é a Maria Antônia da Silva, uma espécie de faz-tudo. Sem ela, provavelmente a equipe Fênix teria muita dificuldade em organizar as coisas. “E quem é você?”, pergunta o jornalista a ela. “Ah, sou a mulher que manda no Marcelo”, brinca Maria. Marcelo é o marido dela, outro personagem do mundo do apoio que treina os cavalos e orienta os cavaleiros.
O enduro equestre
O enduro equestre moderno nasceu na década de 1950 nos Estados Unidos. É um dos sete esportes hípicos regulamentados, e é o que mais cresce em número de eventos por ano. E já ocupa a terceira posição, praticamente empatado com o concurso completo de equitação e atrás do salto. O enduro é uma corrida de longa distância, atingindo 160 quilômetros em sua versão mais longa, separada em etapas (chamadas de “anéis”). Entre os anéis, sempre há um controle veterinário (vet-check) que desclassifica os cavalos demasiadamente cansados ou que mostrem qualquer sinal de dor no sistema locomotor.
O esporte é separado em duas modalidades: velocidade livre e velocidade controlada. A primeira é considerada a modalidade principal e mais competitiva. Nesta modalidade, o primeiro conjunto a percorrer a distância estabelecida e ser aprovado no vet-check final é considerado o vencedor. Existem vários regulamentos que premiam, desde o tempo de recuperação cardíaca do cavalo até a cadência correta na trilha. As provas de velocidade livre são separadas por distância e por idade dos cavaleiros/amazonas. A grande maioria é composta por trilhas entre 80 quilômetros e 160 quilômetros, embora existam provas mais curtas (normalmente de 60 quilômetros) e mais longas (divididas, nesse caso, em dois ou mais dias). Dentro dessas distâncias, os cavaleiros são divididos por idade em três categorias: mirim (até 14 anos), young rider (14-21 anos) e sênior (acima de 21 anos).