Dupla interpretação – Em Brasília, os operadores do Direito – advogados, ministros e juízes – tentam digerir a polêmica decisão do Superior Tribunal de Justiça de anular as provas da Operação Boi Barrica (posteriormente Operação Faktor), que enquadrou o empresário Fernando Sarney nos crimes de formação de quadrilha, gestão de instituição financeira irregular, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.
A surpresa do momento é a celeridade com que a 6ª Turma do STJ anulou as provas obtidas pela Polícia Federal, que poderiam levar o filho do senador José Sarney à prisão, caso o Brasil fosse um país minimamente sério. Nos últimos dias, muito se comentou em Brasília sobre o assunto, tendo como referência o tempo da decisão sobre outras operações policiais, também sob o manto do STJ. Relator do processo contra a Operação Boi Barrica, o ministro Sebastião Reis Júnior precisou de apenas seis dias para estudar um cipoal de alegações da defesa de Fernando Sarney e elaborar um voto de 54 páginas, no qual decidiu pela ilegalidade das provas obtidas com a quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico dos investigados. Para piorar, o processo contra a Boi Barrica foi julgado em apenas uma sessão, sem qualquer dúvida ou discordância por parte dos três ministros que participaram do julgamento.
Contudo, essa não é a surpresa maior do caso que já provoca uma silenciosa revolução nos bastidores das instâncias superiores do Judiciário. O mesmo STJ, em decisão não muito longeva, autorizou a quebra de sigilo na Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, que desmantelou um esquema de pagamento de propinas no governo do Distrito Federal e culminou com a queda e a prisão do então governador José Roberto Arruda.
Se por um lado o tema promete capítulos extras e acalorados, por outro é preciso reconhecer que torna-se cada vez mais espúrio o convívio entre os poderes Legislativo e Judiciário. Com isso, beira a nulidade o artigo da Constituição Federal que garante que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Acontece que no Brasil, alguns são mais iguais que a extensa maioria.