(*) Fabio Martins Di Jorge e Rodrigo Giordano de Castro –
Embora seja maciça a divulgação por campanhas publicitárias encomendadas pelos fabricantes, cerca de um terço dos proprietários de veículos defeituosos não comparecem às concessionárias para efetuar os reparos necessários, no que é conhecido como recall.
Com previsão legal no próprio Código de Defesa do Consumidor (CDC), o recall deve ser considerado uma importante manifestação de responsabilidade pós venda, a revelar a supremacia do interesse público sobre o privado. Infelizmente, os maiores interessados, por diversas razões, deixam de atender à manifestação pública de recall, não só arriscando suas vidas, como também as vidas de muitas outras pessoas, já que permanecem rodando com veículos que podem apresentar falhas em importantes dispositivos de segurança, como os freios.
Com o intuito de aumentar a rigidez do procedimento de recall e, portanto, fazer valer a necessidade de segurança que dele naturalmente se espera, o deputado federal Carlos Bezerra (PMDB/MT) apresentou o Projeto de Lei 6.624/09, que obriga o consumidor a submeter o veículo à chamada da montadora, sob pena de não conseguir realizar o licenciamento obrigatório anual do veículo. O projeto já passou pela Comissão de Viação e Transportes da Câmara e foi encaminhado à Comissão de Defesa do Consumidor; o prazo para emendas já se esgotou.
O projeto transfere praticamente todos os ônus de comunicação ao fornecedor, principalmente obrigando-o a encaminhar cartas registradas (os ARs – Avisos de Recebimento) a todos os consumidores. Entretanto, um veículo pode ser comprado num dia e revendido no dia seguinte, de modo que o fornecedor poderá não ter mais as informações corretas sobre quem é o responsável, a começar pelo endereço de correspondência.
A correspondência seria, então, enviada ao primeiro proprietário, que, a bem da verdade, não tem qualquer responsabilidade por comunicar ao comprador do seu antigo veículo. Haveria então o risco de a finalidade do recall não ser atingida. E, pior, é esse segundo consumidor que terá o licenciamento do veículo bloqueado, mesmo sem nunca ter recebido o comunicado oficial. Esse imbróglio certamente deverá gerar ações no Poder Judiciário.
A melhor ideia é o aproveitamento do sistema de correspondência já existente nos órgãos estaduais de trânsito, aquele que envia, por exemplo, autuações por infrações de trânsito ou avisos de pagamento de IPVA. Neste comunicado, às expensas de quem promover o recall (e nunca do Poder Público), deverá constar na comunicação para o atual proprietário a advertência da penalidade relacionada ao bloqueio do licenciamento caso não submeta o veículo ao chamamento de segurança, no prazo regulamentar. Aos fabricantes ficaria a responsabilidade de envio da lista com os números de chassis dos veículos a serem submetidos ao recall, sem prejuízo, como já ocorre hoje, de ampla informação na mídia escrita e falada.
Com estas inovações e ajustes asseguram-se, ao mesmo tempo, a publicidade, a segurança e a efetividade pretendidas pelo CDC e exigíveis em face do fornecedor. E também se impõe aos consumidores a responsabilidade pela participação e fomento do interesse público sobre o privado, neste caso, em uma linguagem mais clara, a prevenção de acidentes de consumo.
(*) Fabio Martins Di Jorge e Rodrigo Giordano de Castro são advogados da área de Direito Cível do escritório Peixoto e Cury Advogados