Verão tutti-frutti

    (*) Marli Gonçalves –

    A cor é linda. O cheiro eu adorava, pelo menos quando era criança, aquele do chiclete PLOC. Mas quero falar é desse verão que está com tudo, literalmente, e não está nem um pouco prosa, tão misturado, picado, mexido

    Todas as frutas. A tradução mais literal do tutti-frutti. Achei uma boa expressão para definir esse esquisito verão que estamos vivendo. Tem as bananas que os ministros nos dão na cara. Os laranjas que sempre aparecem para justificar ganhos dos que fazem muito mais do que do limão, limonada. Cabeças de coco verde que engolem tudo o que lhes é imposto pela goela. Mulheres maçãs, peras, melancia, e completamente goiabas, criando um novo tipo de humanas, as tipo Chester – sem cabeça, só peito, e pernas gordas e musculosas para serem comidas. Assim será o verão das coxinhas, pernudas, com osso, salgadinhas.

    Nesse verão estamos ainda e ainda vendo gente graúda e perversa surpresa com as chuvas que continuam levando, derrubando, matando, onde já deveria haver reforços para que elas fossem apenas refrescantes. E estamos vendo uma seca torrencial e contraditória de terras onde deveriam florescer as sementes do futuro que está sempre aí, quando se fala de Brasil. Parece aquela brincadeira de prender uma moeda, deixar no chão, e ficar na espreita puxando com a cordinha quando o otário se aproxima para catá-la. Assim não dá, assim não pode, diria FHC. E o futuro pulando de nossas mãos, igual à perereca da vizinha.

    Vontade mesmo é entrar em um centro espírita e clamar logo que Dercy Gonçalves volte para a gente psicografar as lindas palavras que ela proferiria caso estivesse aqui ainda, já que infelizmente ela não era imortal. Deveria ser – imortal de academia- já que conseguia expressar como ninguém as enguias que tinha, e o que pensamos de tudo isso, francamente.

    Voltando ao verão do quente-frio-quente-frio, casamento de viúva, de espanhol, ainda não bateu na imprensa aquela – como diz um amigo – insopitável mania de disparar contra o aquecimento global, desmatamento da Amazônia, El Niño, La Niña. Mas já bateu a insopitável (e meu amigo usa sempre nesse sentido) vontade de dar o fiofó de gente que acredita e vê cantar o galo nas freguesias e sai cocoricando junto. Ou que acha novela é documentário-verdade, que ator não pode ter opinião, e que sabe mais do que quem está há anos na luta anti-homofobia e pelos direitos homossexuais, como é o caso de Aguinaldo Silva. Nego vai bater boca com ele e leva – ah, leva! Adoro! Ele não poupa certos ouvidos, nunca poupou, desde os tempos do Lampião, primeiro jornal a tocar no assunto, há mais de 30 anos.

    Do Acre e Amazonas chegam notícias de milhares de haitianos que acreditaram que era o mesmo Brasil que liderava a força de pacificação de lá o Brasil que procuraram como abrigo. Mas certos porquinhos de estimação resolveram que não. Começou a contá-los, e fico imaginando a fila, pode só 100 por mês. Tá? Combinado? Se fossem brancos, puros, europeus, cesares…

    Puff, ploff, splash: próteses de silicone estourando nos peitos do mundo estouram por aqui também, e revelam que não há o menor controle nos autorizados pela nossa estranha agência de saúde oficial. Ah! Mas agora vai ter cadastro de tudo. Até de grávidas, ainda não muito claro se para ajudá-las ou vigiá-las para que assim se mantenham.

    Tem mais sons esse verão: crack! Há anos seres humanos que viram rapidamente bizarros zumbis se juntam no centro de São Paulo, fora os que usam essa droga maldita e manipulada em todos os lugares por aí, junto com as outras químicas, mais fajutas que os preparativos para a Copa. Já tentaram enxotá-los todos juntos e eles simplesmente atravessavam as ruas e avenidas. Agora, tentam dispersá-los, numa ação que poderia sim dar certo não fossem tantas brigas políticas, tantas instâncias e gente dando palpite, principalmente batucando em pretinhas nos computadores da vida, ou iluminados por holofotes. Especialistas que bem que poderiam continuar dando entrevistas só nas portas de suas geladeiras abertas.

    Não sei se é muito Sol na cabeça, calor, a pressão atmosférica, mas também reparou que nesses poucos dias de verão está havendo uma série de surtos de loucura? Uma mata e põe no saco de lixo dezenas de gatos e cães; uma joga os dois cachorros pela janela, junto com os colchões; o outro sai armado e atirando, roubando carros à bala, e percorre 40 quilômetros. (E pergunto: como é que conseguiu, se quem mora em São Paulo sabe que a gente aqui mais para do que anda, tantos são os faróis, tanto é o trânsito?).

    Para completar, tem rico pobre de espírito e pobre tentando ser rico, em exposição pública. Barracos fora de favelas. Ringue que não é mais ringue – é octógono, porque foi esticado e a luta pode ser mais violenta.

    Deve ser o ano bissexto. Pode ser o calor do fogo do dragão no ano chinês. Pode ser até… os últimos dias de Pompéia.

    Acho que neste verão vou preferir chiclete de menta. Arde logo que a gente morde.

    São Paulo, quase mais velha (a cidade), 2012

    (*) Marli Gonçalves é jornalista. Adora o verão. Mas lembra bem de quando era uma estação criativa, que lançava moda. E era quente.

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