(*) Marilda Pansonato Pinheiro –
Nós, Delegados de Polícia, assistimos atônitos declarações dos responsáveis pela segurança pública nos recomendar “segurança privada” e assumindo publicamente sua falta de competência no policiamento ostensivo no Estado. Para completar o quadro, que seria cômico, não fosse trágico, essas mesmas autoridades negam a existência e a ousadia da conhecida facção criminosa, provavelmente responsável pelos últimos ataques na cidade, subestimando a inteligência do cidadão.
São Paulo atingiu o ápice da falência na segurança pública e vários fatores, anunciando que o pior estaria por vir, foram desconsiderados ao longo desses anos. Crer em estatísticas facilmente manipuladas, associadas ao comodismo da sociedade em confiar que tudo estaria sob controle, levou simultaneamente ao caos e ao inferno – este deixando de ser imaginário para se tornar a mais pura e cruel realidade. Cada vez mais os fatos empurram os cidadãos para dentro de suas casas, como se fossem prisões particulares, impedindo-o de exercer o seu consagrado e simples direito de ir e vir.
Não se pode mais frequentar um restaurante. O medo dos arrastões assusta. O cidadão faz a sua parte, paga seus impostos, procura porto seguro, mas não encontra respaldo. O índice de homicídios que, pelo terceiro mês seguido, registrou aumento na cidade de São Paulo (102 casos em maio, com aumento de 21,4% em relação ao mesmo mês em 2011), é “triste”, mas “natural”.
Enquanto isso, a sociedade fica em estado de coma, assistindo passivamente autoridades de segurança tentando safar-se de suas responsabilidades.
Desenhar nas suas verdadeiras cores a realidade, não significa atentar contra a segurança pública nem promover o pânico, mas exercer como cidadão a livre manifestação do pensamento, com o único propósito de que a população seja ouvida e talvez atendida.
Esse mesmo e massacrado cidadão, como se nota nas entrelinhas de algumas “declarações oficiais”, ditas por aqueles que detêm o dever legal de zelar por sua segurança, é inconcebivelmente “vítima natural” da imensa cidade que criou.
É o mesmo que dizer: Cidadão, a culpa é sua!
(*) Marilda Pansonato Pinheiro é delegada de polícia e presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (ADPESP).