Justiça se faz com a análise correta dos fatos e a devida aplicação da legislação vigente

Dois lados – Ao redor do planeta muitas são as interpretações acerca do Direito, mas a justiça é uma e depende apenas do bom senso da sociedade e do Poder Judiciário. Em outras palavras, é inaceitável que crimes idênticos sejam interpretados de acordo com a pressão popular e tenham decisões judiciais antagônicas. Com o avanço da incompetência do Estado, a sensação de impotência da sociedade acaba gerando interpretações distorcidas sobre um mesmo tema. Essas distorções decorrem da necessidade momentânea de a sociedade se indignar diante de um determinado fato.

Para que o tema aqui abordado não produza dúvidas, tomo como exemplo dois acidentes automobilísticos conceitualmente idênticos e que correram em lugares distintos e com culturas também diferentes. O primeiro ocorreu em São Paulo, o segundo, em Cingapura. Em ambos os casos houve vítimas fatais.

Em 10 de julho de 2011, o advogado Marcelo Malvio Alves de Lima dirigia o seu Porsche, em São Paulo, acima do limite de velocidade permitido, quando se envolveu em um acidente automobilístico que culminou com a morte da condutora do outro veículo. Era madrugada e na transversal surgiu um automóvel conduzido por Carolina Menezes Cintra Santos. Nascida em Salvador e também advogada, Carolina ignorou o sinal vermelho e foi atingida pelo Porsche de Marcelo Malvio. De acordo com a polícia, Carolina Menezes, que trabalhava em um conhecido escritório de advocacia da capital paulista, estava alcoolizada. Saldo do acidente: um morto e um ferido.

Em 12 de maio passado, em Cingapura, o investidor financeiro Ma Chi, de 31 anos, dirigia uma Ferrari quando avançou o sinal vermelho e colidiu com um táxi. Saldo do acidente: três mortos e dois feridos. Além de Chi, morreram no acidente o motorista do táxi e o passageiro.

Sem qualquer sinal de hesitação, as autoridades de Cingapura confirmaram desde o início a culpa de Ma Chi,que desrespeitou a legislação de trânsito local. E o acidente foi gravado por câmeras de segurança.

No caso do advogado paulistano, o caso foi conduzido de forma reversa e também estranha. Marcelo Malvio passou à condição de réu, quando na verdade é vítima de alguém que desrespeitou a legislação de trânsito, apesar de no momento do acidente ele dirigir acima da velocidade permitida no local. E testemunhas confirmaram que Carolina Santos desrespeitou o sinal vermelho.

No caso do acidente de Cingapura, as autoridades elegerem um culpado com base nos fatos. Na cidade de São Paulo falou mais alto a pressão exercida nos bastidores para que Carolina Santos passasse à condição de vítima, quando na realidade o acidente só ocorreu por causa da sua própria imprudência. Marcelo Malvio, por sua vez, foi alvo de incursões judiciais, entre elas o bloqueio de bens, quando ele é que deveria ser indenizado.

Malvio errou ao trafegar em velocidade acima do permitido, situação que exige a aplicação das sanções previstas na legislação de trânsito, mas erro maior cometeu a advogada baiana que ultrapassou o farol vermelho e estava sob efeito de álcool, situação que compromete os reflexos do motorista.

O ucho.info já abordou o tema em matéria anterior e sente-se na obrigação de lembrar que não lhe cabe defender que quer que seja, mas, sim, cobrar a correta interpretação do caso e a justa aplicação da lei, sem privilégio de qualquer uma das partes, sob pena de o Brasil se transformar em uma usina de decisões judiciais decorrentes da pressão exercida nos bastidores e da opinião pública.