Desafiar o Supremo é irresponsabilidade legal, retaliá-lo é suicídio político

Editorial –

A crise institucional entre os Poderes Judiciário e Legislativo é um atentado contra o Estado Democrático de Direito e, acima de tudo, contra o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal, a quem compete a última palavra em matéria constitucional, como lembrou o ministro Celso de Mello, um dos clássicos da Corte, em voto proferido na segunda-feira (17).

O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia, que age a mando do Partido dos Trabalhadores, inconformado com a condenação de alguns companheiros na Ação Penal 470, já avisara que não cumpriria a decisão do STF, como se a legislação vigente oferecesse ao condenado múltipla escolha em caso de sentenças condenatórias.

Diante da sacramentada decisão do Supremo de que os parlamentares condenados na referida ação penal perderão os respectivos mandatos por ocasião do trânsito em julgado das sentenças condenatórias, Maia novamente tratou de desafiar o Supremo, alegando tratar-se de ingerência nos assuntos do Legislativo.

“Quando uma matéria julgada pelo STF não condiz com o que prevê a Constituição, é sinal de que houve uma ingerência de um poder em outro, que tem garantido seu direito de tratar sobre a cassação de mandato de parlamentares”, declarou Maia.

Se ao longo do escândalo do Mensalão do PT ocorreu algum tipo de ingerência, essa foi do Executivo no Legislativo, por meio de compra de parlamentares, o que foi possível por causa da corrupta estrutura erguida pelos então ocupantes do Palácio do Planalto e operada pelo agora condenado Marcos Valério. Só assim, à sombra de um esquema mafioso, Lula fez o que quis no Congresso e conquistou falsos índices de aprovação.

O embate que o presidente da Câmara insiste em travar com o Supremo é tão obtuso quanto autoritário, não sem antes ser decorrência de ordem expressa do Partido dos Trabalhadores, que rejeita qualquer ato que convirja para uma eventual confissão de culpa. Concordar, de chofre, com a perda de mandato dos deputados condenados na Ação Penal 470 seria admitir que o Mensalão do PT de fato existiu, o que contraria o ensaiado e mentiroso discurso balbuciado por integrantes da legenda.

De igual modo, acatar a decisão do Supremo sem resistir provocaria estragos imediatos na já desgastada e irrecuperável imagem de Lula, acusado de ser o “capo” da quadrilha que operou o maior escândalo de corrupção da história brasileira.

A atitude de Marco Maia, que não causa espécie e é desprovida de lhaneza, resulta da falsa sensação de impunidade que o ex-presidente Lula disseminou pelo País, sem esquecer os mais distantes e inóspitos rincões de um território com dimensões continentais. O ex-metalúrgico agiu de forma premeditada, pois, ciente do que seria preciso cometer ao longo de seus dois governos pra se manter no poder, tratou de empurrar os brasileiros à transgressão legal para mais adiante tê-los como aliados.

O que o PT busca por intermédio de Marco Maia é tumultuar o julgamento da ação penal – que a despeito do que foi anunciado ainda não terminou de fato – postergando ao máximo a publicação do acórdão correspondente. O presidente da Câmara já anunciou que ingressará no processo, o que cristaliza o desejo escuso do partido e concederá aos condenados mais um anoréxico período de liberdade, até que soe a férrea tramela do cárcere.

Mais cauteloso, pois sabe que a situação de confronto pode ter desdobramentos perigosos, o deputado petista mudou o discurso ameaçador da última semana e adotou um tom moderado ao afirmar que acredita na reforma da decisão. Alegar que o resultado do julgamento da perda de mandato foi precário, apenas porque a maioria foi apertada (5 a 4), não dá o direito a quem quer que seja de descumprir uma ordem judicial. O máximo que a lei permite, e será respeitado, é interpor recurso, que no caso em questão se limita a embargo infringente e com exígua chance de reverter a decisão.

Desafiar o Supremo é uma atitude irresponsável de Marco Maia, que á época da consumação da perda dos mandatos não mais estará no comando da Câmara, pois deixa um péssimo exemplo aos cidadãos, que de agora em diante poderão descumprir decisões judiciais como se o Brasil fosse uma terra sem lei. A história mostra que pensamentos e atitudes como o de Maia são o coquetel de uma ditadura esculpida com o inocente cinzel do proletariado.

É importante deixar claro que, encerrada a primeira e longa etapa do julgamento do Mensalão do PT, venceram os brasileiros de bem que se indignam com a atuação dos saltimbancos, impondo-se a derrota a uma quadrilha que se especializou em saquear os cofres públicos e envolver-se em casos de corrupção, como estratégia de implantar seu projeto de poder e enriquecer uma minoria conhecida por seus malabarismos existenciais.

Muito além de ser passado a limpo, o Brasil precisa ver extirpado os cancros que consomem diuturnamente a dignidade de um povo que há décadas ouve ser este o país do futuro.

O Editor