Venezuela: sem confirmar a morte de Chávez, núcleo duro do governo trava guerra sórdida pelo poder

    (*) Ucho Haddad –

    Política é a arte da incoerência, poder é o universo da podridão. O circo que se armou em Havana ao redor do cadáver de Hugo Chávez não foi por piedade ou compaixão, mas para saber como se dará a sucessão do poder na Venezuela e como será a divisão do dinheiro desviado dos cofres bolivarianos. São mais de US$ 50 bilhões depositados no exterior. Nesses dois flancos da guerra que se trava na capital cubana, ninguém aceita sair perdendo. Mesmo assim, as reuniões comandadas por Raúl Castro, que também não admite perder seu quinhão, foram batizadas de “Pacto de La Habana”. Não há pacto algum, mas, sim, uma guerra de facções políticas e familiares sedentos por dinheiro.

    Aos caudilhos cubanos interessa que esteja no poder não aquele que Hugo Chávez indicou como seu herdeiro político e sucessor, nesse caso Nicolás Maduro, mas alguém que continue a enviar à ilha caribenha os milhões de petrodólares da Venezuela, que nos últimos anos deram sobrevida à ditadura sanguinária dos irmãos Castro.

    Entre Maduro ter sido indicado como sucessor de Chávez e ser eleito presidente, em nova eleição que deve ser convocada em trinta dias, há uma enorme diferença e incertezas ainda maiores. Aquele que assumir o Palácio Miraflores, por pior que seja a condição sócio-econômica da Venezuela, decidirá o que fazer com o dinheiro que recebe diariamente como maior produtor de petróleo do planeta. E o modelo bolivariano de governar permite tudo a quem estiver no comando. Uma espécie de gorda loteria que cai no colo sem esperar.

    Adán Chávez foi a Cuba não para se despedir do irmão Hugo, mas porque foi recentemente reeleito governador do estado de Barinas, principal reduto do chavismo, e porque chegar à presidência da Venezuela faz parte do seu projeto político. Adán sabe, ou pelo menos imagina, o quanto o irmão amealhou bradando da sacada palaciana as frases feitas do socialismo do século XXI. Esse incansável úbere financeiro todos querem, até o mais ortodoxo dos comunistas, se é que essa figura existe na face da Terra.

    Presidente da Assembléia Nacional, a quem cabe assumir interinamente a presidência no caso de vazio do cargo e convocar nova eleição, Diosdado Cabello não chegou aonde chegou porque é um inocente. Está na presidência do Legislativo venezuelano porque soube jogar o jogo sujo de Hugo Chávez, de quem esperava ser indicado como seu herdeiro político. Também de olho no Palácio Miraflores, Cabello deve ser reeleito presidente da Assembleia Nacional ainda neste sábado, 5 de janeiro.

    Diosdado Cabello não foi a Havana para visitar o moribundo comandante Chávez, mas, sim, para impor seu desejo político nas três acaloradas reuniões comandadas pelo ditador Raúl Castro. Assim como Maduro, o articulado Cabello também sabe o que a presidência da Venezuela pode lhe render além de poder e projeção política.

    A essa altura, o cadáver de Hugo Chávez é o que menos importa, pois servirá apenas para comover seus seguidores, que estarão de luto ideológico no período em que deve ser convocada nova eleição presidencial. À família de Hugo Chávez – filhos e etc. – não importa quem chegará ao poder central do país, desde que tenha no politburo bolivariano seus representantes. Até porque, a mamata é das melhores e rende muito dinheiro ilegal. Esse apreço dos filhos comunistas de Chávez pelo maior símbolo do capitalismo ficou evidente em uma foto publicada na rede mundial de computadores, em que uma de suas filhas posa com um punhado de dólares na mão, como se manuseasse cartas de baralho.

    Para fazer valer as palavras de Chávez e exercer o “direito” de herdeiro do comandante, Nicolás Maduro já mostrou nos bastidores que está disposto a tudo e mais um pouco. Tornar-se presidente da Venezuela exige o apoio do Legislativo e a conivência do Exército local. Sem esse binômio de apoio, nada feito. Enquanto Hugo Chávez lutava contra a morte em Havana, depois da quarta e desastrosa cirurgia, Maduro enviou um dos seus assessores a Washington. Na capital norte-americana, mais precisamente na Casa Branca, o preposto de Nicolás Maduro propôs que a DEA (Drug Enforcement Administration), departamento de combate ao narcotráfico, encurralasse Cabello.

    De acordo com investigações da DEA, Diosdado Cabello, com o aval de Hugo Chávez, é o líder do tráfico de drogas na Venezuela, o que explica a aproximação e o apoio do Palácio Miraflores às FARC, grupo guerrilheiro colombiano que sobrevive não mais do sequestro de autoridades, mas do tráfico de drogas e do contrabando de armamentos. Por essa razão, o serviço secreto da Colômbia sempre teve, com antecedência e prioridade, informações precisas sobre o verdadeiro estado de saúde de Chávez. Nesse intrincado enredo criminoso, Diosdado Cabello conta com o apoio e a participação de oficiais de alta patente do Exército venezuelano, principalmente generais.

    O governo dos Estados Unidos tem motivos de sobra para levar adiante a proposta de Nicolás Maduro. Entre eles, fincar o pé no país que controla o esquerdismo barato na América do Sul e deu sobrevida a Cuba, além de enjaular Diosdado Cabello e seus comparsas no tráfico. O primeiro recado foi dado dias atrás, com o Exército colombiano eliminando quatorze integrantes das FARC durante um ataque relâmpago.

    Preocupado com os movimentos de Maduro nas coxias do poder, Cabello fez chegar à Casa Branca, por meio da embaixada estadunidense em Caracas, uma informação não oficial de que está disposto a qualquer coisa para que a DEA não entre na história. Para isso, Diosdado Cabello se apoiou na mentira de que se chegar à presidência do país, quer se afastar imediatamente de Cuba, que de igual modo não o quer como parceiro. Uma inverdade das mais acintosas nas duas mãos. Cuba precisa do dinheiro venezuelano, assim como a Venezuela não pode dispensar a ilha caribenha como escala do tráfico de drogas. Sem contar que o apoio financeiro a Havana também serve como atalho do dinheiro desviado da Venezuela e que acaba nas contas quase secretas dos bolivarianos mais chegados.

    Enquanto, junto com os familiares de Chávez, finge que o tiranete bolivariano ainda está vivo, a cúpula do governo venezuelano se mostra preocupada com uma possível guerra civil no país, logo após a divulgação da notícia de sua morte, que, como tenho afirmado, está à espera do momento mais adequado. Uma eventual guerra civil entre partidários e adversários de Hugo Chávez, que seria sangrenta, não deve ser descartada, mas a batalha maior e mais sórdida começou há quase um mês, quando o comandante da Revolução Bolivariana anunciou publicamente o nome do seu herdeiro político. Outrora motorista de ônibus, Nicolás Maduro já mostrou ao núcleo duro de Miraflores que, mesmo sendo um chanceler de araque, sabe como atuar no sórdido submundo do poder.

    Caso não ocorra recuo de uma das partes, engrossando a queda de braços entre Maduro e Cabello, a Venezuela corre o sério risco de voltar para as mãos dos militares, que até agora concordaram com o socialismo boquirroto de Chávez porque a contrapartida foi o passe livre para comandar o tráfico de entorpecentes e transformar o país em única passagem do nióbio contrabandeado do Brasil, operação criminosa em que cada um recebe os imundos patacões a que tem direito.