(*) Carlos Brickmann –
Congresso, Assembleias e Câmaras em recesso, ministros de Estado em férias – e há até quem note que não estão trabalhando (ainda bem: sai mais barato). Os condenados estão soltos, alguns subindo na vida, assumindo seus carguinhos bem remunerados. Mês morno, este janeiro. Há tanta falta de notícia que estão até descobrindo que Henrique Alves e Renan Calheiros, futuros comandantes do Congresso Nacional, dificilmente poderiam ser candidatos à canonização.
Mas as coisas podem mudar de uma hora para outra: o homem que sabe tudo, Geovani Pereira da Silva, foragido há quase um ano, condenado a 13 anos de cadeia, contador do bicheiro Carlinhos Cachoeira, de repente resolveu se entregar. Geovani tinha sido o único a escapar da prisão na Operação Monte Carlo e, de lá para cá, ninguém foi capaz de encontrá-lo. Mas quem sabe os sentimentos que se escondem no coração humano? Segundo seu advogado, ele decidiu se entregar “porque ninguém consegue viver escondido”. Preferiu viver preso. Então, tá.
Mas imaginemos que ele tenha chegado a um acordo para contar o que sabe. Será um terremoto: o relacionamento legal ou ilegal de Carlinhos Cachoeira passa pela gigantesca empreiteira Delta e seu dono Fernando Cavendish (companheiro do governador fluminense Sérgio Cabral naquela grotesca Noite dos Guardanapos e dos Sapatos Vermelhos, em Paris), pelo governador goiano Marconi Perillo, por tudo o que se possa imaginar, envolvendo partidos diversos e dinheiro à vontade.
Haverá quem tenha saudades dos dias mornos de até agora.
Só ele?
Geovani Pereira da Silva disse que passou todo esse tempo foragido “porque tinha medo”. Quem sabe o que se imagina que ele saiba certamente terá medo.
E medo mesmo devem ter aqueles que gostariam que Geovani continuasse sumido.
Bandidos com voto
Um dos melhores repórteres do país, Eduardo Faustini, da Rede Globo, num trabalho excepcional, mostra o Brasil de verdade: aquele em que os prefeitos que deixam os cargos devastam o que podem para prejudicar seus sucessores, e o cidadão que se dane.
Em doze cidades distribuídas pelo país, Faustini encontrou a luz desligada por falta de pagamento, computadores com informações essenciais desaparecidos, abastecimento de água cortado (e só R$ 2,10 nos cofres municipais para todas as despesas, inclusive aluguel de caminhões-pipa). Arquivos? Sumiram. Uma prefeita levou o computador e os móveis para casa, alegando que eram dela. Em outros municípios, os computadores estavam no lugar, mas os discos rígidos tinham sido formatados, apagando toda e qualquer informação. Levaram até o aparelho de raios-X do hospital e o motor de um carro oficial.
Vale a pena ver tudo: http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2013/01/novos-prefeitos-enfrentam-condicoes-muito-precarias-no-inicio-da-gestao.html
Guerra religiosa, não 1
O Governo está sendo criticado por dar passaporte diplomático ao apóstolo Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de Deus. É esquisito; mas o Governo dá passaportes diplomáticos a autoridades religiosas, como cardeais católicos, e não poderia discriminar outras religiões.
Errado, no caso, não é dar o passaporte diplomático a Santiago: é dar passaporte diplomático a líderes religiosos, sejam quais forem. Que cada um tire seu passaporte normal, e pronto.
Guerra religiosa, não 2
A Rede Record atacou pesadamente, no Domingo Espetacular, dois programas da concorrente Rede Globo: Salve Jorge e Canto da Sereia. Motivo alegado: os dois programas seriam favoráveis a cultos afrobrasileiros.
Admitamos que sejam. E daí? Se forem favoráveis ao islamismo, budismo, judaísmo, catolicismo, protestantismo, qual o problema? Combater a liberdade religiosa é absurdo (e ilegal); e traz à memória os tempos tristes da perseguição a quem pensa diferente.
Homicídio anunciado
Lembre aquela moça de 25 anos, grávida de nove meses, que foi assaltada e morreu com um tiro na cabeça. Agora, acompanhe a história do assassínio que podia ter sido evitado e não foi. Alex Alcântara de Arruda, 22 anos, principal suspeito do crime, estava preso em regime semiaberto por tentativa de roubo. Fugiu em 10 de novembro de 2011. Duas semanas depois, o Conselho Nacional de Justiça, que não tinha sido informado da fuga, deu-lhe liberdade condicional. Só nos últimos dois meses, Alex foi preso duas vezes; em ambas foi liberado pela Justiça, por não haver mandado de prisão contra ele.
Deveria haver: se ganhou condicional sem tê-la merecido, por que não houve uma correção no seu tratamento? Enfim, ele estava solto. E por isso, por ele estar entre nós, uma moça de 25 anos, grávida de nove meses, levou um tiro na cabeça, e já não está entre nós.
Ação oficial
Os sucessivos encontros da presidente Dilma Rousseff com grandes empresários não se limitam à tentativa de levá-los a investir mais (até porque só investirão se o investimento for economicamente viável). Mas é bom lembrar que a Odebrecht, a Cosan, o Bradesco e a Vale Fertilizantes estão entre os principais doadores de campanhas eleitorais.
Atraí-los, e separá-los dos adversários, é ótimo.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.