Após noite de vandalismo em SP, imprensa dedica-se à repercussão sensacionalista dos fatos

(Foto: Estadão)
Calma ao analisar – Abrir espaço nos veículos de comunicação para os protestos patrocinados por delinquentes em São Paulo já é letra morta e não renderá a audiência esperada. Sem ter o que noticiar, a ordem nos veículos midiáticos é turbinar o noticiário com a reverberação do caso, sempre focando eventuais excessos cometidos pelos policiais. Apurados os fatos, quem transgrediu deve ser punido, não importando se manifestantes ou policiais. Enquanto isso não acontece, a imprensa se alimentará de conjecturas, o que serve apenas para formar opinião, muitas vezes de forma equivocada.

Fora isso, declarações e imagens de repórteres atingidos por balas de borracha disparadas por policiais militares passaram a ganhar força ainda durante o confronto. Não se trata de defender a violência, mas de ser a favor da manutenção da ordem. O direito constitucional à livre manifestação deve ser preservado em sua inteireza, desde que não descambe para o lado do vandalismo. Entre protesto e crime a linha é tênue, cabendo ao Estado discernir se acompanha ou reprime.

Qualquer excesso por parte da polícia, seja com representantes da imprensa ou não, deve ser condenado, mas é preciso reconhecer que quem parte para a cobertura jornalística de um evento complexo e perigoso sabe dos riscos. Se não souber deve desistir imediatamente da profissão. É o mesmo que ser correspondente de guerra ou realizar reportagens nos morros cariocas durante confronto entre policiais e traficantes. O risco existe e é grande. E só se arrisca quem quer. Há de surgir alguém para afirmar que muitas vezes o risco decorre de imposição trabalhista, mas neste caso o melhor a se fazer é dar adeus ao empregador.

Colocar-se na linha de tiro para buscar a informação exclusiva ou registrar a melhor imagem tem um preço. E os jornalistas, via de regra, adoram esse frenesi que a profissão proporciona. Há inclusive os que não conseguem viver sem. Se tudo acaba bem, entregam-se ao deleite do êxito profissional. Contudo, diante do inesperado o jeito é transferir a responsabilidade e preservar o currículo. Jamais um jornalista reconhecerá que ultrapassou os limites da própria segurança, pois a obsessão pela informação adicional sempre cega a coerência.

Com certeza é muito mais tranquilo cobrir um desfile de moda ou uma degustação de champagne com harmonização gastronômica, mas nesse tipo de evento falta o ingrediente que move parte dos jornalistas: adrenalina. Enquanto alguns eventos têm glamour, outros têm o risco no melhor estilo James Bond. Estar no front da notícia é o que movimenta a vida de um profissional da imprensa. Não importa se esse front é a rua onde acontece uma baderna ou a tela do computador. O negócio é ver a vida fervilhando, seja pelo fato em si ou pelas reticências da notícia.

A briga pela audiência obriga esse tipo de situação. E os que concordam com tal status poderiam escarafunchar os bastidores do protesto, pois prestariam um serviço muito maior à sociedade do que relatar quebra-quebras realizados por baderneiros de aluguel.

Os protestos realizados na cidade de São Paulo decorrem da recusa dos manifestantes de participarem de um diálogo. Há por parte desses destruidores do patrimônio público e privado um discurso impositivo e ameaçador: ou a tarifa do transporte é reduzida ou a cidade será depredada. Esse tipo de comportamento avilta o mais raso conceito de democracia.

O jornalismo é marcado por dois vieses muito distintos: o corporativismo e a autofagia. Dependendo da situação prevalece um desses vieses. O momento é de corporativismo e assim será por alguns dias, até que o assunto seja atropelado por nova manchete, até porque é disso que vivem os barões da imprensa. É preciso discernimento ao se falar de democracia e excessos de parte a parte.

Não se pode criticar os militares enquanto se protege os baderneiros. É preciso equilíbrio ao analisar os fatos, pois do contrário o jornalismo tendencioso há de prevalecer. Democracia exige responsabilidade e manutenção da ordem, sem ultraje das liberdades individuais e coletivas, desde que respeitada a legislação vigente e preservados os direitos dos cidadãos, como, por exemplo, o direito de ir e vir. Qualquer incursão fora desse cenário é oportunismo barato.