(*) Ipojuca Pontes –
A legenda gramsciana recomenda que, para derrubar o capitalismo é preciso, antes de tudo, dominar os aparatos ideológicos do Estado que atuam sobre a consciência humana, um deles, o saber. No Brasil, as universidades, tomadas há décadas pelos marxistas, se converteram num aríete contra a “sociedade burguesa”. Bem, se é verdade que o Movimento Passe Livre, que dizem estar por trás das passeatas que infestam o País, traz carimbo universitário – então ele carrega em si a velha contradição revolucionária de “mudar, para continuar na mesma”.
No histórico, a luta pelo poder entre comunistas tem sido antropofágica. Feita a revolução, tomado o poder, o governo totalitário se estabelece e, para reinar sozinho, impõe a conformidade e, de passagem, quebra o pau nas costas dos dissidentes. Em retrospecto, o que ocorreu na Rússia, China e Cuba é de uma rotina enfadonha. Anote: mesmo exilado no México, o dissidente Trotsky, criador do Exército Vermelho, morreu com golpes de picareta desfechados por um esbirro de Stalin. E Camilo Cienfuegos, um dos líderes de “la revolución” cubana, evaporou-se no ar depois de um desastre aéreo tramado pelo zeloso Fidel. Já Mao, pedófilo nato, empenhou-se fundo no sacrifício de meia cúpula do PC Chinês durante o período da Revolução Cultural. Será preciso dizer que, na atual perestroika russa, o camarada Putin liquida os adversários com doses de veneno?
Disto isto, é bom reconhecer que no Brasil, depois de dez anos de desmandos, o poder corruptor do PT começou a ser confrontado nas ruas, uma grata surpresa na vida política brasileira. Como por encanto, milhares de estudantes, empregados e desempregados de várias gerações, paralisam as principais vias das grandes capitais, em especial São Paulo e Rio. O que antes parecia mera passeata para derrubar irrisórios R$ 0,20 no preço das passagens dos coletivos, ampliou-se, graças ao poder virtual da Internet e suas redes sociais, num espantoso movimento de massas, com crescentes atos de protestos, jamais registrados nos anais recentes do País.
Na refrega, a cada manifestação, mesmo com juras mútuas de uma agenda respeitosa, o pau canta sob o estrondo de coquetéis molotov, rojões, pedras, incêndios, tiros, bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e spray de pimenta. É a guerra!
Interpretações satânicas à parte (em que se diz que o PT age por trás do MPL para triturar os tucanos), no antro do poder o Planalto treme: o que diabo é isso? Lula e Dilma, malandros acuados, se apressam em clamar pelo “diálogo pacífico”. No seu marketing cínico, o ex-presidente, querendo diminuir a dimensão do tsunami, diz que o “assunto é para mesa de negociação com o prefeito Haddad”.
Já os governadores Alckmin e Sérgio Cabral, esquerdistas ineptos, descobriram que os protestos nada têm de “espontâneo”, pois encampam objetivos políticos (sem mencionar que o PCdoB, PSTU, PT e o PSOL, querendo parasitar nas costas do tubarão, foram enxotados das indignadas manifestações).
O cretinóide Arnaldo Jabor, sempre leviano, sem suspeitar que a colossal onda de indignação se espalha pela nação, acusa os manifestantes de pertencerem a desprezível classe média. Vejam só o ranço stalinista! Ora bolas, quem faz o mundo se mover é a classe média. De resto, o que foram Marx, Lênin e Fidel, a quem tanto o pernóstico escriba do Globo reverenciou, senão abastados filhotes da classe média?
O fato contagiante é que vivemos dias de luminosa percepção, em que milhões de brasileiros se insurgem diante de uma era de fraudes, roubos e mistificação. Neles, o reinado petista, refestelado em mordomias bilionárias, passou a representar para os “jovens radicais” e a população enraivecida o papel de um ente vil, irresponsável e insensível.
De minha parte, penso que depois de algum tempo a Chama Insurreta deve fenecer, quem sabe pela força corruptora do governo. Mas fica difícil admitir que a população vá se entregar fácil à sanha dos políticos. Bom teste será a eleição que se aproxima, manipulada a golpes de propaganda, dinheiro grosso e proselitismo ideológico pelos donos do poder, que farão de tudo para manter sob suas garras a galinha dos ovos de ouro.
De todo modo, sejamos justos: um forte sobro de vida parece ter acordado o Gigante Adormecido. Já era tempo.
PS: Ah, ia esquecendo: nas manifestações de protestos coletivos, que lava a alma nacional, não se vê um só espécime da classe artista, o chamado “beautiful people”. Muito natural: ela está correndo atrás da grana oficial.
(*) Ipojuca Pontes, ex-secretário nacional da Cultura, é cineasta, destacado documentarista do cinema nacional, jornalista, escritor, cronista e um dos grandes pensadores brasileiros de todos os tempos.