Trote ou Treta? Treta ou Trote?

(*) Lígia Fleury –

ligia_fleury_04Com os resultados dos vestibulares, os alunos aprovados comparecem às instituições para matricularem-se. A partir deste momento, é dada a largada para duas possibilidades: o caminho da alegria, da comemoração, do bom senso, da amizade, das boas vindas, do trote; ou o da insanidade, insensatez, violência, criminalidade, da treta.

Quando nasce um filho, os pais sonham com um futuro promissor, o melhor possível e, deste momento em diante, a vida ganha outro sabor. De início, os pais sonham pelos filhos, projetam neles os próprios sonhos, muitas vezes até os caminhos que não conseguiram trilhar. Com o tempo, os sonhos passam a ser da criança e transitam pelo querer ser jogador de futebol, bombeiro, professor, veterinário, policial…

E investimentos começam a ser feitos na perspectiva deste caminho de sucesso. O tempo os coloca nas escolas- quando conseguem vagas, claro- e com estudo e dedicação, podem ser aprovados nos vestibulares, a porta para o primeiro estágio, primeiro trabalho. É um momento a ser comemorado.

Então, por que o ritual da treta? Trote é uma brincadeira para marcar este momento, como um rito de passagem. Com alegria, brincadeiras como pintar o rosto ou outra que seja inocente e divertida, os veteranos recebem os novatos, os calouros; dão as boas-vindas, se apresentam e marcam o ingresso na Universidade ou Faculdade de maneira saudável.

Porém, o que tem ocorrido há muitos anos, é uma batalha entre calouros e veteranos. Calouros que tem medo do momento da matrícula, pois é quando são fisgados pelos já estudantes para atos estúpidos de violência, de agressão física, de uso de bebida alcoólica. É o momento da treta, momento tenso, que já chegou a marcar o fim de uma vida ao invés de celebrar o início de uma nova fase. Não sou ingênua, muito menos retrógada, mas conheço os efeitos das bebidas nos jovens. Forçá-los a se embriagar é crime, não pode ser considerada brincadeira ou trote. É treta! Tudo o que extrapola a liberdade e o direito de dizer sim ou não é treta, não é trote.

Em algumas situações, as meninas são mais expostas e, em outras, os meninos são o alvo, para serem ridicularizados. Não só no Brasil, mas frequentemente aqui, todos os anos temos as péssimas notícias de um jovem que foi hospitalizado ou perdeu a vida em tretas nas piscinas dos campi ou por outra estupidez qualquer que os veteranos irracionais insistem em realizar. O Brasil está no olho do furacão, sem segurança em casa, nas ruas, nos transportes, nos restaurantes, no lazer, no trabalho. E dentro da própria escola.

Muitas instituições estão trabalhando para que o trote seja saudável, estimulando atividades como sessões de cinema com calouros e veteranos, concurso de calouros mais bonitos, jogos esportivos, festas, apresentação do Campus pelos próprios veteranos, concursos culturais, brincadeiras com o corpo docente. Há as que enviam comunicados insistentemente aos alunos para que haja socialização consciente.

É disso que precisamos. Que esses exemplos sejam seguidos por todos e que o ingresso na graduação seja uma alegria para ficar na memória dos aprovados. Que saiam as tretas e que venham os trotes!

(*) Lígia Fleury é psicopedagoga, palestrante, assessora pedagógica educacional, colunista em jornais de Santa Catarina e autora do blog educacaolharcomligiafleury.blogspot.com.