Instabilidade no ar – O ataque de forças leais a um ex-general contra o Parlamento em Trípoli, no último final de semana, jogou a já instável política Líbia na que acredita-se ser a maior crise no país desde a queda do ditador Muamar Kadafi, em 2011. Nesta segunda-feira (19), países vizinhos, a União Europeia e o mercado de petróleo expressaram preocupação com a situação no Estado norte-africano.
O Parlamento de transição, em Trípoli, foi atacado por unidades armadas no domingo. Eleito em julho de 2012, o Legislativo provisório é considerado ilegítimo por grandes segmentos da população. Ele deveria ser substituído por um novo em fevereiro, mas prorrogou seu mandato até dezembro.
Os autores do ataque eram das chamadas Brigadas Sintan, que disseram agir em nome do general reformado Khalifa Heftar, ex-integrante da oposição a Kadafi. Batizadas com o nome de uma cidade a sudoeste de Trípoli, elas compõem um dos grupos armados mais poderosos do país. A investida contra o Parlamento teria como objetivo expulsar as milícias extremistas islâmicas e seus supostos apoiadores entre os deputados.
Coube ao coronel Mojtar Farnana, comandante da polícia militar, comunicar na TV líbia o ataque ao Parlamento. Evitando falar em golpe de Estado, ele disse que a intenção das milícias era autoproclamar um novo Legislativo e colocar em vigor uma nova Constituição, mas não deu mais detalhes. “Anunciamos ao mundo que o país não pode ser uma incubadora do terrorismo”, afirmou.
Desde a queda de Kadafi, em 2011, o país tem sido abalado por confrontos entre grupos armados e milícias. O último deles começou na sexta-feira, com um ataque de homens armados liderados pelo ex-general Khalifa Haftar contra brigadas islâmicas radicais em Bengazi, matando 79 pessoas e ferindo mais de 140.
No ataque ao Parlamento, duas pessoas morreram e mais de 50 ficaram feridas. Ao todo no fim de semana, 81 pessoas foram mortas e cerca de 200 ficaram feridas em combates em Trípoli e Bengazi.
Temor regional
Não se sabe qual é o real apoio a Heftar entres as instituições líbias. Seu nome passou a ganhar destaque apenas nos últimos meses, com o aumento da violência, e elevou a instabilidade da caótica transição do país à democracia. A incerteza, dizem especialistas, aumentou a percepção entre vizinhos de que a Líbia, sem um governo central forte e com uma série de milícias fortemente armadas e de interesses distintos, possa ser um foco de instabilidade para toda a região.
O governo, o Parlamento e o Exército acusam uma tentativa de golpe tramada por Haftar. Ele diz não reconhecer o Parlamento provisório que, segundo ele, já “expirou”. Ex-militar de 71 anos, Haftar se tornou, após a queda do ditador Muammar Kadafi, um dos mais importantes líderes militares líbios.
Ele já era militar sob o regime Kadafi, foi membro da oposição, tendo vivido nos EUA por quase duas décadas, antes de retornar do exílio em março de 2011. É tido como ligado à agência de inteligência americana (CIA) desde quando integrava a oposição a Kadafi. Segundo informações da emissora de notícias Al Arabia, ele estaria sendo ajudado também pela Arábia Saudita e pelo Egito em sua luta contra islamistas.
Haftar já tinha tentado no ano passado derrubar o governo, sem sucesso. O coronel Mochtar Fernana, que anunciou na televisão líbia o ataque ao Parlamento, seria, segundo analistas, aliado de Haftar. Entretanto, ambos se negam a falar em golpe de Estado. Desde a queda de Kadafi, cresce na Líbia a influência de grupos islamistas que também teriam ligações com rede terrorista Al Qaeda.
O chefe de política externa da União Europeia, Catherine Ashton, expressou preocupação com a situação no país africano. “A União Europeia está profundamente preocupada com a deterioração significativa da situação política e de segurança na Líbia”, disse o porta-voz de Ashton em Bruxelas nesta segunda-feira. “Apelamos a todos os lados para que evitem mais derramamento de sangue e que abram mão da violência”.
Devido à crise, a Arábia Saudita fechou sua embaixada na Líbia, enquanto a Turquia suspendeu as atividades consulares em Benghazi. A Argélia fez o mesmo, ao passo que a companhia estatal de energia argelina ordenou a retirada de todos os seus trabalhadores do país vizinho. (Com agências internacionais)