(*) Carlos Brickmann –
Como no verso clássico do poeta Guilherme de Almeida, Eduardo Campos viveu pouco para morrer bem. E morreu jovem para viver sempre. Por viver pouco, por morrer jovem, deixa uma sólida e indiscutível herança política e eleitoral. O que discute não é a existência da herança: é quem irá desfrutá-la.
Marina Silva sai na frente. Tem luz própria, já mostrou força eleitoral, é a candidata da família de Campos; e sua trajetória, do PT à oposição, é semelhante à dele. Mas a força de Marina é também sua fraqueza: desperta em parte de seu partido, o PSB, o temor de que dê preferência aos companheiros de Rede – a legenda que não conseguiu fundar, mas que é a de seu coração – e deixe os socialistas ao sol e ao sereno. Lula tem bom contato com alguns dirigentes do partido que preferem perder sem Marina a ganhar com ela. Seu objetivo é fazer com que o PSB se abstenha de indicar candidato; ou, pelo menos, provocar um racha, levando alguns socialistas para Dilma e convencendo outros a declarar-se neutros.
Aécio quer que Marina seja candidata e cresça para que haja segundo turno – desde que não cresça muito. O tucano já mostrou que não é empolgante; poderia ser ultrapassado, e Marina iria para o segundo turno contra Dilma. Também não interessa a Aécio que se realize o sonho antipetista, de Marina tirar Dilma do páreo e garantir um segundo turno sem PT. Pois o voto petista seria de Marina, jamais de Aécio. E, se Marina crescer demais, o PT tem sempre a chance de trocar Dilma por Lula. Aí muda tudo. Para citar outro poeta, Caetano Veloso, ou não.
Quem é contra
O presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, não gosta de Marina. Márcio França, secretário nacional de Finanças, chefe do PSB paulista, líder de um terço do Diretório Nacional, brigou com ela ao apoiar a reeleição do tucano Alckmin, que lhe entregou a vice, e que ela rejeita.
Cá entre nós, Marina é difícil, mesmo.
Os lugares
Marina só não será a candidata do PSB se não quiser. Se servia para vice, para substituir o presidente, por que não serviria para substituir o candidato? O tempo também é dela: até dia 22, como criar outra candidatura? Há quem fale em lançar Renata, viúva de Eduardo; mas quem a conhece bem não acredita que ela aceite.
#pronto falei
Quando um político fala a verdade, a surpresa é geral. Até por isso vale a pena ler este trecho da entrevista à Folha de Londrina de Marcelo Almeida, candidato a senador pelo PMDB paranaense, sobre a CPMI da Petrobras.
“Primeiro que não acredito em CPI do Congresso. O PT, o meu partido [o PMDB], os tucanos, não tem mais santo. Não tem partido que signifique transparência, verdade, dignidade. Os partidos, hoje, um quer jogar no outro, todo mundo errou, todo mundo roubou. Um na Petrobras, outro fez um aeroporto, outro tem Pasadena. Eu não acredito nessa ferramenta que é a CPI.”
O herói solitário
Às vezes, o Fantasma, grande personagem criado por Lee Falk e Ray Moore, ia à cidade, disfarçado de cidadão comum – OK, com sobretudo, em qualquer temperatura, cobrindo o uniforme; óculos escuros para esconder a máscara; e um lobo na coleira. Mas aceitava-se que estivesse disfarçado de cidadão comum. Ali, com sua habilidade, desafiava reis e ditadores protegidos por poderosos exércitos; e, herói solitário, solitário vencia. O Super-Homem, criado por Joe Shuster e Jerry Siegel, também não precisava de auxiliares.
Mas tanto o Super-Homem como o Fantasma são personagens de ficção: não existem na vida real. Na vida real também não existe o gatuno de dinheiro público que age sozinho. Ele até pode assumir sozinho a culpa, por dar valor à vida; mas sempre age em equipe.
O suspeito solitário
Como foram formados os cartéis e como funcionou o superfaturamento no Metrô e nos trens urbanos de São Paulo, no Governo Mário Covas, o primeiro da atual dinastia tucana? É isso que se investiga. Robson Marinho, personagem criado por Mário Covas, seu amigo e aliado, é apontado como responsável por desvio de recursos; foi afastado de seu atual cargo, ministro do Tribunal de Contas do Estado, pela mesma suspeita. Cabe à Justiça decidir se Marinho é culpado.
Mas uma coisa é certa: se agiu, não agiu sozinho. Quem bota a mão tem que dividir, ou é jogado às feras. Investigar somente Robson Marinho é no mínimo ingenuidade: todos os seus colegas de Governo, corregedores, secretários de outras pastas, ninguém notou nada? Quem analisava os contratos do Estado e os aprovava? Qual a função da Secretaria da Justiça? E da Fazenda? E dos Transportes? E do Governo? E dos Transportes Metropolitanos? Vai tudo ficar por isso mesmo? As perguntas que não querem calar: só Robson Marinho? E os outros?
Lições de Shakespeare
Eduardo Campos, ao morrer, provocou comoção nacional, transformou-se em personalidade cultuada, suas virtudes foram festejadas. Não permitamos que a frase de Marco Antônio, no discurso após o assassínio de César, volte a ser aqui aplicada: “O mal que os homens fazem vive depois deles; O bem é muitas vezes enterrado com seus ossos”.
Que o bem que poderia fazer sobreviva a ele.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.