O país do esconde-esconde

(*) Carlos Brickmann –

carlos_brickmann_161 – A nova lei, dizem os parlamentares, torna muito mais difícil a transferência para novos partidos – que não podem fundir-se aos antigos, nem têm direito às abundantes verbas do Fundo Partidário. Mas ligue os pontos: um parlamentar de qualquer partido pode se transferir para o PL, de Gilberto Kassab, sem risco de perder o mandato (pois estará indo para um partido novo). E, do PL, pode se transferir para o PSD, de Gilberto Kassab, que já tem direito às verbas. E não será o Kassab do PL que irá pedir o mandato de quem for para o PSD do Kassab. Como não dizia a grande marchinha de J. Sandoval e Carvalhinho, Kassab sabe.

2 – Dilma diz que só não vai à abertura do Congresso do PT, em Salvador, onde seu Governo será criticado, porque no mesmo dia tem de viajar a Bruxelas, onde há reunião da União Europeia (à qual o Brasil, claro, não pertence). Mas promete aparecer no encerramento, no dia 13, Santo Antônio, quando o Congresso do PT estará vazio. Ao contrário do ubíquo santo, ela estará, mas sem estar.

3 – Por lei, o teto salarial do servidor público é o de ministro do Supremo: R$ 33.700,00. Os desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul estão dentro do limite: ganham R$ 30.471,11 por mês. Mas têm também, livres de impostos, auxílio-moradia de R$ 4.377,73 e auxílio-refeição de R$ 799,00 mensais. Só? Não! O auxílio-refeição de junho de 2011 até hoje será pago de uma só vez, conforme decisão do último dia 5. Só? Não: quem trabalha na Justiça Eleitoral ganha entre R$ 3.360,91 e R$ 7.313,04 mensais a mais. E cumpriu-se a lei.

Sem regateio

O ótimo portal jurídico Espaço Vital (www.espacovital.com.br), que fez os cálculos, traz mais duas informações sobre o esconde-esconde de limites e ganhos: primeiro, o Ministério Público estadual gaúcho e o Tribunal de Contas devem seguir a mesma regra dos desembargadores. Segundo, não há como impedir judicialmente esses pagamentos. Judiciário e Ministério Público são autônomos.

E a festa continua

O Superior Tribunal Militar está comprando 17 carros automáticos Ford Fusion, com estofamento de couro, a R$ 116.320,00 cada um (no total, perto de R$ 2 milhões – mas quem seria cruel o suficiente para querer que os 15 ministros sacrifiquem seu conforto?)

Epa: se são 15 ministros, por que 17 carros? O edital de concorrência, divulgado pela ONG Contas Abertas, explica: dois carros ficam na reserva. Ministro é gente importante, não pode se sujeitar a ficar sem carro.

O time da pobreza

Nos Estados Unidos, o candidato que se elege deputado federal se muda para Washington por sua conta. Não tem direito a carro oficial. Mora onde quiser, em mansão ou quitinete, em bairro caro ou barato, desde que pague a conta. Coisa de pobre. Aqui, no país do futuro, que já deu destino aos lucros do petróleo do pré-sal antes de cumprir a formalidade de extraí-lo, é diferente. Excelências têm bons imóveis pagos pelo Tesouro. E agora a Câmara autorizou gastos de R$ 1,6 milhão para comprar novas salas de jantar, onde os deputados possam receber condignamente seus pares.

A esse jogo de esconde-esconde, de fingir que cumpre a lei enquanto as autoridades encarregadas da fiscalização daquilo que a lei determina fingem que não percebem, se chama “cortar despesas”.

Aos pés da Santa Cruz

E, por falar em cortar despesas, Dilma defendeu seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e disse que ele é tratado – e por seus aliados! – como um Judas. O vice Michel Temer completou: Levy deveria ser tratado como Jesus Cristo.

Ambos estão certos, ambos estão errados. Errados porque não há Judas dentro do Governo e ninguém trataria ministro algum como Judas. Desde os idos tempos do Mensalão, sabe-se que qualquer oferta de trinta dinheiros será sumariamente rejeitada. Levy também não pode ser tratado como Jesus Cristo: dificilmente seria este o perfil de um diretor de banco.

Mas ambos, Dilma e Temer, também estão certos: Dilma porque o ministro da Fazenda, depois de tanta paulada, talvez se convença de que, ao trocar o confortável lugar no banco por um Ministério onde seus aliados confundem Levy com Geny, seguiu o caminho errado. E Temer porque, afinal, Jesus Cristo foi ao sacrifício cercado de ladrões.

O Qatar…

Este colunista não tem qualquer informação a respeito do caso FIFA que não esteja nos jornais. Mas tem algumas pretensões de saber algo a respeito de como funciona o mundo real. Então, seguem lá três palpites:

1 – Deve ser comprovado de que tanto a escolha da Rússia como a do Qatar como sedes da Copa foram influenciadas por recursos não contabilizados.

2 – O Qatar cai: como explicarão os cartolas, um escândalo como este não pode ser aceito pela comunidade futebolística mundial, cônscia de seus deveres.

3 – A Rússia continua. Como explicarão os cartolas, estamos em cima da hora para a Copa da Rússia e não haveria tempo hábil para transferi-la.

…e a Rússia

E, claro, a Rússia tem tradição no futebol, organizou uma Olimpíada belíssima, está com tudo pronto. E, ao contrário do Qatar, é uma grande potência.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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