O medo das ruas

(*) Carlos Brickmann –

carlos_brickmann_13Dilma, ao contrário do que diz a sabedoria popular, está pronta a ceder os dedos para manter os anéis. Aliás, o que Dilma mais teme é a sabedoria popular, aquela que vem das ruas e que deve se manifestar no domingo, 16: para sobreviver, chegou a pedir socorro a Renan Calheiros. Ele tem experiência: foi um dos principais articuladores de Collor, o primeiro a perder legalmente a Presidência.

Dilma solicitou a Renan que, no Senado, bloqueie os torpedos disparados da Câmara por Eduardo Cunha. Como os dois são correligionários, pediu-lhe também que neutralize o poder de Cunha no PMDB. Renan concordou e apresentou-lhe um programa de Governo, em que o que é bom não é novo e o que é novo não é bom. Se este é o seu programa, ainda bem que não é o presidente.

Dilma almoça hoje com Lula e com o vice Michel Temer – de quem não gosta, a quem sempre tratou com descaso e que foi obrigada a engolir fazendo cara boa (o máximo possível). Por Lula, tem o temor reverencial, tem a paixão por ele de todo petista, mas tem o medo de que Lula passe por cima dela. Dilma, embora faça uma força danada para não governar, odiaria ser rainha da Inglaterra.

Dilma busca a saída. Mas deveria reler (ou ler) Alice no País das Maravilhas.

Alice – Poderia me dizer, por favor, onde está a saída?

– Isso depende muito de para onde quer ir – responde o Gato de Cheshire.

Alice – Para mim, acho que tanto faz… – disse a menina.

– Nesse caso, qualquer caminho serve – afirmou o Gato.

A dona da ideia

Quem lembrou Alice, um delicioso clássico da literatura, foi uma excelente jornalista, Bety Costa.

E ela nem citou a Rainha Louca, a que cortava cabeças.

Renan em ação

Em 1962, eleito governador de São Paulo, Adhemar de Barros chamou o professor Delfim Netto e encomendou à sua equipe um programa de Governo. Delfim, antes da posse, entregou-lhe o texto completo. Adhemar mandou traduzir tudo para o inglês, encadernou as duas versões e disse a Delfim: “Vou botar na biblioteca do palácio. Quero ver agora quem diz que não tenho programa”.

As sugestões de Renan não foram bem trabalhadas como as de Delfim, estão apenas em português, mas seu destino é o mesmo: a prateleira. Não são para valer: apenas servem para dar base à distribuição de cargos e benefícios. Se fossem aplicadas, resultariam em boa melhora das finanças, mas não das públicas.

Socorro, Janot

A melhor saída da crise para Dilma, neste momento (só neste: mais tarde a coisa até pode piorar), depende do promotor Rodrigo Janot. Se ele fizer a denúncia contra Eduardo Cunha, enfraquecerá o presidente da Câmara, hoje líder inconteste da oposição. Mas pode atingir também Renan Calheiros, e tudo muda – menos a situação da presidente.

Porque, vale repetir, seu problema não é a crise, não é a política, não é Cunha: seu problema é que ninguém mais a leva a sério.

Do sarcasmo ao deboche

O Piauí Herald, publicação humorística sofisticada, está tratando assim os problemas da presidente Dilma:

“A nova propaganda do PT começou a circular hoje:

“CASAS BRASÍLIA – Ciente da gravidade crescente da crise política, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, enviou um recado para toda a base aliada. ‘A presidenta enlouqueceu! Queima total de estoque de cargos comissionados! Garanta o futuro de três gerações de afilhados políticos!’, narrou o petista pelo alto-falante do Congresso, provocando alvoroço.

“O governo prometeu lançar na semana que vem outras propostas gestadas pelo gabinete de crises. ‘Não há tempo para mais nada! Começou o Mandato Maluco! Toda sexta-feira, um promoção enlouquecedora para quem fizer o cartão de fidelidade’, explicou, pausadamente, Edinho Silva num megafone emprestado pela CUT”.

Humor involuntário

Ainda mais estranho que o comportamento da presidente em crise é o da oposição – não a oposição real, comandada por Eduardo Cunha, mas a que se proclama oposição, do PSDB. O presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, disse que cabe ao Governo, não à oposição, buscar soluções para as crises política e econômica enfrentadas pelo país. O governador paulista Geraldo Alckmin disse que Dilma “não pode responsabilizar os outros por problemas que ela própria criou”.

Isso explica por que as candidaturas presidenciais de Alckmin e Aécio deram em água de chuchu: se a oposição não tem sugestões para resolver a crise, por que colocá-la no lugar do Governo? Por que trocar seis por meia dúzia? A propósito, se a oposição real nasceu dentro do Governo, para que oposição?

Atenção ao Supremo!

O Supremo Tribunal Federal inicia amanhã um julgamento da maior importância: decide se é crime ou não portar drogas para uso pessoal. É uma questão constitucional (se o Estado tem o direito de se envolver na vida íntima dos cidadãos) e tem repercussão geral: a decisão vale para todos os casos, em todo o país.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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