Infelizmente, política no Brasil faz-se sempre da mesma forma, não importando qual seja o partido ou o ator político: à base da transgressão, da ilegalidade, do truque. Na última sexta-feira (26), como noticiado pela imprensa nacional, o Ministério Público de São Paulo decidiu investigar Edson Aparecido, deputado federal licenciado e chefe da Casa Civil do governo Geraldo Alckmin, ambos do PSDB.
De acordo com a denúncia, Aparecido comprou um apartamento de luxo por valor declarado muito abaixo do praticado no mercado imobiliário. O imóvel pertencia a um empreiteiro que tem contratos milionários com o governo paulista.
O apartamento fica no décimo sexto andar de um edifício localizado em uma das áreas mais valorizadas da cidade de São Paulo, próximo ao Parque do Ibirapuera. A escritura do imóvel de 365 metros quadrados de área privativa, com cinco vagas de garagem, mostra que Edson Aparecido desembolsou, em março de 2007, apenas R$ 620 mil para se tornar dono do apartamento.
O negócio seria mais um entre milhares realizados nessas condições, não fosse fato de o comprador, no caso Edson Aparecido, ter pago um terço do valor real do imóvel à época – na ocasião o apartamento estava avaliado em R$ 2 milhões. Atualmente, um apartamento idêntico ao do secretário tucano, no mesmo edifício, custa R$ 9 milhões.
Aparecido comprou o apartamento de Luiz Albert Kamilos, dono da construtora Kamilos, que tem contratos milionários com o governo de São Paulo, o que torna o negócio alvo de suspeição. A empresa de Kamilos, de acordo com o Portal da Transparência do próprio governo paulista, já recebeu mais de R$ 45 milhões por serviços prestados ao Departamento de Estradas de Rodagem (DER). Mas para os tucanos isso é uma mera coincidência.
Os procuradores querem saber a razão pela qual Edson Aparecido adquiriu o imóvel por preço abaixo do mercado e como conseguiu recursos para efetuar a transação. Para tanto, o Ministério Público deverá solicitar a quebra dos sigilos bancário e fiscal do secretário tucano, homem que integra o núcleo duro do governo de Geraldo Alckmin.
Como sempre acontece, Aparecido, por meio de nota, informou que o imóvel foi adquirido de forma lícita e transparente. Ou seja, o tucano comprou um apartamento na chamada “bacia das almas” de um empreiteiro que ganha milhões de reais prestando serviço ao governo paulista.
O pano quente de Alckmin
Sempre se valendo da imagem de “bom moço” e insistindo em passar à opinião pública uma aura de office boy de sacristia, Geraldo Alckmin vem se especializando em abafar escândalos envolvendo o próprio governo e seus apaniguados.
Quando estourou o escândalo dos trens do Metrô e da CPTM, Alckmin demorou a reagir, mas em dado momento criou uma comissão externa que apuraria o caso de forma isenta. O anúncio foi feito durante evento concorrido no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, mas até agora nenhuma explicação foi dada ao contribuinte paulista, a quem coube bancar a despesa decorrente da investigação paralela. Tudo dentro do esperado, pois nenhum contratado emite parecer incriminando o contratante.
Mais recentemente, Alckmin afirmou publicamente que confia no presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, deputado estadual Fernando Capez (PSDB), acusado de integrar um esquema criminoso no âmbito das merendas escolares.
Agora, com Edson Aparecido no olho do furacão, o governador adota a mesma postura de sempre e mergulha em silêncio quase obsequioso. Fosse corajoso, Alckmin seguiria a receita do então presidente Itamar Franco, que certa feita afastou da chefia da Casa Civil da Presidência um amigo de longa data.
O mineiro Henrique Hargreaves foi acusado de corrupção, motivo suficiente para Itamar afastá-lo do cargo enquanto durasse a investigação da Polícia Federal, que recebeu carta branca do presidente da República. A PF nada encontrou contra Hargreaves, que retornou ao cargo mais forte do que quando fora afastado.
A atitude corajosa e corente de Itamar Franco não apenas preservou o próprio governo, mas evitou que o currículo de Hargreaves fosse maculado por acusações que não foram comprovadas. Tivesse o presidente da República mantido o amigo-assessor no cargo, ambos até hoje estariam enfrentando as vagas da suspeição.
Geraldo Alckmin não foge à regra da extensa maioria dos políticos brasileiros, por isso protege de forma irresponsável e obtusa seus colaboradores. Fosse inteligente, o governador mostraria à opinião pública que nada tem a temer e que em seu governo não há privilégios e nem protegidos.
Afinal, reza a Constituição Federal, em seu artigo 5º, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Mas no Brasil, essa terra de ninguém, alguns são mais iguais que os outros. Mesmo assim, Geraldo Alckmin continua sonhando com o Palácio do Planalto.