Lava-Jato: maioria dos ministros do Supremo acolhe denúncia da PGR contra Eduardo Cunha

eduardo_cunha_1015

Nesta quarta-feira (2), o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator da denúncia contra o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), votou favoravelmente à abertura de processo criminal contra o peemedebista pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Os ministros Luiz Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio Mello acompanharam a tese do relator. Os outros ministros ainda não votaram, mas já está sacramentada a decisão. Apesar de ter a maioria dos votos anunciados, o resultado ainda não é oficial, já que ainda há a possibilidade, mesmo que remota, de ministros mudarem o voto na sessão de quinta-feira, quando o julgamento será retomado.

Se o STF aceitar a denúncia, Cunha será o primeiro dos 38 parlamentares investigados no Petrolão, esquema de corrupção que funcionou na Petrobras, a passar à condição de réu.

A denúncia da Procuradoria-Geral da República acusa o deputado de ter recebido ao menos US$ 5 milhões em propina do esquema de corrupção, investigado e interrompido pela Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. De acordo com as investigações, a propina estaria ligada a contratos de navios-sonda da estatal, assinados em 2006 e 2007.

A ação foi baseada principalmente nos depoimentos, feitos sob acordos de colaboração premiada no âmbito da Lava-Jato, de Júlio Camargo e Fernando Soares, o Fernando Baiano.

Teori Zavascki afirmou em seu voto que a denúncia não traz provas de que Cunha tenha participado da negociação da propina quando da discussão dos contratos dos navios-sonda. Contudo, o ministro-relator disse que a acusação da Procuradoria traz indícios da participação do deputado na cobrança de parcelas atrasadas do acordo de propina. Por isso, o voto de Teori foi pelo recebimento parcial da denúncia, excluídos os fatos relativos à celebração dos contratos.

“Os elementos colhidos comportam sobejamente o cometimento do crime de corrupção passiva, ao menos na qualidade de partícipe, ao incorporar-se à engrenagem espúria protagonizada pelo funcionário da Petrobras Nestor Cerveró, Júlio Camargo e Fernando Soares”, ressaltou Teori.

O relator citou, principalmente, as suspeitas levantadas contra os requerimentos apresentados em 2011 pela então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha, que pedia medidas investigatórias contra empresas ligadas a Júlio Camargo. “Nesse item a peça acusatória narrou com segurança os fatos acusatórios e a conduta dos agentes”, afirmou Teori.

O ministro também revelou que as delações que embasaram a denúncia foram acompanhadas de outros indícios dos supostos crimes. “Essas colaborações não são isoladas. Elas ganham valor na medida em que são acompanhadas de elementos indiciários muitos sugestivos”, disse o ministro.

Enquanto isso, Eduardo Cunha continua negando as acusações. Inclusive, seu advogado, Antonio Fernando de Souza, afirmou no julgamento desta quarta-feira que não há provas de que seu cliente tenha recebido valores ligados à suposta propina. “Apesar das denúncias de referirem a diversas transferências de valores, nenhuma delas se refere a Eduardo Cunha”, disse Fernando de Souza.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou na sessão que o presidente da Câmara foi o responsável por “restabelecer o propinoduto” que se instalou em dois contratos de navios-sonda da Petrobras.


Antes de proferir seu voto, Teori rejeitou pedidos da defesa do deputado para a suspensão do processo. A defesa argumentava que o presidente da Câmara, assim como o presidente da República, não poderia ser processado por fatos estranhos ao seu mandato atual.

“Tal previsão constitucional se destina expressamente ao chefe do poder Executivo da União”, afirmou Teori.

O ministro também rejeitou em seu voto o pedido da defesa de Cunha para anular o depoimento complementar de Júlio Camargo, no qual o delator citou a participação do deputado no esquema de propina. Segundo o ministro, apenas o acordo de colaboração precisa ser homologado pelo STF, mas não cada um dos depoimentos.

“Não se pode confundir o acordo de colaboração, que está sujeito à homologação [pelo STF], com os depoimentos do colaborador, que independem de homologação”, disse o relator.

O advogado da ex-deputada Solange Almeida, Cláudio Rodrigues Neto, sustenta que sua cliente não pode ser acusada pelo crime de corrupção passiva, pois o delito foi realizado quando do acerto de propina relativo aos contratos dos navios-sonda da Petrobras, em 2006 e 2007.

Solange foi denunciada por ter apresentado requerimentos à Câmara, em 2011, para supostamente pressionar empresas ligadas a Júlio Camargo pelo pagamento de propina.

O defensor diz ainda que não foi apontado na denúncia que a ex-deputada teria recebido dinheiro ilícito. “Me pergunto, como vai ter participação ou coautoria em crime já consumado”, argumentou Rodrigues Neto.

Faz-se necessário ressaltar que o STF em inovando em termos de interpretação da lei e tomada de decisões, o que coloca a mais alta instância do Judiciário nacional sob suspeita. Em tempos outros, não tão distantes, indícios não eram suficientes para sequer o oferecimento de denúncia, muitos menos para o acolhimento da mesma.

Se o ministro-relator não está convencido do material carreado aos autos, que prevaleça o princípio do “in dubio pro reo”, ou seja, na dúvida favoreça-se o réu. Indício não é material probatório, portanto a sustentação do MP é falha. Em qualquer país minimamente sério, com Judiciário em igual condição, a denúncia contra Eduardo Cunha teria sido rejeitada.

Não se trata de defender o presidente da Câmara dos Deputados, até porque a política nacional tem uma carência de homens probos, mas é preciso manter a coerência jurídica, antes que o Estado democrático de direito vá pelos ares. O mesmo vale para o imediato cumprimento de sentenças condenatórias confirmadas em segunda instância, o que atropela o instituto da presunção da inocência, tão bem recepcionado na Constituição Federal de 1988.

apoio_04