Apesar de a extensa maioria da população defender – e aguardar – o impeachment, Dilma Vana Rousseff sonha em retornar ao Palácio do Planalto. Para tanto, a petista já trabalha nos bastidores a bordo do compromisso de dar uma guinada radical à esquerda. Nada parecido com o que acontece na Venezuela, mas algo que tenha inspiração em ditaduras comunistas menos caóticas, se é que isso é possível. Essa decisão decorre de um cenário em que Dilma, em eventual retorno, não teria apoio popular suficiente para se manter à frente do governo. Ou seja, o Brasil corre o risco de enfrentar uma onda vermelha, mesmo que de fachada.
Enquanto esse assunto é tratado nos subterrâneos do poder em conversas com políticos da esquerda radical, movimentos sociais (frentes “Povo Sem Medo” e “Brasil Popular”) e sindicatos simpatizantes da causa, Dilma, em público, assume o compromisso de convocar novas eleições se retornar à Presidência da República, desde que o tema seja aprovado em plebiscito. Considerando a complexa logística desse processo obtuso e inconstitucional, Dilma terminaria o mandato sem que a convocação de novas eleições fosse aprovada. Em suma, para quem fala em golpe de forma insistente, a presidente afastada mostra-se incrivelmente golpista.
O que Dilma propõe, pressionada pela cúpula do PT, é a mais absurda alternativa para um País que derrete em um cenário de crise política e caos econômico. Quadro que foi provocado pela renomada incompetência da petista.
A convocação de um plebiscito para decidir sobre novas eleições não é algo tão simples quanto parece. O primeiro passo antes da convocação do referendo seria conseguir o aval de todos os eleitos no País, o que significa convencer o vice-presidente da República, 513 deputados federais, 81 senadores, 27 governadores, mais de 5,5 mil prefeitos e alguns bons milhares de deputados estaduais e vereadores de que a renúncia coletiva é a saída. Em outras palavras, algo que ultrapassa os limites do impossível.
Para levar adiante essa ideia destrambelhada, Dilma, caso volte ao comando do País, poderia tentar a convocação de novas eleições por meio de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que certamente acabaria no STF. Isso porque a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXXVI, proíbe leis que violem o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
A mesma Carta Magna, em seu artigo 60, parágrafo 4º, não deixa dúvidas acerca da inconstitucionalidade da medida a que poderia recorrer a afastada Dilma, se de volta ao cargo. Estabelece a Constituição:
“Artigo 60 – A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I – a forma federativa de Estado;
II – o voto direto, secreto, universal e periódico;
III – a separação dos Poderes;
IV – os direitos e garantias individuais.”
A alternativa que restaria a Dilma, tão absurda quanto a anterior, seria embarcar na proposta do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), conhecido por seu radicalismo esquerdista. Randolfe prepara uma PEC para criar no Brasil o instrumento do “referendo revogatório”, que já existe na Venezuela (onde Nicolás Maduro impede a convocação), no Equador, na Bolívia e em alguns estados e cidades dos Estados Unidos, Argentina, Canadá e Suíça.
O referendo revogatório permite a convocação de consulta popular para decidir sobre a permanência ou não de um governante no poder. No caso de a deposição de Dilma ser aprovada, por exemplo, assumiria o poder o vice-presidente Michel Temer, que está interinamente como presidente por conta do afastamento decidido pelo Senado. Dependendo do tempo que restar para o fim do mandato, o vice teria de convocar nova eleição.
Considerando que a eventual a aprovação da PEC, que depende do voto de três quintos de senadores e deputados, só aconteceria no próximo ano, Temer assumiria o governo sem ter de convocar novas eleições. Traduzindo para o bom português, é melhor deixar como está. Afinal, esse é o cardápio do dia.
O referendo revogatório aparentemente amplia a participação popular, desde que a sociedade seja minimamente politizada – não é o caso do Brasil. Em outro vértice, ainda no mesmo lado, esse instrumento supõe solução mais rápida para a crise política, mas é preciso que os brasileiros tenham consciência acerca do tema, o que não é verdade. No lado oposto, o referendo revogatório aumenta sobremaneira a instabilidade política e a insegurança jurídica. Assuntos que atualmente já bambeiam nas raias do absurdo.
Porém, uma questão deveria ser levada em conta por Dilma para – recoberta pela coragem que lhe falta – compreender que sua renúncia é o melhor remédio: o referendo revogatório, se aprovado, só poderá ser convocado em 2019, depois do final do atual mandato. O motivo dessa impossibilidade é o mesmo que proíbe que uma emenda constitucional antecipe eleições: a violação do direito adquirido (CF artigo 5º, inciso XXXVI), nesse caso no âmbito do mandato eletivo.