Cômico, não fosse trágico. Assim deve ser analisado o discurso do senador Roberto Requião (PMDB-PR) contra o impeachment da presidente afastada. Gazeteiro profissional e defensor contumaz da Carta de Puebla (preferência pelos pobres), mas acostumado a viver como nababo às custas do suado dinheiro do contribuinte, Requião é o que há de mais vexatório na política nacional.
Requião, um histriônico confesso com vocação para bajulador de ocasião, desde que o seu quinhão não lhe seja negado, disse que o Senado está prestes a repetir o ato que apeou João Goulart do poder. O senador paranaense sabe que são momentos distintos da história, mas prefere ignorá-los por conveniência conhecida de muitos.
Como se fosse o profeta do apocalipse por antecedência, Roberto Requião esbravejou na tribuna do Senado: “Que ninguém, depois, alegue ignorância ou se diga trapaceado, porque as intenções do Vice, que quer ser titular, são claras, são solares”.
E o peemedebista foi além ao mencionar exemplos que, em sua opinião, retratam as aludidas más intenções de Michel Temer:
“Desvincular o reajuste das aposentadorias e pensões do aumento do salário mínimo. Será a destruição do maior instrumento de distribuição de renda do País, que é a Previdência Social. Se pensões e aposentadorias não mais acompanham o aumento do salário mínimo vai ser um massacre contra mais de 20 milhões de brasileiros. Para quê? Para pagar os juros da dívida; os juros que são hoje o maior instrumento de concentração de renda do País.”
Quando alguém não tem com argumentar para defender o próprio pensamento, a melhor saída é adotar um discurso capaz de confundir. Como o nível intelectual do Senado já não é o mesmo de outrora, Requião é alvo de loas apenas por ser dono de uma oratória truculenta e insana. Até agora o governo interino não propôs retirada de direitos no âmbito das aposentadorias, apenas mostra à sociedade que da forma como está a Previdência Social não dura muito tempo. E isso é sabido há muito.
“Rever direitos e garantias sociais acumulados ao longo dos últimos 80 anos, especialmente direitos e garantias previstos na CLT. Impor, como pedra de toque dessa revisão, o negociado sobre o legislado, senador Paim. Eliminar tímidas conquistas na área da igualdade de gênero”. Ou seja, Requião sabe que está errado, mas insiste no discurso de aluguel.
“Congelar por inacreditáveis vinte anos as despesas correntes e de investimento da União, excetuando-se as despesas financeiras com o serviço da dívida pública. Ou seja, congelar por duas décadas as despesas com saúde, educação, segurança pública, saneamento, infraestrutura, habitação, mas garantir o pagamento de juros. É como proibir que, por 20 anos, nasçam crianças, que jovens tenham acesso a escolas, que os brasileiros envelheçam ou fiquem doentes. E assim por diante.”
O ex-governador do Paraná tem o direito à livre manifestação do pensamento, como garante a Constituição Federal, mas adota esse enredo rocambolesco e ameaçador apenas porque está ciente de que os fatos não seguem essa sequência macabra. Em relação à legislação trabalhista, até mesmo os melhores especialistas na área, incluindo juízes e ministros de tribunais, entendem que é preciso mudar. Nada pode ser mais covarde e brutal do a Justiça trabalhista, que à base da canetada inviabiliza a existência de empresas e a manutenção de empregos.
“É espantoso que algum ser humano tenha um dia concebido tamanha barbaridade. E mais espantoso ainda que algum ser humano, Senador ou Senadora do Brasil, possa aprovar isso”, emendou o senador.
Roberto Requião faz essa defesa aparentemente incondicional da presidente afastada porque há muito recebeu sua contrapartida. Conseguiu empregos para parentes e apaniguados – um dos seus irmãos está no Conselho de Itaipu, com a obrigação de comparecer uma vez por mês para uma reunião e direito a salário de marajá. Se o impeachment de Dilma for confirmado, Requião perderá a boca rica. E terá de se entender com os integrantes da sua súcia.
