(*) Carlos Brickmann
Eduardo Cunha, planejador meticuloso, sabia que ser preso era seu destino. Deve estar pronto para suportar o período atrás das grades. Mas, para ele, esta prisão era aceitável, fazia parte do jogo. O que o magoou muito foi a atitude de seus aliados, que o entregaram a Sérgio Moro.
Fique claro que, sem o trator Cunha no comando da Câmara, o impeachment seria só uma proposta, Dilma estaria no Poder, e Temer não. Temer deve seu posto a Cunha; a oposição e os governistas que mudaram de lado devem seu poder e seus cargos atuais a Eduardo Cunha. Mas não hesitaram em condená-lo no conselho de Ética (faltou apenas um deputado que virasse o voto!) e em cassar seu mandato, entregando-o à mão severa de Moro. Cunha queria só adiar um pouco a votação, para que as festas natalinas jogassem o problema para fevereiro ou março, dando-lhe uma chance de manobra. Com ajuda de Temer, adiar-se-ia a decisão para 2017. Isso é o que lhe dói: a ingratidão de quem se beneficiou com seu trabalho.
Cunha é um planejador detalhista, estudioso; como o diabo, sabe mais pela experiência que por seus outros atributos. Mas não imaginava que quem se beneficiou com seu trabalho quisesse tudo, menos tê-lo a seu lado. É sabido demais para não ser perigoso. Liquidado, é mais seguro. E não conhecia a frase definitiva do sábio general De Gaulle: “A ingratidão é uma das maiores virtudes de que deve ser dotado um estadista”.
A mão que afaga
Os dois títulos destas duas notas estão num poema notável, Versos Íntimos, de Augusto dos Anjos, obrigatório para quem pensa em política:
Vês! Ninguém assistiu ao formidável/ enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera – / Foi tua companheira inseparável! Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável/ Mora, entre feras, sente inevitável/ Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!/ O beijo, amigo, é a véspera do escarro,/ A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,/Apedreja essa mão vil que te afaga,/ Escarra nessa boca que te beija!
Folha corrida
É um perigo esquecer os bons resultados da ingratidão. Mas é um perigo, também, esquecer a força de retaliação de um aliado ferido.
Cunha se candidatou à Presidência da Câmara pelo PMDB, partido aliado a Dilma. Ela tentou derrubá-lo, ele reagiu: fez passar algumas medidas de alto custo, às quais Dilma se opunha. Quiseram cassá-lo, e ele deixou claro que, se o PT votasse por sua cassação, ele movimentaria o pedido de impeachment que estava parado em sua mesa. O PT votou contra ele, ele liberou o impeachment.
Dilma e Cunha caíram juntos.
A mão que apedreja
Segundo o jornal Valor, Cunha disse a seus advogados que quer falar. Um dos advogados, Marlus Arns, já intermediou processos de delação premiada. OK, ele pode deixar mal vários deputados do baixo clero, mas isso não lhe daria o que quer: que os promotores esqueçam sua mulher e sua filha.
Já o colar de alho, a estaca de madeira, a água benta e a terra consagrada que liquidariam Michel Temer, já isso vale muito mais.
Passarinho que come pedra
O noticiário de hoje em dia fala do medo que muitos parlamentares têm de eventual delação de Cunha. Que é que esse povo andou fazendo para ter tanto medo de um deputado que foi deposto, cassado e está preso?
O anel de brilhantes
Lembra de Fernando Cavendish, da empreiteira Delta, primeiro-amigo do governador fluminense Sérgio Cabral? Agora é ele que delata. Dizem que atinge PMDB e PSDB, cita-se o senador Aloysio Nunes e o governador goiano Marconi Perillo. Mas a melhor história é de Sérgio Cabral. Conta Cavendish que Cabral e ele passeavam por Monte Carlo quando Cabral parou em frente a uma joalheria finíssima, Van Cleef & Arpels.
“Amanhã”, disse Cabral, “é aniversário de Adriana [sua esposa, Adriana Ancelmo] e preciso ver um presente”. Entraram e uma funcionária trouxe, já embalado, um anel de ouro branco e brilhantes. E ficou claro que quem pagaria a conta, uns R$ 800 mil, seria Cavendish. Ilustrando a história, foto de Adriana Ancelmo com o anel, recibo e nota em nome da Delta.
Arrasador.
Boa notícia
A artista plástica brasileira Renata Barros acaba de expor no Museu de Arte de Hangzhou, na China. É um prolongamento cultural e artístico da reunião do G20. A “2016 – China Hangzhou G20 International Art Exchange Exhibition” reúne 40 artistas desde o dia 11 até hoje. Foi a primeira vez que o encontro diplomático teve extensão artística.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.