Ex-prefeito de Foz do Iguaçu conta com alguns ministros do TSE para atropelar a Lei da Ficha Limpa

paulo_macdonald_1001

No momento em que a crise política aumenta de forma assustadora e coloca a classe política na maledicência da opinião pública, alguns alarifes de plantão ainda insistem em transformar o Brasil em reduto do “faz de conta”, algo possível apenas com o desrespeito às leis.

Com as altas instâncias do Judiciário dedicando-se nos últimos tempos a bisonhas interpretações da legislação vigente, em clara demonstração de que o bambolê da hermenêutica só entra em ação dependendo do “cliente”, a classe política tenta tudo e mais um pouco para fazer valer suas vontades.

É o caso de Paulo Mac Donald Ghisi, ex-prefeito de Foz do Iguaçu, no Paraná, que concorreu à prefeitura da cidade neste ano, mas teve o registro da candidatura cassado com base na Lei da Ficha Limpa. Condenado em segunda instância em dois processos distintos, Mac Donald teve a candidatura impugnada pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Foz do Iguaçu. Inconformado, o ex-prefeito recorreu ao TRE do Paraná, que vinte dias após a apresentação do recurso confirmou, por unanimidade, a impugnação da sua candidatura.

Paulo Mac Donald insistiu no tema e ingressou com Recurso Especial no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília, mantendo a indefinição sobre sua candidatura. Em 2 de outubro, Mac Donald foi o mais votado em Foz do Iguaçu, com 58.163 votos (42%), os quais foram considerados nulos pela Justiça Eleitoral por conta da impugnação da candidatura.

Nesta terça-feira (13), o TSE decidirá em plenário o futuro de Paulo Mac Donald, que ousa violar a Lei da Ficha Limpa apenas para fazer valer sua vontade política. O relator do processo, ministro Herman Benjamin, decidiu que Mac Donald não reunia condições legais para ser candidato, portanto está ratificada a impugnação da candidatura. Mantida essa decisão, a cidade do Oeste paranaense terá nova eleição para prefeito.

O processo só não foi votado ainda porque a ministra Luciana Lóssio, que enquanto advogada defendeu Roseana Sarney e Dilma Rousseff, apresentou pedido de vista. Lóssio estaria propensa a defender tese que simplesmente atropela não apenas a Lei da Ficha Limpa, mas a jurisprudência do próprio TSE. A ministra entende que a condenação de Paulo Mac Donald é inválida porque na sentença o magistrado não mencionou os artigo 9º e 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992).

Esse preciosismo de Luciana Lóssio, que mais parece uma invencionice de última hora a beneficiar Mac Donald, poderá ser encampado pelos ministros Gilmar Medes e Napoleão Nunes Maia Filho. Caso esse entendimento prevaleça, o País estará diante de um atentado contra a Lei da Ficha Limpa, resultado que caminha na contramão da vontade da esmagadora maioria da população.

Para esclarecer eventuais dúvidas acerca da tese mencionada, o UCHO.INFO recorreu ao ex-juiz de Direito Márlon Reis, advogado especialista em Direito Eleitoral e Partidário e com atuação nos Tribunais Superiores. Um dos idealizadores e redatores da Lei da Ficha Limpa, que impede a participação em eleições de candidatos que tenham sofrido condenações criminais em âmbito colegiado, Márlon discorda do entendimento que a ministra do TSE possivelmente apresentará na sessão desta terça-feira.

O especialista afirma que “a Lei da Ficha Limpa não exige a menção formal de algum dispositivo de lei. O que ela exige é da análise do acórdão se verifique a presença de requisitos que constam da Lei da Ficha Limpa. E quais são esses requisitos? O enriquecimento ilícito, o ato doloso”.

O advogado Márlon Reis salientou que já há jurisprudência no TSE acerca do tema. Ele lembrou que cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre a inelegibilidade, não à instancia do Judiciário que condenou o réu, no caso o impugnado candidato Paulo Mac Donald.


Márlon Reis defende a tese, ainda não analisada pelo TSE, que tem como base o artigo 224 do Código Eleitoral (Lei nº 4.737 de 19 de julho de 1965), mas contraria o que dispõe o parágrafo 3º da mesma lei. Para o advogado, uma nova eleição só é necessária quando os votos nulos alcançam mais da metade dos válidos. Esse entendimento mostra que é importante pacificar o que estabelece o caput do artigo 224 da Lei Eleitoral.

Art. 224 – Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.

§ 3º – A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.

A questão é simples: se a própria Justiça Eleitoral considera nulos os votos dados ao político com candidatura impugnada, não há razão para realizar nova eleição, devendo ser declarado vitorioso o segundo colocado no sufrágio.

Entenda os casos de Paulo Mac Donald

A 2ª Vara Federal Cível de Foz do Iguaçu condenou, por ato de improbidade, o cartunista Ziraldo Alves Pinto, o ex-prefeito Paulo Mac Donald e o jornalista Rogério Romano Bonato. O trio foi responsável pela organização e execução, em dezembro de 2005, do 3º Festival do Humor Gráfico das Cataratas, em Foz do Iguaçu. Os réus ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), com sede em Porto Alegre, que confirmou a sentença Apenas com essa decisão, em segunda instância, Mac Donald tornou-se inelegível com base na Lei da Ficha Limpa.

De acordo com a sentença, Mac Donald e Ziraldo foram condenados a ressarcir integralmente o dano causado ao erário, avaliado à época em R$ 200 mil, e tiveram os direitos políticos suspensos por oito anos. Ficaram também proibidos de contratar com o poder público municipal, receber benefícios, incentivos fiscais ou créditos (direta ou indiretamente), pelo prazo de cinco anos. Bonato teve seus direitos políticos suspensos por três anos e, pelo mesmo período, também está proibido de contratar com o poder público municipal.

Ziraldo e Bonato foram idealizadores do 3º Festhumor-2005. Com a concordância e a autorização explícita do então prefeito Paulo Mac Donald, sem formalização de contrato administrativo e com majoração indevida dos custos, o cartunista foi beneficiado com a contratação da pessoa jurídica The-Raldo Estúdio de Artes e Propaganda Ltda., por ele gerida.

O outro caso versa sobre a contratação de empresa de consultoria para prestar serviços à prefeitura de Foz do Iguaçu. A contratação deu-se por meio de carta convite, modalidade que tem valor limite de R$ 80 mil. Ao contrário do que determina a legislação, o contrato sofreu cinco aditamento, alcançando o valor final de R$ 250 mil. Seguindo o que determina a lei, a contratação deveria ter ocorrido por meio de licitação

Condenado por improbidade administrativa, com sentença também confirmada em segunda instância, Mac Donald tentou justificar a transgressão da lei. “Todas as prorrogações foram feitas mediante parecer jurídico da Procuradoria do Município. Fizemos o primeiro contrato de R$ 60 mil. Mas, os projetos em Brasília são muito demorados e não dava para a gente trocar a empresa que estava fazendo bem o serviço. Foi um ato necessário, para o bem da cidade. Custa menos da metade do que um assessor de vereador e conseguiu agilizar R$ 192 milhões. Tenho certeza que não fiz nada errado. Fizemos o que poderia ser melhor para Foz do Iguaçu”, disse à época.

apoio_04