Lava-Jato: acusados de corrupção sugerem que investigadores são incompetentes e delatores, mentirosos

A doutrina processual penal recepciona com clareza o princípio “nemo tenetur se detegere”, ou seja, o cidadão não é obrigado a produzir provas contra si mesmo, o que explica o direito do réu de permanecer calado. Entre o silêncio garantido por lei e fugir à realidade dos fatos há uma enorme e provocativa distância.

No Brasil, implicados na Operação Lava-Jato afirmam de forma recorrente que são inocentes, que as acusações são infundadas e, até mesmo, que os depoimentos dos delatores são obras de ficção, talvez “delaçõezinhas”, como sugeriu recentemente em entrevista a ex-presidente Dilma Rousseff.

Com a divulgação antecipada da temida “lista de Fachin”, fruto da segunda “lista de Janot”, a classe política brasileira entrou em polvorosa em uma semana que estava fadada a ser modorrenta por causa do feriado da Páscoa. Ao contrário, a semana, que deveria ser curta e calma, tornou-se longa e extremamente agitada. A tal ponto que a Câmara dos Deputados, instantes após a divulgação da lista, suspendeu as votações por falta de quorum. Isso porque deputados deixaram rapidamente o plenário da Casa em busca de informações.

Nove entre dez políticos que serão investigados alegam inocência, como se os brasileiros não soubessem como funciona a política no País. Aliás, como sempre afirmou o UCHO.INFO, no Brasil política só se faz com muito dinheiro, na maioria das vezes de origem duvidosa.


A situação só chegou ao estágio atual por causa da leniência da Justiça Eleitoral, que sempre fechou os olhos para a realidade. Entre a prestação de contas de candidatos a cargos eletivos, a pirotécnica de muitas campanhas e fatos noticiados pela imprensa sempre existiu enorme discrepância. Mesmo assim, a Justiça Eleitoral quase sempre aprovou contas suspeitas de campanhas de candidatos que gastaram muito mais do que declararam. Isso fomentou a corrupção e deu sobrevida ao malfadado e criminoso caixa 2.

No momento em que os investigados por corrupção tentam desconstruir o conteúdo das delações – as quais ainda precisam ser comprovadas, é importante salientar – surge um movimento que afronta o raciocínio. Se todos os acusados são inocentes, então os investigadores são incompetentes e os delatores, mentirosos.

Faz-se necessário destacar que as autoridades, por dever de ofício, têm o compromisso de combater com veemência a corrupção, ao passo que os delatores dependem da verdade para recuperar a liberdade ou para não perdê-la da noite para o dia.

Esperar que, após a avassaladora “lista de Fachin”, algum político seja tomado por instante de grandeza e admita participação no maior esquema de corrupção de todos os tempos, o Petrolão e seus pedúnculos, é acreditar em milagre. Mesmo assim, vez por outra acontecem. Até porque, segundo a lenda, Deus é brasileiro.

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