Brasil precisa regulamentar com urgência “lei das delações”, antes de ser engolido pelo denuncismo

Palco de uma insana disputa entre quadrilheiros que guerreiam pelo poder, o Brasil assiste a um espetáculo revanchista na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, onde a partir de agora será discutido o parecer do relator da denúncia por corrupção passiva contra o presidente da República, Michel Temer.

O desenrolar do processo em si não foge ao script do faroeste caboclo em que se transformou a política nacional, mas é preciso que os brasileiros de bem exijam com a máxima celeridade a regulamentação da delação premiada, antes que o País seja dragado de vez pelo denuncismo.

Quem acompanha de perto as entranhas da Operação Lava-Jato sabe como se deram muitos dos acordos de colaboração premiada. Em troca de redução de pena e de reconquista da liberdade, mesma que vigiada, delatores contam o que sabem, mas muitas vezes são obrigados a revelar o que desconhecem ou, então, aquilo que conhecem superficialmente. Isso porque a sanha dos investigadores por denunciar corruptos tornou-se incontrolável.

Essa necessidade de regulamentação encontra respaldo em algumas delações absurdas, como, por exemplo, a dos executivos da JBS, que foi premiadíssima. O empresário Joesley Batista, responsável pelo esquema que comprou quase dois mil políticos em todo o País, segundo o próprio delator, assume que cometeu crimes em série e é contemplado com um acordo que atenta contra o bom senso e a lógica.

De chofre, quando surgiram as primeiras acusações contra peemedebistas, supunha-se que a delação dos irmãos Batista estava recheada de revelações bombásticas que poderiam produzir provas irrefutáveis. Até porque, exige uma contrapartida excepcional um acordo de colaboração que concede ao criminoso o direito de não responder a ações penais, de viajar ao exterior e morar onde quiser, inclusive desfrutando de boa parte da fortuna conseguida com a ajuda de políticos corruptos.

Mas há no radar da Operação Lava-Jato algumas delações marcadas pela suspeição. Ex-presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobras, Sérgio Machado tentou inicialmente fazer um acordo de delação com a Procuradoria-Geral da República, mas não obteve sucesso. Na segunda tentativa, orientado por procuradores, Machado gravou de forma ilegal alguns próceres peemedebistas, sem que até agora provas tivessem sido produzidas a partir das informações do delator ou aberto inquérito para investigar os delatados.


O UCHO.INFO classifica as gravações de Sérgio Machado como ilegal porque esse tipo de prova serve apenas para proteger quem grava de alguma tentativa de extorsão ou ameaça, mas jamais poderá ser utilizada como instrumento de acusação. Afinal, assim determina a legislação.

Machado está cumprindo prisão domiciliar em uma luxuosa mansão em Fortaleza, ano sem antes ter definido um cronograma para a devolução do dinheiro desviado da Transpetro, que por enquanto continua investido no exterior. Não obstante, Sérgio Machado conseguiu livrar os filhos de qualquer ação penal.

Outra delação controversa foi a do doleiro Alberto Youssef. Reincidente, Youssef, que foi preso a primeira vez na esteira do escândalo do Banestado, deveria ficar na prisão, no vácuo da Lava-Jato, durante mais de duas décadas – um procurador da operação disse que ele seria condenado a mais de cem anos de prisão –, mas após trinta meses encarcerado na Polícia Federal, em Curitiba, reconquistou a liberdade.

Há também o caso do ex-presidente da OAS, José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, que iniciou as negociações para acordo de colaboração premiada, mas inexplicavelmente suspensas por decisão do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que acusou o empresário de vazar informações. Ora, se um acordo de delação depende do sigilo das informações repassadas às autoridades, os eventuais vazamentos não podem partir do delator. A não ser que aquele que delata tem vocação para viver perigosamente. Em segunda tentativa, Léo Pinheiro conseguiu firmar acordo de colaboração.

Ora, se a delação de Léo Pinheiro, repleta de provas e informações que permitiram a produção de conjunto probatório, foi rejeitada em um primeiro momento, não há como aceitar passivamente a delação de Joesley Batista, que por enquanto não convenceu em termos de provas.

Ou os brasileiros acordam para a realidade, entendendo que a corrupção precisa ser combatida com firmeza e determinação, mas com respeito à legislação em vigor, ou é melhor se acostumar com a ideia de que denunciar a esmo é a senha para a liberdade de corruptos e corruptores. Aliás, causa estranheza a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de impedir que, no decorrer das investigações e durante o trâmite de ações penais os acordos de delação, acordos firmados pelo Ministério Públicos não sejam alterados. Enfim…

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