Caos na segurança pública do Rio de Janeiro mostra que o modelo do Estado brasileiro está falido

    (Wilton Júnior – Estadão)

    Há muito o Brasil transformou-se no país do faz de conta, todos sabem. Contudo, é preciso que os brasileiros reconheçam que o modelo de Estado verde-louro está literalmente falido. O melhor exemplo dessa falência anunciada é retratado pela grave crise de segurança pública que afeta o Rio de Janeiro, situação que só não se repete em outras capitais por causa da conformação geográfica das cidades.

    Nesta sexta-feira (22), mesmo com algumas parcas incursões da polícia fluminense, os tiroteios voltaram a dominar a favela da Rocinha, na Zona Sul carioca, espalhando-se por outras sete comunidades carentes onde traficantes disputam de forma ferrenha o comércio de drogas. Como se não bastasse, um inaceitável desentendimento entre tropas federais e as autoridades do Rio de Janeiro deixou os moradores dessas comunidades à mercê da própria sorte.

    Cientes de que o problema maior da insegurança pública está no tráfico de drogas e no contrabando de armas de uso exclusivo das Forças Armadas, as autoridades nada fazem para acabar com um problema cuja solução demorará décadas. Os governantes preferem fingir que a dificuldade é pontual e momentânea, quando na verdade a questão é muito maior e mais complexa do que aparenta.

    No momento em que as forças policiais não mais representam perigo para as facções criminosas que dominam o tráfico de entorpecentes, fazendo com que os donos desse rentável negócio desafiem de maneira sistêmica e ousada o Estado como um todo, o Brasil precisa ser repensado. Ao mesmo tempo, a sociedade deve ter consciência de que a mudança não será fácil e célere.

    O primeiro passo para essa mudança é recuperar a economia nacional, que permitirá ao Estado retomar as áreas dominadas pelo crime organizado, que com o passar dos anos, diante da inoperância oficial, criaram um Estado paralelo sem os entraves da burocracia estatal.


    As regiões em que o Estado não marca presença – e são muitas – transformam-se em pouco tempo em terreno fértil para a instalação do crime organizado. Ou seja, o Brasil precisa recomeçar do zero, pois é preciso investir em educação, transporte, saúde e políticas sociais, medidas que com o passar dos anos impedirão que a maioria dos jovens carentes seja abduzida pelo crime organizado. Sem contar a necessidade de melhorar o salário dos policiais, para que a profissão atraia pessoas não suscetíveis ao poder do tráfico.

    Depois de muitas idas e vindas, o Ministério da Defesa concordou em apoiar a Polícia Militar do Rio de Janeiro na tomada da favela da Rocinha, comunidade de conformação complexa e que abriga pelo menos 100 mil moradores. As tropas federais assumiram o compromisso de fazer o cerco à Rocinha em suas duas (São Conrado e Gávea), impedindo que traficantes fujam do local, se é que isso já não ocorreu. Na operação serão usados quase mil militares e uma dezena de blindados.

    Não se pode querer que integrantes das Forças Armadas assumam o patrulhamento da capital fluminense, já que não foram treinados para o enfrentamento urbano, prerrogativa da Polícia Militar. As Forças Armadas só entram em cena, quando acionadas, para garantir a lei e a ordem.

    A presença das Forças Armadas no Rio de Janeiro não é a solução definitiva, pois quando os militares deixarem a cidade o caos voltará ao cotidiano fluminense. Como afirma o UCHO.INFO há mais de uma década, o Estado brasileiro atua na segurança pública na seara da consequência, quando deveria enfrentar a causa. Em outras palavras, os setores de segurança pública agem contra os traficantes, quando na verdade deveriam impedir (ou quase isso) a entrada de drogas e armas em território brasileiro.

    De acordo com o que reza a legislação vigente no País, o combate ao tráfico de drogas é assunto que compete à Polícia Federal, não à Polícia Militar dos estados, que tem a incumbência de combater crimes locais e dar segurança à população.

    Se o Estado nacional não unir esforços para combater o ingresso de drogas e o contrabando de armas através das fronteiras, qualquer esforço nas cidades brasileiras será inócuo. Isso porque o tráfico de drogas é uma atividade altamente rentável, que conta com uma legislação complacente e um Judiciário moroso. Resumindo, ou repensa-se o País no longo prazo, ou é melhor aceitar a ideia de que o Brasil é um faroeste caboclo a céu aberto.

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