A crise entre o Congresso Nacional e o Judiciário surgiu quando veio à tona as primeiras franjas do maior esquema de corrupção de todos os tempos, o Petrolão. Mesmo não sendo novidade, esse embate ganha terreno com o caso do senador Aécio Neves (PSDB-MG), afastado temporariamente do mandato parlamentar por decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), devendo cumprir recolhimento domiciliar noturno e não deixar o País.
Nesta quinta-feira (28), em sessão extraordinária convocada de afogadilho, o plenário do Senado pretendia destrinchar a polêmica que se criou a partir do afastamento de Aécio Neves, mas senadores preferiram votar inicialmente um requerimento de urgência no âmbito da matéria, deixando para a próxima semana o mérito da mesma, ou seja, a decisão sobre o futuro do parlamentar mineiro.
Como afirmou o UCHO.INFO em matéria anterior, as manobras para tentar salvar Aécio são prenúncio de que senadores investigados no âmbito da Operação Lava-Jato buscam blindagem em relação ao STF, pois temem enfrentar situação semelhante ao do tucano.
Há no caso em questão uma flagrante dicotomia, pois senadores afirmam que o STF não tem poder para afastar um parlamentar do seu respectivo mandato, mas é preciso conhecer a legislação vigente antes de proferir supostas aulas de Direito Penal.
Aécio Neves cobrou R$ 2 milhões do empresário Joesley Batista, preso na Polícia Federal, e combinou com o dono da JBS que seu primo receberia o montante. Joesley disse que o próprio Aécio quisesse receber o valor, ele mesmo faria a entrega. Aécio optou por deixar o recebimento a cargo de Frederico Pacheco de Medeiros (seu primo), pois se algo desse errado seria mais fácil matá-lo. Mesmo que em tom de brincadeira, a afirmação mostra que o negócio (posteriormente rotulado como empréstimo) era ilícito.
Diante da gravação da conversa entre Aécio e Joesley, a Polícia Federal registrou em vídeo o momento da entrega de uma mala com dinheiro a Frederico, que se encarregou de fazer com que os R$ 2 milhões fossem levados a Belo Horizonte de carro. Possivelmente porque os envolvidos nessa epopeia criminosa ainda não conhecem uma novidade batizada como transferência bancária.
Aécio e seus quejandos podem espernear à vontade e disparar críticas ao STF, mas não se deve esquecer que, como lembrou o ministro Luís Roberto Barroso em entrevista, o Código de Processo Penal, em seu artigo 319, estabelece algumas da medidas cautelares impostas pela Justiça ao senador tucano, como segue:
“Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;
VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX – monitoração eletrônica.”
Vale lembrar, como forma de conter a polêmica, que o mencionado artigo 319 foi inserido no Código de Processo Penal pelo próprio Congresso Nacional por meio da Lei nº 12.403 de 2011. Em suma, os senadores ora são vítimas de lei gestada no Parlamento.