As últimas horas foram tensas para o tucano Aécio Neves (MG), pois a ausência de senadores em Brasília, por causa de viagens oficiais e problemas de saúde, poderia comprometer a sessão plenária do Senado que tratou do afastamento do parlamentar mineiro. Por 44 votos contra e 26 a favor, além de uma abstenção, o Senado derrubou a decisão do Supremo Tribunal Federal, que impôs medidas cautelares a Aécio Neves, e restabeleceu o mandato do presidente licenciado do PSDB.
Afastado do mandato desde 26 de setembro, além de ter de cumprir ordem de recolhimento domiciliar noturno, Aécio foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República por organização criminosa e obstrução à Justiça, com base na delação do empresário Joesley Batista, um dos donos do grupo J&F.
O senador do PSDB foi gravado durante conversa telefônica em que exigiu do empresário propina no valor R$ 2 milhões, sob a promessa de dificultar o avanço das investigações da Operação Lava-Jato. A Polícia Federal não apenas acompanhou as tratativas do negócio criminoso, mas também a entrega do numerário a um primo de Aécio, que providenciou a transferência do dinheiro a Belo Horizonte.
Logo após a revelação de detalhes das investigações, Aécio Neves alegou que o dinheiro da propina era fruto de um empréstimo para quitar honorários do advogado que o defende no âmbito da Lava-Jato, mas a forma como o dinheiro foi repassado ao senador sugere que trata-se de uma ação criminosa. Fosse de fato um empréstimo, o dinheiro poderia ter sido repassado ao senador através de transferência bancária.
O temor de uma eventual derrota no plenário do Senado fez com que aliados de Aécio Neves se movimentassem no último final de semana para tentar uma eventual votação secreta, estratégia prontamente derrubada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF, com base em mandado de segurança impetrado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AC).
Como antecipou o UCHO.INFO, a votação não poderia ser secreta, pois no caso da prisão do então senador Delcídio Amaral a decisão tomada em plenário foi a partir de votos abertos. Na ocasião, um mandado de segurança, assinado inclusive pelo próprio Aécio, garantiu a votação aberta.
Senadores desfilaram pela tribuna do plenário para moralismos absurdos, mas o que se viu foi uma distorção interpretativa da Carta Magna, que em seu artigo 53 estabelece que a prisão de um parlamentar carece de autorização da respectiva Casa legislativa, por maioria simples de votos. O caso de Aécio Neves não envolve a decretação de prisão, cujo pedido foi prontamente rechaçado pelo STF, mas, sim, a aplicação de medidas cautelares que constam do artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).
Muitos dos discursos que ecoaram no plenário do Senado, na noite desta terça-feira, focaram em temas abjetos, como prisão descabida, condenação antecipada e cassação de mandato. O que mostra que o Parlamento vive o pior momento da sua história quando o assunto é a intelectualidade dos seus integrantes.
As medidas cautelares foram impostas pela Primeira Turma do STF porque Aécio Neves poderia, como ainda pode, atrapalhar as investigações. Afinal, o senador mineiro prometeu ao dono do J&F obstruir o avanço da Lava-Jato e tentou junto ao presidente da República uma troca no comando da Polícia Federal.
Alguns astutos enrolaram o discurso a tal ponto, que ousaram afirmar que Aécio Neves não representa qualquer perigo à sociedade e que é preciso defender a democracia. Ora, o País encontra-se diante de mais um grave escândalo de corrupção, mas o criminoso precisa ser tratado com deferência, enquanto alguém arrisca falar em defesa da democracia.