Discussão acalorada e vexatória entre Barroso e Gilmar Mendes mostra que o Estado está deteriorado

Quando defende o respeito incondicional às leis e ao Estado Democrático de Direito, o UCHO.INFO não o faz para proteger esse ou aquele político (esse não é o nosso mister), mas para que a nação funcione de acordo com o que estabelece a legislação vigente. Afinal, um povo só existe como nação a partir do momento em que aceita viver sob um conjunto de leis. Quando esse conjunto começa a ser violado de maneira frequente significa que a nação está em processo de deterioração.

A crise institucional que chacoalha o País atenta contra a democracia e amplia a incerteza em relação ao futuro. O vexatório bate-boca entre os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante sessão plenária da Corte na quinta-feira (26), expõe as entranhas de um preocupante processo de deterioração do Estado, que até um passado recente tinha no Judiciário a palavra final que garantia a democracia.

O deprimente espetáculo protagonizado por Mendes e Barroso é mais um capítulo da ópera bufa em que se transformou o Brasil. No momento em que a mais alta instância do Judiciário é transformada em palco de bate-boca rasteiro e marcado por acusações recíprocas, é porque o Estado precisa ser reinventado como um todo. O STF deveria servir passarela para a isonomia jurídica, mas nos últimos tempos o que temos visto é um bamboleio interpretativo da lei que atropela as leis, começando pela Constituição.

Acusado por Barroso de ser leniente com criminosos de colarinho branco, Gilmar Mendes transformou-se ao longo dos anos em “persona non grata” na Corte Suprema, onde coleciona inimigos figadais, a começar pelo ministro Marco Aurélio Mello, que há muito não dirige a palavra ao colega de toga.


Deixando de lado o vexame transmitido em rede nacional, é importante reconhecer que ao menos uma citação do ministro Luís Roberto Barroso é procedente e lógica: “Estado de compadrio”. Barroso mencionou tal expressão ao acusar Gilmar Mendes de interpretar a lei de acordo com o réu. O que ferem o princípio constitucional da isonomia.

O comportamento de Gilmar Mendes em muitos julgamentos da Corte é não apenas estranho, mas acima de tudo suspeito, uma vez que a legislação vigente é interpretada para favorecer o julgado, não para ser aplicada em sua inteireza. Entre os muitos exemplos desses desvarios de Mendes estão o voto que favoreceu Aécio Neves no caso do afastamento do mandato e o habeas corpus concedido ao empresário Jacob Barata Filho, do Rio de Janeiro, com quem o ministro tem relação de amizade.

Ambos os ministros erraram ao “lavar roupa suja” no plenário do STF e ao vivo, expondo as vísceras corroídas do Judiciário nacional, mas é preciso reconhecer que o tal “Estado de compadrio” foi a única coisa positiva do episódio dantesco que deixou a presidente da Corte amuada.

Para infelicidade da nação, o brasileiro tem memória curtíssima e uma assustadora preguiça política. Em vez de defender medidas radicais, como intervenção militar, o cidadão deveria cobrar o estrito cumprimento da lei por parte do Judiciário. Pode parecer um absurdo cobrar o Judiciário nesse quesito, mas essa é a dura realidade brasileira.

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