Vice-presidente da República, o general reformado Antônio Hamilton Mourão tem dados seguidas mostras de que o tempo de caserna não lhe ceifou a habilidade para sabe existir no universo do poder com destreza, escapando das armadilhas que sempre pontuam o minado campo da política. Afinal, Mourão é daqueles que ora dá no cravo, ora dá na ferradura.
Há dias, o general disse que conceder a Lula autorização para participar do velório do irmão, em São Bernardo do Campo, no Grande ABC, era uma questão humanitária, declaração que irritou a ala mais radical do bolsonarismo. Mesmo assim, Hamilton Mourão deu de ombros para os incomodados, inclusive para o presidente da República, inimigo figadal do ex-metaúrgico.
Na quarta-feira (6), o vice-presidente não perdeu a oportunidade e comentou a sentença da juíza Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que condenou Lula a 12 anos e onze meses por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia, no interior paulista.
Ao deixar seu gabinete na noite de quarta-feira, Mourão disse que Lula “não soube distinguir o público do privado” e disse que a situação do petista é “triste”. “Coitado do Lula. Infelizmente não soube distinguir o público do privado e deu nisso aí. É triste”, declarou o vice-presidente.
Crimes cometidos por agentes públicos ou políticos não são mais ou menos gravosos de acordo com o dano causado ao Estado, pois o Código Penal não tem como apêndice uma tabela que permite auferir o grau de periculosidade daquele que usa o cargo para cometer crimes em benefício próprio. Em outras palavras, políticos quando criminosos são todos iguais, sem distinção de qualquer natureza.
É preciso concordar com Mourão quando ele afirma que Lula “não soube distinguir o público do privado”, mas o vice-presidente poderia estender sua fala ao gabinete da Presidência da República, pois Jair Bolsonaro também tem essa dificuldade.
Ao nomear como assessora parlamentar uma vendedora de açaí da Vila Histórica de Mambucaba, no litoral norte fluminense, para dar água aos seus cachorros, Bolsonaro também “não soube distinguir o público do privado”. E a popular Val do Açaí foi regiamente remunerada com o suado dinheiro do contribuinte.
De igual modo, Bolsonaro “não soube distinguir o público do privado” ao contratar Nathália Queiroz como assessora parlamentar, para atuar em seu gabinete em Brasília, enquanto a filha de Fabrício Queiroz trabalhava como “personal trainer” no Rio de Janeiro. A situação tornou-se ainda mais grave porque o agora presidente da República atestou 100% da presença de Nathália.
Hamilton Mourão pode até ser bem-intencionado, mas alguém precisa lembrá-lo que “o pau que bate em Chico, bate em Francisco”. Quer dizer, “o pau que bate no ex-metalúrgico, bate no capitão”, não importando o fato de o primeiro estar preso.