Após conturbada sessão na CCJ, reforma da Previdência enfrenta “ressaca” e compasso de espera

Não é novidade para quem acompanha a política nacional com mais interesse e frequência que o presidente Jair Bolsonaro não morre de amores pela proposta de reforma da Previdência que tramita, aos tropeções, no Congresso Nacional. Tanto é assim, que seu engajamento no processo para aprovar a matéria é considerado minúsculo, ao passo que a reação de última hora, chamando líderes partidários para dialogar, despertou desconfiança.

Foi marcada de enorme responsabilidade do governo, como alertou o editor do UCHO.INFO no programa “QUE PAÍS É ESSE?”, a decisão de deixar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, a incumbência de convencer deputados e senadores sobre a necessidade de se aprovar a reforma. Por mais que Guedes saiba da importância da matéria para o equilíbrio fiscal e a retomada da economia, sua quase nula experiência política o transforma em presa fácil em um cenário que mais parece um serpentário, como é o Parlamento.

Na última semana, quando Paulo Guedes desistiu de participar de audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, alegando que a não definição do relator do projeto de reforma da Previdência, o transformaria em alvo preferencial dos partidos de oposição, este portal afirmou que o motivo alegado em nada mudaria a fragilidade do ministro como articulador político.

Na quarta-feira (3), Guedes compareceu à CCJ para explicar aos parlamentares pontos da reforma, mas sua participação, como esperado, começou e acabou em confusão e bate-boca. A divergência responsável é importante e necessária à democracia, mas para tanto é preciso responsabilidade e parcimônia por parte dos protagonistas de ambos os lados: oposição e situação.

Fazer oposição não significa ser do contra e ponto final, assim como ser situação não dá o direito de um membro do governo ser prolixo ao explicar um projeto complexo ou não suportar a pressão dos adversários políticos. É fato que tudo tem limite, mas o que se viu na CCJ na quase interminável audiência de quarta-feira foi reflexo do discurso de ódio que Jair Bolsonaro vem fermentando desde a campanha eleitoral, mas que deveria ter sido abandonado logo após o encerramento do segundo turno.


Que a proposta de reforma da Previdência não convence e deixa a desejar todos sabem, mas é importante que parlamentares e governo busquem um consenso em torno da matéria, pois o Brasil precisa sair do estado de letargia econômica em que se encontra. Se esse passo rumo à libertação não for possível por meio da reforma da Previdência, que seja por outros meios, mas que aconteça o quanto antes.

Se a audiência com a participação de Paulo Guedes começou quente, com direito a bate-boca, o final, antecipado, alcançou ponto de fervura com a fala do deputado Zeca Dirceu (PT-PR). Diz a sabedoria popular que “o fruto não cai longe da árvore”, por isso Zeca usou os termos “tigrão” e “tchutchuca” ao dirigir a palavra ao ministro da Economia. Foi o suficiente para Guedes perder o controle e rebater com destempero.

“Eu não vim aqui para ser desrespeitado, não. (…) tchutchuca é a mãe, é a avó, respeita as pessoas. (…) Isso é ofensa. Eu respeito quem me respeita. Se você não me respeita, não merece meu respeito”, esbravejou o ministro antes de deixar o recinto

Como Bolsonaro insiste em manter nas alturas sua doentia obsessão em eliminar a esquerda nacional, à oposição resta, em tese, reagir com as armas que dispõe. Contudo, nada justifica o clima de beligerância política que se instalou no País. De igual modo é injustificável a postura do filho do ex-ministro José Dirceu, que na condição de parlamentar deveria manter o decoro, começando pelo tratamento cortês aos que participam de audiências públicas, não importando se integram o governo de um adversário político.

No momento em que o Brasil carece de temperança em todos os sentidos e o Partido dos Trabalhadores precisa se reinventar depois da enxurrada de escândalos de corrupção, com direito a condenações e prisões, o que se viu na CCJ foi um espetáculo deprimente que leva a nada e aponta na direção do desânimo.

Que ninguém surja em cena com o discurso pronto de que é necessário endurecer o jogo para colocar ordem na casa, pois o que não se consegue através do diálogo não será alcançado à base da força. Ou os brasileiros começam a cobrar responsabilidade dos políticos, que devem deixar de lado a bizarrice ideológica em nome do País, ou o melhor a fazer é aceitar que o fim está próximo.