Celulares de Bolsonaro teriam sido invadidos por hackers, informa ministério, mas é preciso cautela

O Ministério da Justiça afirmou nesta quinta-feira (25) que aparelhos celulares utilizados pelo presidente Jair Bolsonaro também foram alvo de um grupo de supostos hackers presos pela Polícia Federal. A pasta não informou quando teria ocorrido a invasão e se dados dos aparelhos foram efetivamente capturados.

“O Ministério da Justiça e Segurança Pública foi, por questão de segurança nacional, informado pela Polícia Federal de que aparelhos celulares utilizados pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, foram alvos de ataques pelo grupo de hackers preso na última terça feira (23)”, diz nota do ministério.

Nesta quinta-feira (25), o caso teve novos desdobramentos. De acordo com o jornal “O Estado de S.Paulo”, um dos supostos hackers presos na operação da PF, Walter Delgatti Neto, o “Vermelho”, afirmou que deu ao jornalista Glenn Greenwald, do The Intercept Brasil, acesso a informações capturadas do aplicativo Telegram. “Os investigadores tratam o relato com cautela, uma vez que o hacker é apontado como estelionatário”, informa o Estadão.

Contudo, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, preferiu não aguardar a conclusão do inquérito e declarou no Twitter, na quarta-feira, que os detidos são “a fonte de confiança daqueles que divulgaram as supostas mensagens obtidas por crime”. Essa conexão, no entanto, inicialmente não constava na decisão do juiz federal Vallisney Oliveira, que autorizou as prisões.

Querer ligar os hackers ao The Intercept Brasil é no mínimo demonstração de desespero emoldurada por leviandade. Segundo relato de Moro, seu celular foi invadido no dia 4 de junho, ao passo que o The Intercept passou a divulgar os diálogos em 9 de junho. Considerando a quantidade de mensagens, é impossível que um veículo de comunicação consiga em tão pouco tempo analisar todo o material e produzir matéria jornalística. Somente quem conhece a fundo o jornalismo investigativo é capaz de compreender o quão complexo é um trabalho como esse.

Não obstante, o agora ministro Sérgio Moro afirmou, por ocasião da invasão do equipamento, que nada havia sido “roubado” em termos de informações. Sendo assim, causa estranheza o fato de o ministro afirmar que os hackers são fonte do site jornalístico.

Independentemente do crime supostamente cometido pelos presos, que deve ser punido de acordo com a lei, não se pode fechar os olhos para a transgressão que que marcou alguns julgamentos no âmbito da Operação Lava-Jato, já que as mensagens divulgadas mostram um claro e inequívoco conluio entre Moro e Deltan Dallgnol.

O ministro da Justiça nega ter cometido irregularidades e afirma não reconhecer a autenticidade das mensagens. No Twitter, o jornalista Glenn Greenwald declarou que o ministro “está tentando cinicamente explorar essas prisões para lançar dúvidas sobre a autenticidade do material jornalístico”.

De acordo com a PF, os presos na Operação Spoofing tiveram “variados graus de participação” nos ataques aos telefones das autoridades. O coordenador-geral de inteligência da PF, João Vianey Xavier Filho, afirmou que o grupo tem envolvimento com crimes de estelionato eletrônico e fraudes bancárias.

Ainda segundo a PF, um dos quatro suspeitos teria uma conta em aplicativo de mensagens com o nome do ministro da Economia, Paulo Guedes, e teria hackeado ou tentado invadir cerca de mil celulares, incluindo o do ministro Moro; o do desembargador federal Abel Gomes; do juiz federal Flávio Lucas; e dos delegados Rafael Fernandes, da PF de São Paulo, e Flávio Vieitez Reis, da PF de Campinas.


Mais uma vez o UCHO.INFO alerta para o perigo que representam declarações incriminatórias, muitas das quais eivadas por verbos em tempo de conjugação que deixa muito mais dúvidas do que certezas. De tal modo, cautela jamais será excessiva na condução do caso, pois por trás de toda a polemica há a tentativa bizarra de salvar a Lava-Jato e a reputação de Moro e Dallagnol.

A partir de agora, o objetivo da PF é identificar possíveis financiadores ou mandantes da ação. Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontou que um dos presos, Gustavo Henrique Elias Santos, movimentou R$ 424 mil entre abril e 29 de junho deste ano.

A esposa de Gustavo, Suelen Priscila de Oliveira, também detida na operação da PF, movimentou R$ 203,5 mil no período de 7 de março a 29 de maio do mesmo ano, segundo o Coaf, que afirma ter o casal mensal declarada não superior a R$ 3 mil.

Em depoimento à PF, Gustavo, segundo seu advogado, teria afirmado que Walter Delgatti Neto, outro membro do grupo, pretendia vender o conteúdo de mensagens capturadas para o PT. É preciso saber em que condições se deram tais depoimentos, pois não é novidade que muitas delações no escopo da Lava-Jato foram obtidas debaixo de pressão psicológica e ameaças, o que contraria o Estado Democrático de Direito.

Não se trata de defender esse ou aquele partido político, nem a ação criminosa dos envolvidos na Lava-Jato, mas de exigir a garantia do devido processo legal, como preconiza a legislação vigente no País. Assim, a afirmação de que um dos presos tinha a intenção de vender o material ao PT ou teria repassado o conteúdo das mensagens do The Intercept demonstra o desespero de algumas autoridades diante das transgressões cometidas na seara da Lava-Jato.

Que as investigações sigam o caminho da lei e os responsáveis sejam punidos com o devido rigor, sem que o Estado de Direito seja alvo de burla por conta de um projeto de poder que conta com a aquiescência de agentes públicos.

O advogado de Gustavo Elias Santos afirmou que seu cliente “não estava envolvido na empreitada criminosa” e desconhece se a suposta venda do material ao partido realmente aconteceu.

O Partido dos Trabalhadores, por sua vez, reagiu à informação, afirmando, em nota, que o ministro Sérgio Moro, cuja pasta é responsável pela PF, está atuando com “com o claro objetivo de produzir mais uma armação contra o PT”.

Sobre a suposta invasão dos celulares do presidente da República, a afirmação causa espécie, pois a mais alta autoridade do País não poderia ser informada sobre o ocorrido apenas ao final da investigação. Caso seja confirmada a invasão dos celulares de Jair Bolsonaro, o País saberá que o sistema de comunicação da Presidência e do alto escalão do governo é pífio e falho.

Um chefe de Estado não pode usar equipamentos de comunicação, no caso celulares, sem sistema de criptografia militar, o que impede qualquer tipo de ação criminosa. Afinal, se hackers invadiram os celulares do presidente, não é difícil imaginar o que são capazes de fazer governantes de outros países interessados em obter informações privilegiadas a respeito do Brasil.