Radicalismo do governo pode levar o Brasil a perder vaga no Conselho de Direitos Humanos da ONU

Cerca de 200 entidades tentam impedir que o Brasil seja eleito para o Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (CDH). A estratégia é usar a entrada da Costa Rica na disputa por uma vaga no (CDH), colocando em risco o plano do governo brasileiro.

Criado em 2006, o CDH escolhe seus 47 membros por meio de votação secreta que envolve os 193 países que integram a Assembleia-Geral da ONU. Os candidatos são divididos por região e, para o mandato de 2020 a 2022, o Brasil disputa com Venezuela e Costa Rica duas vagas disponíveis para os países da América Latina e do Caribe. A eleição ocorre nesta quinta-feira.

Para ocupar o posto para o qual foi eleito em 2006, 2008, 2012 e 2016, o Brasil precisa conquistar pelo menos 97 votos. A vaga pleiteada estava praticamente certa até o último dia 3, quando Carlos Alvarado Quesada, presidente da Costa Rica, colocou a candidatura do país centro-americano, como forma de impedir a Venezuela de assumir uma vaga no conselho.

Apesar da intenção oficial de barrar o governo de Nicolás Maduro, o movimento foi encarado como uma ameaça também à vaga brasileira, cuja relação com outros países-membros da organização tem se desgastado nos últimos meses por conta do radicalismo das medidas adotadas pela gestão Bolsonaro, principalmente no tocante aos direitos humanos.

Não bastasse o ataque a Michelle Bachelet, ex-presidente do Chile e comissária para Direitos Humanos da ONU, a relação de Jair Bolsonaro com o próprio órgão já começou conturbada. Na campanha presidencial, Bolsonaro afirmou que pretendia retirar o Brasil da ONU caso fosse eleito. O agora presidente da República retratou-se à época, esclarecendo que se referia apenas ao Conselho de Direitos Humanos.


Elaini Silva, doutora em Direito pela USP e professora de Relações Internacionais da PUC-SP, afirma que a premissa do órgão é combater a violação de direitos humanos, o que pode ser um problema tanto para a Venezuela quanto para o Brasil.

“O CDH é novo na história da ONU. Espera-se que os Estados envolvidos com grandes violações não sejam eleitos ou, caso já estejam lá, possam ser suspensos, como previsto na resolução que criou o conselho.”

“É uma situação inédita, com uma nova dinâmica. Esse elemento competitivo não costumava acontecer no contexto latino-americano, e gerou uma repercussão interessante. É o fim de uma espécie de cordialidade latino-americana que pautava as relações até agora”, diz Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais na FGV.

A ministra Damares Alves, – da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves – condenou a candidatura do governo de Nicolás Maduro para o órgão. “A Venezuela está mostrando violações de direitos humanos para o mundo. Não consigo imaginar como consegue ter a coragem de se candidatar para esse cargo”, declarou a ministra ao jornal “O Estado de S. Paulo”.

Com o governo Bolsonaro se esgueirando sobre o revanchismo ideológico, a cultura do ódio e a cizânia da sociedade, pleitear uma vaga no Conselho de Direitos Humanos da ONU configura heresia. Até porque, um presidente que homenageia ditadores e exalta a memória de torturador não tem moral para liderar uma candidatura como essa.