Em países sérios, novo presidente da Fundação Palmares estaria preso por intolerância e injúria racial

Nada pode ser pior do que a subserviência. A situação se agrava quando essa sabujice acontece no âmbito de um governo que flerta diuturnamente com o atraso e o obscurantismo, o que representa ameaça à democracia.

O sabujo da vez é Sérgio Camargo, nomeado nesta quarta-feira (27) presidente da Fundação Palmares, órgão responsável pela promoção da cultura afro-brasileira. Camargo, que substitui Vanderlei Lourenço no cargo, é militante da extrema-direita bolsonarista e nega a existência do racismo no Brasil.

Nas redes sociais, o novo presidente da fundação mantém um cipoal de ataques a personalidades negras e integrantes do movimento negro e da militância antirracista. Como se vivesse fora da realidade, Camargo, que é um adorador de Jair Bolsonaro, é a favor de temas que são objeto de críticas do movimento negro, como o pacote anticrime do ministro Sérgio Moro (Justiça) e a proposta do governo que trata do excludente de ilicitude, algo que o UCHO.INFO classifica como licença para matar.

A nomeação de Sérgio Camargo causou revolta na comunidade negra, pois frases racistas e marcadas por intolerância foram pinçadas na rede mundial de computadores para comprovar o perfil racista do nomeado.

Racismo

Sobre racismo, Sérgio Camargo escreveu, em setembro, que no Brasil existe um racismo “Nutella”, ao contrário dos Estados Unidos, onde, segundo ele, existiria um racismo “real”. “A negrada daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”, afirmou. Em agosto, escreveu que a escravidão foi “terrível, mas benéfica para os descendentes” porque negros viveriam em condições melhores no Brasil do que na África.

Confirmando sua essência racista e intolerante, o nomeado escreveu que “merece estátua, medalha e retrato em cédula o primeiro branco que meter um preto militante na cadeia por crime de racismo” e sugeriu que o movimento negro precisa ser “extinto”.

Dia da Consciência Negra

Nas contas que mantém nas redes sociais, Sérgio Camargo defendeu o fim do “Dia da Consciência Negra” e criticou manifestações culturais ligadas à população negra. Sobre a extinção do feriado, o dirigente alegou “incalculáveis perdas à economia do país”, não sem antes afirmar que Zumbi dos Palmares é “um falso herói dos negros”.

Não contente com seus destampatórios, Camargo escreveu que o feriado do Dia da Consciência Negra foi criado sob medida para o “preto babaca”, classificado por ele como “idiota útil a serviço da pauta ideológica progressista”.


Ataques a personalidades

Ele defendeu também que “alguns pretos sejam levados à força para a África”. Nesse comentário racista, que é um caso típico de polícia, Camargo e cita Lázaro Ramos e Taís Araújo como exemplo. “Sugiro o Congo como destino. E que fiquem por lá!”, escreveu.

Martinho da Vila é outra vítima da intolerância do dirigente da Fundação Palmares, que sugere que sambista deveria “ser mandado para o Congo”, por ser um “vagabundo”. Marielle Franco, ex-vereadora do Rio de Janeiro assassinada a tiros, “não era negra” e era um “exemplo do que os negros não devem ser”, escreveu Camargo.

Ele foi além: disse que Angela Davis, expoente do feminismo negro, é “baranga” e “mocreia”. Preta Gil e Camila Pitanga foram chamadas de “ladras racistas” por, segundo o próprio Camargo, dizerem ser negras “para faturar politicamente e fazer discurso vitimista”.

Os músicos Gilberto Gil, Leci Brandão, Mano Brown, Emicida e os deputados federais Talíria Petrone e David Miranda (ambos do PSOL-RJ) foram chamados de “parasitas da raça negra no Brasil”.

Religião e música

Além disso, chamou a “macumba” — termo depreciativo para se referir a religiões de matriz africana — e o “funk carioca” de “desgraças do mundo”. Sobre o hip-hop, Camargo afirmou que o gênero musical faz “apologia da maconha e do crime”.

Em qualquer país sério e com autoridades que cumprem a legislação em vigor, Sérgio Camargo já estaria preso. Contudo, nessa baderna comandada por Jair Bolsonaro um defensor do racismo, da intolerância e do ódio é premiado com um cargo na máquina estatal.

O que diz a lei

O Código Penal, em seu artigo 140, prevê para o crime de injúria – conduta de ofender a dignidade de alguém – pena, a reclusão de 1 a 6 meses ou multa.

O crime de injúria racial, por sua vez, está previsto no parágrafo 3º do mesmo artigo. A injúria racial é uma forma de injúria qualificada, cuja pena é maior, e não se confunde com o crime de racismo, previsto na Lei nº 7716/2012.

Para que fique caracterizada a injúria racial é preciso que exista ofensa à dignidade de alguém, com base em elementos referentes à sua raça, cor, etnia, religião, idade ou deficiência. Nesta hipótese, a pena é de 1 a 3 anos de reclusão.