(*) Carlos Brickmann
O presidente Bolsonaro já desancou o presidente da Argentina, Alberto Fernandez, e nem o cumprimentou pela vitória nas eleições. Já disse que com a China deveríamos tomar cuidado: não apenas eram comunistas como não tinham grande vontade de investir no Brasil – apenas de comprar o país todo. Quis mandar seu filho para Washington, para que Trump tomasse conta dele.
São apenas os três maiores parceiros comerciais do Brasil. Não faz nem um ano e, quando os chineses não aparecem para comprar alguma coisa, o nosso Governo manda chamá-los. Para a posse de Fernández, primeiro não iria ninguém para representar o Brasil, depois iria um ministro, depois não iria ninguém, seríamos representados pelo embaixador brasileiro em Buenos Aires. Na última hora Bolsonaro mandou seu vice, o general Mourão. A mal – mas o que é que los hermanos devem pensar dos negócios com o Brasil?
Quanto a Trump, provavelmente também gosta de Bolsonaro e se dispõe a retribuir as concessões que nosso presidente já lhe fez, assim que se lembrar de quem é que se trata (“Mr. President, é o pai do garoto que se orgulhava de fritar hambúrgueres na Popeye, que não vende hambúrgueres!”) Claro que Trump, que chama seu desafeto Jeff Bezzos de “Bozo”, tem dificuldade para pronunciar o nome Bolsonaro. Deve se sentir tentado a abreviá-lo – e daí?
Essa diplomacia errante só tem conserto se surgir um chanceler acertante. Cadê ele? E insegurança diplomática é tão ruim quanto insegurança jurídica.
Los vecinos
O Governo argentino assume numa situação difícil – nada pior, para eles, do que lidar com um vizinho não confiável. Fernández terá de mostrar, logo nos primeiros dias, que é o presidente, não apenas um poste escolhido pela vice Cristina Kirchner, ex-presidente e chefe de uma grande ala peronista. A situação econômica é dramática (e Fernández prometeu devolver o dinheiro à carteira dos pobres).
Há as outras alas peronistas, da extrema esquerda à extrema direita, cada uma com sua versão do peronismo. Há até, algo raro, um bloco antiperonista que já conseguiu ganhar uma eleição nacional. Cabe ao Brasil ajudar a clarear a situação – ou piorá-la de uma vez por todas.
O braço certo
Dizia o escritor italiano Pitigrilli que todo homem tem cinco minutos de imbecilidade por dia. A diferença entre os homens comuns e os gênios é que, nos seus cinco minutos, os gênios se calam. O novo presidente da Funarte gosta de usar esse tempinho para falar, que se há de fazer? Pois ele retomou um tema querido a Bolsonaro, citar nazismo e fascismo como ideologias de esquerda. Há ocasiões e interlocutores que não valem um debate.
Mas lembrar como seria o mundo se eles tivessem razão vale a pena. Poderíamos começar com o Governo fascista de Getúlio Vargas entregando à Alemanha nazista a militante comunista Olga Benário. Por que os esquerdistas fascistas teriam entregue a esquerdista comunista Olga Benário a Hitler, esquerdista nazista? E a Falange fascista do generalíssimo Franco, sendo esquerdista, por que teria lutado contra comunistas e trotskistas, seus aliados de esquerda? E tudo culminaria quando o esquerdista Hitler atacou o esquerdista Stalin, com apoio da Divisão Azul espanhola – fascista e, portanto, esquerdista.
Absurdo, não? Tão absurdo quanto gente que nem sabe o que fala pensar que pensa.
O bom e o mau
Este colunista está convencido de que a economia definirá o Governo de Jair Bolsonaro. Se a economia for mal, terá fracassado. Se for bem, terá sido um êxito, apesar de Damares, Weintraub, Salles e da família presidencial. A economia tem dado sinais de recuperação – fracos, ainda, mas aos quais nós já nos havíamos desacostumado. A brilhante economista-chefe da XP, Zeina Latif, avalia bem o desempenho da economia, mas acha que o Governo precisa avançar. “Passada a reforma da Previdência, sinalizava-se com novas propostas”, lembra. Mas a reforma tributária não avançou, a privatização da Eletrobrás ainda não saiu. Falta muita coisa. Fora as medidas econômicas, por quanto tempo o país aguentará mais de 12 milhões de desempregados?
Prender ou soltar
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou projeto de lei que permite a prisão de réus condenados em segunda instância. Mas calma: ainda há um projeto da Câmara, que deverá demorar mais, que emenda a Constituição para permitir a prisão em segunda instância. E o ano de 2019 está acabando: não há tempo de nenhum dos projetos ser definitivamente aprovado, então fica tudo para o ano que vem. Os senadores aproveitarão o recesso para mostrar a seus eleitores que votaram para antecipar as prisões, e votaram rapidamente.
Terminado o recesso parlamentar, o jogo é outro: já não haverá pressões diretas do eleitorado. Em 2020 há eleição municipal, o Congresso funciona lentamente, os períodos de trabalho são mais curtos. E por que um parlamentar que pode se ver diante de um processo votará, na hora H, em favor de leis mais duras, que poderão prejudicá-lo?
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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