(*) Carlos Brickmann
A possibilidade de impeachment preocupa Bolsonaro – tanto que negocia o apoio do Centrão (que ele chamava de “velha política”, lembra?), o que inclui Roberto Jefferson e Valdemar Costa Neto, ambos já condenados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, ambos já tendo cumprido pena de prisão. Bolsonaro não precisaria se preocupar: o caro leitor pode acreditar que Lula também participa de sua sustentação política. Já se disse contra o impeachment. Grandes advogados que sempre estiveram ao lado de Lula (Celso Antônio Bandeira de Mello, Marco Aurélio Carvalho, Lenio Streck) pedem ao Supremo que processe Sérgio Moro por prevaricação, pois deveria ter denunciado o presidente quando achou que tentava manobras ilegais. Não, não pediram que Bolsonaro seja processado por ter tentado manobras ilegais, das quais o acusou Moro só agora. Rui Falcão, ex-presidente nacional do PT, pediu ao Supremo que ordene à Procuradoria Geral que investigue se Moro cometeu outros crimes. A propósito, há fotos de Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, exultando ao saber que os petistas denunciaram Moro.
Parece estranho, mas se explica: 1) Bolsonaro quer o voto religioso, e o pessoal do Centrão é terrivelmente religioso, sempre em busca de um terço; 2) aqui é Brasil, e Brasil acima de tudo. A aliança entre Bolsonaro & Filhos, Lula, Centrão lembra a Oração de São Francisco, que louva a paz entre os inimigos: “É dando que se recebe. É perdoando que se é perdoado”.
Blowing in the wind
Sergio Moro conseguiu uma façanha notável em seu depoimento de oito horas à Justiça: conseguiu repetir, sem um só acréscimo, aquilo que estava na sua carta de demissão, bem mais curta. Não há nada de novo, apenas mais do mesmo. Alguém esperava uma bomba? Há pouco menos de três mil anos, o poeta romano Horácio criou uma frase que, traduzida, é “a montanha pariu um rato”. Este colunista é do Interior e lá usamos uma frase mais simples: “muito vento, pouca chuva”.
Na verdade, a frase não é bem essa: o vento é vento, embora malcheiroso; e a chuva é de algo que não fica bem escrever.
Sangue latino
Horácio é hoje pouco conhecido no Brasil, já que até as aulas de latim não mais existem. Mas boa parte de nossos líderes segue até hoje suas lições:
“Ganha dinheiro honestamente, se puderes. Se não, como puderes”.
“Vaiam-me na rua, mas em casa me aplaudo ao contemplar com afeto o meu dinheiro”.
Medindo as perdas 1
A demissão de Sergio Moro custou sete pontos percentuais ao Governo Federal. A pesquisa é da XP, e seu objetivo é dar a operadores da empresa e a seus clientes uma avaliação do clima político que ajude a orientar seus investimentos. Ou seja, há dinheiro em jogo na precisão dos números. Após a demissão de Moro, a avaliação negativa do Governo Bolsonaro subiu de 42 para 49% – a maior até hoje. A avaliação positiva caiu de 31 para 27%, a menor até hoje. A margem de erro é de 3,2%.
Medindo as perdas 2
Em abril, o Brasil perdeu pouco mais de R$ 5 bilhões do dinheiro de investidores estrangeiros: trouxeram R$ 260 bilhões e retiraram R$ 265 bilhões da Bolsa. Coronavírus? Em parte, sim. Mas, de janeiro para cá, antes da pandemia, o balanço já era negativo. No total, saíram quase R$ 70 bilhões estrangeiros do mercado brasileiro de ações.
Hipótese
Todas essas crises repercutem na Bolsa. O cai-não-cai de Mandetta, a saída de Moro, as manifestações em que há pedidos de fechamento do Congresso e do Supremo, os pedidos de intervenção militar… não estaria na hora de autoridades competentes analisarem se não há gente saindo da Bolsa em determinados momentos, logo antes de crises causadas por problemas bobos, e entrando de novo quando as ações caem?
Entrevista sem perguntas
Novidade brasileira: o presidente Bolsonaro disse que não responderia a perguntas numa entrevista e só falaria sobre “esta patifaria da Folha de S.Paulo”. A “patifaria” era a manchete, Novo diretor da PF assume e acata pedido de Bolsonaro – no caso, ter afastado o superintendente do Rio.
Uma repórter perguntou-lhe se ele havia pedido o afastamento. Aí vem a novidade: “Cala a boca! Eu não te perguntei nada!” Até a véspera quem perguntava era o repórter. Mas Bolsonaro estava irritado. Talvez porque as Forças Armadas tenham deixado claro, publicamente, que rejeitavam qualquer golpe – portanto, a história de que estavam a seu lado só vale enquanto não tentar ultrapassar esse limite.
Feliz, por que não?
Bolsonaro deveria estar feliz: tem a seu lado os bolsonaristas, o Centrão, Lula, todos contra Moro e o impeachment. É o triunfo da Nova Política.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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