Totalitarista, Bolsonaro insiste em ameaçar a democracia e o Estado de Direito com seus discursos torpes

 
Jair Bolsonaro continua atentando contra a estabilidade democrática e o Estado de Direito, mesmo que seus apoiadores afirmem o contrário. É inaceitável o amontoado de declarações acintosas do presidente da República contra os Poderes constituídos apenas porque ele não aceita ser contrariado e contido com base no que reza a Constituição federal e a legislação vigente no País.

A escalada de autoritarismo que emoldura o cotidiano nacional exige das autoridades competentes medidas para conter o presidente da República, apesar de a extensa maioria dos bolsonaristas defender o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Na manhã desta quinta-feira (28), à porta do Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a fazer ameaças ao STF, ao mesmo tempo em que acenou na direção do Supremo e do Congresso para eventual diálogo em busca da paz institucional. Inconformado com a operação da Polícia Federal que cumpriu mandados de busca e apreensão nos endereços de seus apoiadores, todos suspeitos de patrocinar e disseminar notícias falsas, o presidente não desiste de transformar a corporação em uma polícia de Estado, o que reforça a acusação do ex-ministro Sérgio Moro (Justiça).

“As coisas têm um limite. Ontem foi o último dia. Eu peço a deus que ilumine as poucas pessoas que ousam se julgar melhor e mais poderosas do que os outros, que se coloquem no seu devido lugar, que nós respeitamos e dizemos mais: não podemos falar em democracia sem um Judiciário independente, sem um Legislativo também independente, para que possam tomar decisões, não monocraticamente por vezes, mas as questões que interessam ao povo como um todo, que tomem, mas de modo que seja ouvido o colegiado. Acabou, porra! Me desculpem o desabafo. Acabou! Não dá para admitir mais atitudes de certas pessoas individuais, tomando de forma quase que pessoal certas ações”, disse o sempre colérico e totalitarista Bolsonaro.

Sempre recorrendo à vitimização, o que sugere um viés paranoico na própria personalidade, Bolsonaro faz ameaças ao Supremo diante da possibilidade de prisão do ministro Abraham Weintraub e do avanço do inquérito que apura notícias falsas e ataques aos magistrados da Corte. No momento em que o País enfrenta as consequências da pandemia do novo coronavírus, com milhares de mortos e infectados, o presidente da República alimenta cada vez mais a fogueira da crise institucional, apenas porque acredita que sua opinião deve ser a última e acatada por todos, sem distinção.

“Repito, não teremos outro dia igual ontem. Chega! Chegamos no limite. Estou com as armas da democracia na mão. Eu honro os meus compromissos no juramento que fiz quando assumi a Presidência da República”, disse Bolsonaro, que parece desconhecer o real significado de democracia.

A frase acima é uma ameaça explícita ao STF, já que o presidente aplaudiu a PF por ocasião do cumprimento dos mandados de busca e apreensão nos endereços do governo do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, mas se desespera quando a mesma polícia bate à aporta de seus apoiadores, todos envolvidos em um esquema criminoso de produção e distribuição de notícias falsas. Bolsonaro precisa ao menos ser razoavelmente coerente, pois a dualidade dos seus discursos deixa clara sua intenção de interferir na PF, mesmo que ele negue o fato.

Sobre não cumprir determinações judiciais, Bolsonaro ingressa em um terreno perigoso e minado, uma vez que esse comportamento é passível de punição, de acordo com o que prevê a legislação brasileira. Como, segundo a Constituição (artigo 5º, caput), “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza”, o presidente que se cuide para não acabar despejado do cargo.

“Nunca tive a intenção de controlar a Polícia Federal, pelo menos isso serviu para mostrar ontem. Mas obviamente, ordens absurdas não se cumprem. E nós temos que botar um limite nessas questões”.

 
Quem deve ter limites é o próprio presidente da República, que continua acreditando ter passe livre para desmandos típicos de déspotas, apenas porque foi eleito para comandar a nação. Não se pode confundir “independência e harmonia entre os Poderes”, como preconiza a Carta Magna, com liberdade para fazer o que bem quiser e submissão de um Poder ao outro. Quando a Constituição é vilipendiada de forma flagrante, com vem acontecendo, cabe ao Judiciário exercer o papel de guardião da lei maior, goste ou não Jair Bolsonaro.

“Essa historinha de querer criminalizar o crime de ódio é um artifício para censurar a mídia social. Essa mídia social me trouxe à Presidência. Sem ela, não estaria aqui”, disse o presidente na manhã desta quinta-feira. “Pelo amor de deus, o objetivo dessa ação é atingir quem me apoia. Se eu tivesse feito algo contra a esquerda, estariam dando pancada em mim. Eu convivo com a esquerda, posso não suportar, mas convivo. Estão perseguindo gente que apoia o governo de graça. Querem tirar a mídia que eu tenho, a meu favor, sob o argumento mentiroso de ‘fake news’.”

Bolsonaro precisa diferenciar liberdade de expressão de ações criminosas. A liberdade de expressão sempre esteve intacta, a ponto de os apoiadores do presidente terem criado um sistema ilícito de produção de notícias falsas. Qualquer cidadão é livre para manifestar o próprio pensamento, desde que arque com as consequências das próprias palavras. Não fosse assim, o Brasil estaria mergulhado em tiroteio verborrágico sem fim.

Em mais uma investida contra a história recente do País, Jair Bolsonaro afirmou que as ações que tramitam no Supremo têm como objetivo tirá-lo do poder, abrindo caminho para o retorno dos que desejam roubar o País.

“Que insanidade é essa? Sabemos qual é o objetivo de alguns. Querem me tirar da cadeira pra voltar a roubar. Eu sei que é isso. Não terão isso pra me acusar de nada, a minha vida foi revirada de perna pro ar, não acharam nada porque não tem. Mas inventar factoides, ‘fake news’ contra a minha pessoa pra me tirar da cadeira? Não vão tirar.”

Não tem moral para falar contra a corrupção o governante que em troca de apoio no Parlamento faz acordos espúrios com o “Centrão”, entregando a políticos conhecidos cargos na máquina federal, com direito a gerenciar orçamentos bilionários. Fazer acordo com Valdemar Costa Neto, Roberto Jefferson e outros tantos não dá direito a Bolsonaro de ser maledicente com os corruptos.

Ademais, mesmo com esses discursos marcados pelo falso moralismo, Bolsonaro deveria olhar para dentro do próprio governo e identificar os pontos em que o dinheiro público está escoando pelo ralo. Denúncias feitas pelo UCHO.INFO chegaram aos ex-ministros Santos Cruz e Sérgio Moro, mas ambos acabaram defenestrados quando decidiram colocar ordem na casa. Além disso, o presidente não pode fechar os olhos para o escândalo das “rachadinhas”, que tem na proa ninguém menos que o senador Flávio Bolsonaro, seu primogênito, e Fabrício Queiroz, amigo de longa data.

Bolsonaro pode enganar a turba que o apoia de maneira incondicional e irresponsável, apenas porque o radicalismo direitista pauta esse comportamento que beira a delinquência, mas a maioria da população brasileira começa a acordar para a realidade. Quem acompanha o jornalismo do UCHO.INFO sabe muito bem que não é de hoje que alertamos para o perigo que sempre representou Jair Bolsonaro à democracia e ao Estado de Direito. Se o assunto do momento é imposição de limite, que seja imposto ao presidente.