PSDB defende apuração no caso de José Serra, mas calou-se diante do escândalo da PPP da Iluminação de SP

 
Apesar dos ataques que sofremos durantes os governos petistas e os que agora são desferidos pelos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, sabem nossos leitores que nosso jornalismo, sempre profissional, não é de encomenda e sequer privilegia esse ou aquele político, independentemente da corrente ideológico. Afinal, não apenas defendemos a democracia, o Estado de Direito e a Constituição federal, mas temos como mantra o caput do artigo 5º da Carta Magna: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.

Logo após o Ministério Público Federal em São Paulo oferecer denúncia contra o senador José Serra e sua filha, Verônica Allende Serra, por lavagem de dinheiro na esfera transnacional, o PSDB saiu em defesa do parlamentar tucano, que foi governador de São Paulo e prefeito da capital paulista.

Na nota, o capítulo paulista da legenda afirma: “O PSDB de São Paulo defende a ampla e irrestrita investigação dos fatos sempre que houver questionamentos envolvendo recursos e agentes públicos. Ressaltamos nossa absoluta confiança no senador José Serra, na sua história e conduta, e na Justiça, onde as ações serão devidamente esclarecidas”.

É preciso ressaltar que não há questionamentos envolvendo dinheiro público, mas eventual pagamento de propina por meio de caixa 2 no exterior, o que configura crime, de acordo com a legislação vigente no País. Sendo assim, o tucanato paulista precisa rever o conteúdo da nota.

No que tange à defesa de ampla e irrestrita investigação, o PSDB não agiu dessa forma por ocasião do escândalo da Parceria Público-Privada da Iluminação da cidade de São Paulo, quando um esquema de corrupção foi denunciado ao Ministério Público estadual com direito a conjunto probatório tão estarrecedor quanto inquestionável. Por ocasião da denúncia, um dos promotores do caso afirmou, diante do editor do UCHO.INFO, que havia colocado as mãos sobre a quadrilha que montou um sistema de pagamento de propinas na esteira de licitação que tinha valor inicial de R$ 7 bilhões.

O escândalo era tamanho, que na sequência da denúncia ocorreram diversas demissões no Departamento de Iluminação Pública (Ilume) por determinação do então prefeito João Dória Júnior, que disse desconhecer a prática criminosa, declaração que foge à realidade dos fatos.

O estratagema bandoleiro visava desqualificar uma das empresas participantes do processo licitatório, apenas porque outra, que pagou propinas e benesses financeiras a agentes públicos, precisava vencer a disputa. E isso se deu à sombra de calúnias e devaneios interpretativos, pois era preciso manter a “galinha dos ovos de ouro”.

Para que o leitor consiga avaliar a consistência da denúncia, uma das gravações entregues ao MP paulista um participante se autoincrimina ao afirmar “não tem mais dinheiro porque o Marcelo não ganha a concorrência”. Se essa afirmação não é suficiente para colocar todos os envolvidos na cadeia, que o probo PSDB explique o que é.

No tocante aos esclarecimentos dos fatos no escopo da Justiça, o PSDB não se pronunciou quando, em dezembro de 2018, o Ministério Público estadual decidiu arquivar o inquérito por falta de provas, mesmo depois de os promotores terem afirmado ao editor deste portal que o conjunto probatório era irrefutável.

 
Ao olho do furacão foi arrastada a então primeira-dama paulista, Beatriz Maria Bettanin Dória, hoje primeira-dama do Estado, suspeita de determinar que o Ilume reformasse e modernizasse a iluminação do palco do santuário Theotókos, comandado pelo popular padre Marcelo Rossi.

Um e-mail entregue ao MP-SP revela que a Prefeitura paulistana realizou os mencionados serviços por intermédio da empresa FM Rodrigues, que era responsável pela manutenção da iluminação da cidade e liderou o consórcio vencedor da PPP, cujo contrato foi suspenso por determinação da Justiça e retomado com as bênçãos do prefeito Bruno Covas após absurda decisão das instâncias superiores do Judiciário.

O UCHO.INFO tem cópia do citado e-mail e uma gravação em que um então servidor do Ilume, exonerado na esteira do escândalo de corrupção, dá ordens por telefone para que funcionários da FM Rodrigues executem o serviço no santuário.

Beatriz Dória foi convocada pelo MP para depor na qualidade de testemunha e negou ter solicitado a instalação de equipamentos de iluminação na parte interna do templo do padre Marcelo. O depoimento da ex-primeira-dama foi desmontado pelas declarações do técnico de iluminação do templo, Antonio Nunes de Miranda Sobrinho, que em junho de 2018 disse aos promotores que a ex-primeira-dama da cidade havia dado ordem para instalar luzes de LED, um equipamento para efeitos e uma mesa para controlar a intensidade da iluminação.

Ninho tucano

Não obstante, o PSDB não defendeu a apuração dos fatos envolvendo o então secretário municipal de Serviços e Obras, Marcos Penido, que interferiu no processo de licitação da PPP da Iluminação e em e-mail deu a entender que Dória não apenas sabia da interferência, mas havia determinado o roteiro para beneficiar o consórcio FM Rodrigues/Consladel.

Além disso, o tucanato paulista não defendeu a apuração de uma grave acusação contra Penido e Júlio Semeghini, então secretário municipal na gestão Dória. Na denúncia levada ao Ministério Público há uma gravação em que a ex-diretora do Ilume fala de maneira clara e incontestável: “Penido e Semeghini recebem propina da Eletropaulo e todo mundo sabe”.

Com a divulgação do escândalo, o gabinete de João Dória correu para que a acusadora assinasse documento pífio negando que tivesse interferido no processo de licitação da PPP da Iluminação Pública e que soubesse sobre o pagamento de propina a Penido e Semeghini. À época, a Eletropaulo prometeu tomar providências, mas até agora nada foi esclarecido, pois não há interesse de esclarecer o assunto. De lá para cá, a Eletropaulo foi vendida para a Enel.

A hipocrisia que emoldura João Dória Júnior chega a ser nauseante. Após a acusação do MPF contra Serra e a Polícia Federal cumprir mandado de busca e apreensão na casa do senador, o governador afirmou que apoia a operação Lava-Jato e defende ampla e irrestrita investigação dos fatos sempre que houver questionamentos envolvendo agentes e recursos públicos.

Resumindo, o PSDB de São Paulo precisa rever seus valores e bandeiras, deixando o falso moralismo de lado, pois nada foi feito pela legenda para ajudar no esclarecimento do escândalo da PPP da Iluminação Pública da maior cidade brasileira. Pelo contrário, a agremiação política simplesmente se calou diante da decisão do MP-SP de arquivar a investigação por falta de provas, logo após João Dória ser eleito para ocupar o Palácio dos Bandeirantes.

Esse cenário mostra um possível desprestígio de Serra no ninho tucano e excesso de condescendência da legenda com Dória, que há muito tomou o partido para si. Com a palavra, o presidente do estadual do PSDB, Marco Vinholi, e o presidente nacional da legenda, Bruno Araújo.