O pior presidente do mundo

(*) Gisele Leite

Os norte-americanos (1) acalentam uma lista contendo os piores presidentes, formada pela votação de cientistas políticos, sociólogos e historiadores. Nós, brasileiros, não temos propriamente um rol, mas, em tempo de pandemia já podemos deduzi-lo.

Os indicadores econômicos tais como PIB e, entre outros, não podem servir de principal critério posto que enganem e, podem ser manipuladas bem como as estatísticas e, ainda, as Fake News. Precisa-se urgentemente de governo que tenha planejamento, além de contribuir para efetiva construção e aperfeiçoamento crescente da democracia.

Para a listagem carecemos de responder: qual foi o presidente que ajudou a construir um país melhor? Com respeito à vida, à dignidade humana e às liberdades? São questões delicadas e complexas e, nem sempre facilmente respondíveis.

Segundo Pedro Dória do Canal Meio em quinto lugar posicionou Emílio Garrastazu Médici (2), ou seja, o General Médici que em seu governo investiu pesadamente na indústria siderúrgica, petroquímica e construção naval e, ainda, nas empresas estatais.

O curioso é que foi no exato momento em que o mundo vivenciava o derradeiro suspiro do pós-guerra. Preocupou-se, ainda, com a propaganda oficial, capaz de criar uma realidade paralela coroada por bordões como: “Brasil: Ame-o ou Deixe-o”; “Pra frente, Brasil” citado de forma saudosa por Regina Duarte (3) (ex-secretária da Cultura) ou viúva Porcina, como preferir. Vendeu-se um país sustentável e rico enquanto os porões se entupiam de presos políticos e, de sensacionais desaparecimentos de opositores.

Em quarto lugar, Jânio da Silva Quadros (4) que conseguiu superar Médici (5), o presidente do milagre brasileiro (6), afinal, só tinha discurso, porém, não tinha nenhum projeto de governo. Exibia uma face belicosa e agressiva e acalentava o profundo desejo de ficar no poder para sempre. Utilizou-se da renúncia como estratégia, diante de forte crise de confiança instaurada entre civis e militares e, ainda, envolvendo o seu então vice João Goulart. Renunciou, acreditando plenamente que seria reconduzido nos braços do povo para então lá permanecer.

Jânio disparou uma grotesca crise no país que mais tarde, resultaria em ditadura militar. Aliás, criava crises propositalmente, gerando instabilidades para permanecer no poder como o ideal salvador da pátria e redentor da nação.

Em terceiro lugar, o honorável Arthur da Silva Bernardes que foi quem ordenou o bombardeiro da segunda maior metrópole brasileira, em 1924 (7), em São Paulo. Interveio militarmente nos Estados cujos governadores eram seus desafetos e, provocou uma guerra civil no Rio Grande do Sul, a fim de derrubar, seu maior adversário político (Borges de Medeiros). Manteve o país em estado de sítio (8) onde as liberdades ficaram suspensas e, representou um dos mais autoritários Presidentes da República.

Em segundo lugar, desponta garboso Marechal Floriano Vieira Peixoto um legítimo autocrata que chegou utilizar-se de um encouraçado na Baia de Guanabara e, ameaçou bombardear o Rio de Janeiro, caso o então Presidente Deodoro da Fonseca não renunciasse (9).

Um vice-presidente traidor e, prosseguiu sua saga demitindo os governadores dos Estados que não lhe fossem leais, aliás, nessa época, era perfeitamente possível.

Assumiu a presidência num golpe de Estado (10) e, logo em seguida, apesar de tanto reclamar do estado de sítio decretado por Arthur Bernardes (11), reiterou a mesma prática. Procurou equipar solidamente o exército brasileiro para enfrentar as inúmeras revoltas que pipocavam no país e, promoveu o fuzilamento de 185 pessoas (12), incluindo um Marechal, e sem haver qualquer processo ou julgamento. E, num gesto de auto-homenagem mudou o nome da cidade (Desterro), o que hoje corresponde a uma das capitais brasileiras.

Historiadores, em verdade, apontam que Prudente de Moraes foi o primeiro presidente da República democraticamente eleito no Brasil e, que tanto Deodoro como Floriano só assumiram o poder meio de golpe político. Mas, são unânimes em apontar que Floriano Peixoto (13) foi um dos piores presidentes da História brasileira.

Enfim, chegamos ao número um que é, infelizmente, Jair Messias Bolsonaro e, tal qual Jânio Quadros se alimenta de crises, sendo que em sua campanha prometeu em retórica o combate à corrupção, mas, quando ganhou a eleição, não apresentou concretamente nenhum projeto de governo até a presente data. Não tem projeto para educação, nem para saúde e quiçá para a economia. Ressalte-se que a reforma da previdência só saiu finalmente, posto que já se encontrasse encaminhada e alinhavada devidamente pelo governo anterior.

Felizmente, o atual modelo federativo brasileiro não admite o poder de influência direta tal como procedera tanto Floriano Peixoto como Arthur Bernardes. No entanto, trata os governadores, principalmente do RJ e SP como se fosse um presidente da república velha.

Com sua claque montada de simpatizantes situada à beira do Palácio da Alvorada, Bolsonaro é ovacionado (somente lá). Aliás, o atual presidente adoraria ser Médici, talvez seja por isso, que tanto apoio as manifestações de retorno do AI-5 e do fechamento do STF e do Congresso Nacional.

A retórica de Bolsonaro cogita de patriotismo e nacionalismo apesar de ter ao fundo no cenário, a bandeira dos EUA e, ainda, em pleno quatro de julho comemorar efusivamente a independência norte-americana. Está evidente que Bolsonaro se inspira em Trump (14), só faltou recomendar aplicações de cloro (hipoclorito de sódio) (15) nas veias, mas já receitou a cloroquina (16).

Não obstante, os cientistas e a OMS que alerta que pode causar efeitos colaterais e não tem eficácia comprovada no tratamento da Covid-19.

Esse rol dos piores (17) revela todos os líderes da cizânia e, com a crise do coronavírus promovei o Bolsonaro ao topo da lista, pois nunca houve um presidente que mostrasse tamanha indiferença com a morte de mais de sessenta mil pessoas em todo país. Fora incapaz (18) de mostrar empatia diante do impactante número de infectados e, ainda, do total colapso da saúde pública e, expressou uma lapidar e infantil fraseologia: “E daí?”.

Registre-se, ainda, que não presta homenagem nem aos grandes artistas vitimados, isso não ocorreu nem na ditadura militar. Não se trata de plano ruim de governo. Apenas, nunca alguém tão despreparado para presidência da república assumira o cargo, sem ter atenção à liturgia e sequer ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Ideologicamente radical e cercado de autêntica tropa de militares e, ainda, de olavistas de plantão, estão todos reunidos e confabulantes no já famoso gabinete de ódio. Enfim, conforme sintetizou brilhantemente Pedro Dória, é o caos temperado com a falta de empatia. Aliás, recomento o Canal Meio.

Referências I:

(1) Os quatro piores presidentes norte-americanos segundo as pesquisas da Universidade de Quinniplac são: Barack Obama que superou seu antecessor George W. Bush e, logrou êxito, em permanecer em primeiro lugar no ranking dos últimos setenta anos. Seguido de Richard Nixon e Jimmy Carter.

(2) Costa e Silva já estava enfermo ao final de 1969, o que fez com que os membros do regime militar optassem por um novo nome para continuar no comando. E, na época, o nome mais cotado era o General Albuquerque Lima que era a figura proeminente entre os jovens oficiais do exército, mas havia os grupos que se alinhavam com um estilo mais ortodoxo e resolveram, então, aprovar o General Emílio Médici.

(3) Em 20 de maio fora anunciado o afastamento do comando da Secretaria Especial da Cultural, embora não tenha sido logo exonerada. A saída da pasta e assunção na Cinemateca Brasileira, conforme aventado pelo Presidente, não constam no Diário Oficial da União. Ainda maio, o Presidente anunciou que o ator Mario Frias assumiria a função. Depois de quinze dias após deixar o cargo de Secretária Nacional de Cultura, Regina se pronunciou desabafando que fora traída por Bolsonaro. (In: https://radaramazonico.com.br/regina-duarte desabafa-e-diz-que-foi-traida-por-bolsonaro/).

(4) Foi advogado, professor e político brasileiro. Fora o vigésimo-segundo presidente da república ( de 31.03.1961 até 25.08.1061) data em que renunciou. Em 1985 elegeu-se prefeito de São Paulo tomando posse em 01.01.1986, tendo sido esse seu último cargo eletivo. Foi também governador de São Paulo de 1955 a 1959, tendo ganhado a eleição de Adhemar de Barros.

(5) Em seu governo ocorreram guerrilhas rurais no Vale do Ribeira (SP), na Serra do Caparaó (MG) e no Araguaia (PA/GO) que foram derrotadas após gigantesca operação militar. Também existiram guerrilhas urbanas com relativo êxito, mas que foram debeladas graças a vasta rede de informações da Marinha, Exército que somaram ao Serviço Nacional de Informação (SNI) para enfrentar os opositores ao governo.

(6) Milagre econômico brasileiro é o nome pelo qual ficou conhecido o período entre as décadas de 1960 e 1970 vem que o país registrou forte crescimento do PIB. Apesar dos benefícios à época, o milagre econômico brasileiro causou aumento da concentração de renda no período e trouxe outros problemas após seu fim.

(7) A Revolução Paulista de 1924 igualmente chamadas de Revolução Esquecida e de Segundo cinco de julho foi a segunda revolta tenentista. E, a capital paulista fora palco do maior conflito urbano da história do Brasil, em cenas que recordavam cenas da Primeira Guerra Mundial. A cidade de São Paulo foi bombardeada por aviões do Governo Federal. O exército legalista ao governo de Artur Bernardes se utilizou do chamado “bombardeio terrificante”, atingindo vários pontos da cidade, em especial bairros operários como Mooca, Ipiranga, Brás, Belenzinho e Centro, que foram seriamente afetados pelos bombardeios. Casas e fábricas foram destruídos, corpos jaziam pelas ruas e duzentas mil pessoas fugiram em trens para o interior. Depois das três semanas que durou a revolução, o saldo de mortos foi de 503, com 4 846 feridos.

(8) Com a proclamação da República brasileira por Marechal Deodoro da Fonseca em 1889, o país vivia sob os auspícios de um novo regime político que deixaria de ser autocrático para se tornar democrático. Porém, tal regime era imposto por uma elite econômica rural. E, com apoio de grande parte da oficialidade do exército e, sem a participação do povo. Tanto que se institui um governo provisório a fim de se consolidar o novo regime e, então, institucionalizá-lo, com a aprovação de uma Constituição e para criar as formas administrativas do Estado que se faziam necessárias. Ainda que as medidas de exceção fossem consentidas pela Constituição de 1891 e impusessem restrições às liberdades e garantias individuais, tal como na tradição europeia da época. O estado de sítio não previa, dessa forma, restrição à liberdade de imprensa ou mesmo à inviolabilidade de domicílio, tal como em França, mas sim, unicamente a aplicação pelo Poder Executivo de medidas repressivas de detenção e desterros aos indivíduos. Aliás, ressaltou Rui Barbosa que tais medidas excepcionais de restrição à liberdade, devidas à natureza do estado de sítio, não poderiam se confundir com penas, pois a sua legitimidade cessava com a restauração das garantias.

(9) Em novembro de 1891, o “AQUIDABÔ cumpriu um papel decisivo na reação à tentativa de golpe de Estado contra o Marechal Deodoro. Foi de um de seus canhões que saiu o tiro de advertência à Esquadra de São Bento, chegando a danificar a cúpula da igreja da Candelária no Rio de Janeiro. O encouraçado atingiu o ápice de sua carreira em 1893, no início da Revolta da Armada, quando abrigou a bordo o Almirante Custódio de Mello, chefe de uma rebelião contra o governo do Marechal Floriano Peixoto. O navio cruzou três vezes a Baía de Guanabara, resistindo à artilharia da costa e, ainda por cima, levando a bordo o oficial que o chamara de Encouraçado de Papelão. A partir daí, seu apelido passaria a ser Casaca de Ferro.

(10) A expressão “golpe de Estado” foi elaborada por um teórico político francês do século XVII chamado Gabriel Naudé. Em seu livro Considérations politiques sur les coups-d’état (Considerações políticas sobre os golpes de Estado), publicado em 1639, Naudé dá para golpe de Estado (coup d’État, em francês) a seguinte definição: […] ações audazes e extraordinárias que os príncipes se veem obrigadas a executar no acontecimento de empreitadas difíceis, beirando o desespero, contra o direito comum, e sem guardar qualquer ordem ou forma de justiça, colocando em risco o interesse de particulares pelo bem geral. Um golpe de Estado é comumente definido como uma subversão da ordem institucional constituída de determinada nação. Essa subversão pode apresentar ou não características violentas.

(11) Arthur da Silva Bernardes (1975-1955) foi advogado e político, foi presidente de Minas Gerais de 1918 a 1922 e, também, presidente do Brasil de 1922 a 1926. Além de contar com a forte oposição por parte do baixo oficialato, confrontou-se em guerra civil no Sul com Borges de Medeiros que se elegera pela quinta vez consecutiva e, também, com o movimento operário que se fortalecia novamente. Após, a presidência fora eleito como senador da República e exerceu seu mandato até 1930.

(12) O massacre foi na Ilha de Anhatomirim e, em vinte e quatro de abril do corrente ano, completaram exatos cento e vinte e seis anos do fuzilamento sumário do Marechal Manoel de Almeida Gama Lobo D’Eça, o Barão de Batovi a fim de sufocar a Revolução Constitucionalista de 1893- 1895 segundo informam os historiadores. Entre as vítimas estavam o Desembargador Francisco Antonio Caldas e seu filho. E, um fato é curioso que Floriano Peixoto fora quem sucedeu o marechal fuzilado na Presidência da Província do Mato Grosso em 1894. Portanto, quando ordenou ao Coronel Moreira Cézar sufocar a Revolução Federalista em Santa Catarina tinha os preciosos detalhes sobre as lideranças militares em Desterro.

(13) Foi militar e político brasileiro, sendo vice-presidente e segundo presidente do Brasil, e seu governo abrangeu a maior parte do período histórico denominado de República da Espada. Seu governo foi notabilizado por tenso clima de rebeliões e promoveu uma ditadura para a salvação nacional com forte orientação nacionalista e centralizadora. Ganhou a alcunha de “Marechal de Ferro” devido à violenta força que empreendeu para suprimir a Revolução Federalista, que ocorreu na cidade de Desterro (atual Florianópolis) bem como a Segunda Revolta Armanda. E, em 15.11.1894 entregou o poder para Prudente de Moraes e, morreu no ano seguinte em sua pacata fazenda em Ribeirão da Divisa (atual Barra Mansa, RJ).

(14) O atual inquilino da Casa Branca surgiu como o quinto pior presidente dos EUA. Trump é confrontado com acusações de não ter atitude suficientemente presidenciável e, estudiosos não hesitam mesmo em compará-lo a Lincoln. Mostra-se racista e homofóbico… Muito parecido com outra figura pejorativamente notável na América do Sul. Adivinha quem é?

(15) https://valor.globo.com/mundo/noticia/2020/04/24/trump-sugere-explorar-tratamento-com-desinfetante-contra-covid-19.ghtml

(16) Pesquisas com os remédios hidroxicloroquina e cloroquina, amplamente usados no combate de doenças como lúpus e artrite reumatoide, aumentaram a esperança para o tratamento da covid-19. Apesar de ainda não haver evidências conclusivas sobre a eficácia da droga, cientistas de diferentes países dedicam tempo e esforços ao estudo de seus efeitos em pacientes com o novo coronavírus …. Veja mais em https://www.uol.com.br/vivabem/faq/covid-19-o-que-sabemos-sobre-cloroquina-e-hidroxicloroquina-tire-duvidas.htm?

(17) Há outra lista de piores que inclui o FHC, Castelo Branco, Michel Temer, Fernando Collor, Costa e Silva e Dilma Rousseff. E entre os melhores a lista inclui; Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Ernesto Geisel, Itamar Franco e João Goulart. A lista é divulgada por Gustavo Castañon.

(18) Como pior presidente democraticamente eleito para enfrentar a pandemia de Covid-19 é a opinião de Ian Bremmer, cientista político norte-americano formado em Política Internacional e autor da obra “Nós versus Eles: o fracasso do globalismo”.

Referências II:

CASTAÑON, Gustavo. Um ranking dos maiores e piores presidentes do Brasil. Disponível em: portaldisparada.com.br/politica-e-poder/ranking-presidente-do-brasil Acesso em 5.7.2020.

GOMES, Ana Suelen Tossige; MATOS, Andityas Soares de Moura Costa. O estado de exceção no Brasil republicano. Revista Direito & Práxis. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rdp/v8n3/2179-8966-rdp-8-3-1760.pdf Acesso em 4.7.2020

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

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