Bolsonaro é alvo de nova denúncia no Tribunal Penal Internacional, mas investigação pode não prosperar

 
O presidente Jair Bolsonaro foi denunciado novamente, no domingo (26), no Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes contra a humanidade e genocídio devido à sua postura diante da pandemia de Covid-19. A representação criminal foi apresentada por uma coalizão de organizações que, juntas, representam mais de um milhão de profissionais da saúde e foi endereçada à procuradora-geral da Corte, Fatou Bensouda.

Bolsonaro já é alvo de outras quatro denúncias no Tribunal, com sede na Holanda – três delas por sua atuação na crise sanitária provocada pelo novo coronavírus e uma por crimes contra a humanidade e atos que levam ao genocídio de comunidades indígenas e tradicionais. A nova denúncia é a primeira feita por profissionais da saúde, que afirmam que o presidente cometeu “falhas graves e mortais na condução da pandemia de Covid-19”.

O grupo que protocolou a queixa, liderado pela Rede Sindical Brasileira UNISaúde, alega que Bolsonaro coloca os profissionais da saúde e toda a população em risco ao “adotar ações negligentes e irresponsáveis”; defender o uso da hidroxicloroquina, medicamento sem eficácia comprovada contra a doença; e promover sucessivas aglomerações, nas quais costuma comparecer sem máscara. Além disso, o grupo salienta o fato de o Brasil estar há mais de dois meses sem ministro da Saúde.

No documento de 64 páginas, os profissionais destacam também a postura de “menosprezo, descaso e negacionismo” do presidente, que teve como consequências desastrosas o crescimento da disseminação do vírus e o “total estrangulamento dos serviços de saúde”. A representação solicita que a Corte acate o pedido, que peça ao governo federal as informações necessárias e que Bolsonaro seja convocado a depor.

“O governo Bolsonaro deveria ser considerado culpado por sua insensível atuação frente à pandemia e por recusar-se a proteger os trabalhadores da saúde do Brasil assim como a população brasileira, à qual ele prometeu defender quando se tornou presidente”, disse Marcio Monzane, secretário regional da UNI Americas, braço regional da federação internacional sindical UNI Global Union.

Desde o começo da pandemia, Bolsonaro vem negando a gravidade da situação, fato que, aliado à política ambiental, vem deteriorando a imagem do Brasil no cenário internacional. Por diversas vezes, o presidente declarou ser contrários às medidas de isolamento social e chegou a dizer que “ficar em casa é coisa de covarde”.

 
Tribunal de Haia

O Brasil apoiou a criação do Tribunal Penal Internacional, em 1998. Atualmente, a Corte conta com a participação de cerca de 120 Estados e é responsável por julgar acusados de crimes de genocídio, contra a humanidade, de guerra e de agressão.

Em abril, Bolsonaro foi denunciado em Haia pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), que alegam que o presidente praticou crime contra a humanidade ao incentivar ações que aumentam o risco de proliferação da Covid-19.

Em junho, o tribunal atendeu pedido protocolado pelo PDT e atualmente analisa denúncia por crime contra humanidade pela postura de Bolsonaro no enfrentamento da pandemia. O PDT argumenta que Bolsonaro tem contrariado recomendações para reduzir o ritmo de contágio, contribuindo, assim, para um colapso do sistema de saúde, e destaca que inúmeras vezes o presidente ignorou a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Em 2019, Bolsonaro se tornou alvo de denúncia em Haia acusado de incitação ao genocídio de povos indígenas e crimes contra a humanidade por minar a fiscalização de crimes ambientais na Amazônia. A denúncia foi apresentada pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos e pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – a Comissão Arns, entidade civil que reúne juristas e acadêmicos com a finalidade de denunciar violações aos direitos humanos.

Cinco meses após a confirmação do primeiro caso no País, em 26 de fevereiro, o Brasil chegou, no domingo, à marca de 2.419.091 infecções e 87.004 óbitos por Covid-19.

Julgamento incerto

É cedo para afirmar que o TPI levará adiante as denúncias contra Bolsonaro, já que até antes da pandemia de Covid-19 o Tribunal se dedicava a julgar casos envolvendo conflito armado e ataques contra a população civil. A opinião é da ex-juíza do TPI, Sylvia Steiner, que atuou em Haia de 2003 a 2016, e é desembargadora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3).

Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Steiner disse que as denúncias representam tecnicamente motivo para a abertura de investigação, mas isso dificilmente ocorrerá. A opinião da magistrada tem como base precedentes do TPI, que até então tinha como foco casos de crime contra a humanidade de outra natureza. “Acho muito difícil que um caso que envolva a questão de políticas públicas possa ser levado adiante”, afirmou Sylvia Steiner.

Com a pandemia do novo coronavírus é a maior e mais grave dos últimos cem anos e autoridades de todo o planeta têm adotado medidas rígidas de combate à doença, não causará surpresa se o TPI decidir investigar Jair Bolsonaro, que vem tratando a crise sanitária com deboche e politizando os fatos.

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