Retomar as aulas no “escuro”, em escolas pública e privadas, é fazer da Covid-19 uma roleta-russa

 
A retomada das aulas em escolas públicas e privadas, suspensas em razão da pandemia do novo coronavírus, está provocando enorme polêmica em todo o País, com autoridades recuando em decisões tomadas de afogadilho e debaixo da pressão das instituições particulares, que lutam para evitar que o caixa mingue.

Em São Paulo, mais importante unidade da federação e que concentra 20% da população nacional, o retorno às aulas ainda é uma incógnita. De chofre falou-se que as aulas seriam retomadas em 16 de setembro próximo, mas foi adiada para meados de outubro, sem a certeza de que isso realmente acontecerá.

Na capital paulista, escolas particulares recorreram à Justiça contra a decisão do prefeito Bruno Covas, que decidiu aguardar mais tempo para definir a data do retorno às aulas. Gostem ou não da decisão de Covas, é preciso reconhecer que o prefeito da maior cidade brasileira está coberto de razão, pois a pandemia de Covid-19 continua fazendo estragos.

Muito se falou sobre a capacidade de crianças e jovens terem maior resistência ao novo coronoavírus, mas estudo recente, realizado por professores da Universidade de Harvard (EUA) e publicado no Journal of Pediatrics, demonstrou que a carga viral de SARS-CoV-2 nas crianças é muito maior do que se imaginava, principalmente nos dois primeiros dias da infecção. Além disso, pelo fato de a maioria das crianças e dos jovens serem assintomáticos, a possibilidade de transmissão da doença é enorme.

As crianças infectadas pelo novo coronavírus mostraram nível significativamente mais alto do vírus nas vias aéreas do que adultos hospitalizados em UTIs para tratamento da Covid-19, de acordo com o Massachusetts General Hospital (MGH), instituição afiliada à Universidade de Harvard, e o hospital infantil Mass General (MGHfC).

 
O estudo avaliou 192 pessoas com idade entre 0 e 22 anos, a maioria crianças. Destas, 49 crianças testaram positivo para a Covid-19 e outras 18 tiveram início tardio da doença. Até então, acreditava-se que como as crianças têm menor número de receptores imunológicos para o Sars-CoV-2, eram menos propensas a se infectar ou ficar gravemente doentes.

Mesmo que os estabelecimentos educacionais adotem as necessárias medidas de proteção e higienização, o comportamento do novo coronavírus a cada dia tem um novo capítulo. Para piorar o cenário, o Brasil é um dos países com menor índice de testagem para a Covid-19, o que explica o interesse de laboratórios farmacêuticos envolvidos no desenvolvimento de vacinas contra a doença em realizar testes com brasileiros.

Com 209,5 milhões de habitantes, o Brasil realizou até julho passado 13,3 milhões de testes para Covid-19, ou seja, foram testados 6,3% da população. Desse total de testes, menos de 40% são do tipo RT-PCR, capaz de identificar se o vírus está ativo no corpo humano. Ademais, o teste RT-PCR permite identificar infecções e rastrear contatos.

Eterno paraíso do “faz de conta”, o Brasil realizou em maior número testes sorológicos, que possibilitam identificar se a pessoa já teve contato com o novo coronavírus. Ou seja, os testes sorológicos são como paleontologistas da Covid-19, pois detectam o passado, enquanto um eventual retorno às aulas depende, em termos virais, do presente e do futuro.

Alguns especialistas afirmam ser impossível realizar testes RT-PCR no Brasil em razão do número de habitantes. De tal modo, o melhor é aguardar o País sair do platô da Covid-19 para, na sequência, retomar as discussões sobre o retorno às aulas e como isso acontecerá. Até lá, qualquer medida açodada será como uma roleta-russa.

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