De olho na reeleição, Bolsonaro suspende “Renda Brasil” e dá três dias para Guedes apresentar novo projeto

 
Quem acompanha a política brasileira com proximidade e há alguns pares de anos sabe que o presidente Jair Bolsonaro, mesmo tendo retomado seus rompantes totalitaristas, vestirá a cangalha do falso democrata porque está de olho na reeleição. E não será com a facilidade que os palacianos imaginam que o Congresso Nacional dará a Bolsonaro a senha para um novo mandato.

As incursões oficiais nas regiões Norte e Nordeste, antigos redutos petistas, e a maquiagem em alguns programas sociais, como “Minha Casa, Minha Vida” e “Bolsa Família” comprovam o desejo do presidente de, rasgando discursos pretéritos, contemplar as camadas mais desassistidas da sociedade para alargar o caminho rumo à reeleição.

O programa “Renda Brasil”, reedição travestida do Bolsa Família, ficou no laboratório da equipe econômica para dar continuidade ao auxílio emergencial, com a devida readequação dos grupos beneficiados, mas acabou suspenso por desentendimentos entre o presidente da República e o ministro Paulo Guedes, da Economia.

Enquanto Guedes defende o teto de R$ 247 para o benefício a ser pago pelo Renda Brasil, Bolsonaro só aceita discutir o assunto se o valor for a partir de R$ 300. O ministro da Economia sinalizou que concorda com o valor sugerido, desde que outros benefícios sejam cortados para garantir recursos ao Renda Brasil. Entre os benefícios que podem ser extintos estão o abono salarial, o salário-família, o seguro-defeso e a Farmácia Popular.

“Ontem discutimos a possível proposta do Renda Brasil. E eu falei ‘está suspenso’, vamos voltar a conversar. A proposta, como a equipe econômica apareceu para mim não será enviada ao Parlamento. Não posso tirar de pobres para dar a paupérrimos. Não podemos fazer isso aí”, disse Bolsonaro nesta quarta-feira (26), durante evento em Minas Gerais.

Apesar de a proposta de Guedes ser míope em termos sociais, é preciso que o governo sinalize a fonte dos recursos para o Renda Brasil. No caso da possível extinção da Farmácia Popular, ao menos 20 milhões de brasileiros recorrem ao programa no momento de adquirir medicamentos, muitas vezes de uso contínuo. Ao eliminar o programa, o governo federal abre em outra ponta um novo escoadouro de dinheiro público. Isso porque brasileiros que deixarão de ter acesso a medicamentos através do Farmácia Popular acabarão na rede pública de saúde, quase sempre saturada, em especial em tempos de pandemia.

Em relação ao seguro-defeso – recurso pago aos pescadores durante o período de reprodução dos peixes, quando a pesca é proibida –, o melhor é promover uma devassa no programa, eliminando do rol de beneficiários pessoas que jamais souberam na prática o que é pescar. Há alguns anos, o UCHO.INFO denunciou um esquema fraudulento no seguro-defeso, mas as autoridades preferiram fechar os olhos para uma ação criminosa.

 
No tocante à proposta de usar recursos do abono salarial para bancar o Renda Brasil, Bolsonaro descartou essa possibilidade. “Por exemplo, a questão do abono para quem ganha até dois salários mínimos, que seria como um décimo quarto salário… Não podemos tirar isso de 12 milhões de pessoas para dar a um Bolsa Família, um Renda Brasil, seja lá o que for o nome do programa”, disse o presidente.

Independentemente do que fala Bolsonaro, a extinção do abono salarial só é possível por proposta de emenda à Constituição (PEC), que exige votos de três quintos de deputados federais e senadores para ser aprovada, em duas votações em ambas as Casas legislativas. E o governo não tem esse apoio no Congresso para aprovar a tal PEC.

O seguro-defeso e o salário-família, que também estão na mira de Paulo Guedes, só podem ser extintos através de projeto de lei, o que exige apoio da maioria simples de deputados e senadores. Como a proposta é polêmica e mexe no bolso do trabalhador, será difícil o governo conseguir apoio para aprovar a medida.

Bolsonaro, a exemplo do que vem afirmando o UCHO.INFO nos últimos anos, defende que a geração de empregos continua sendo o “melhor programa” para o Brasil. “Ou o Brasil começa a produzir, a fazer um plano que interessa a todos nós, que é o emprego, ou estamos fadados ao insucesso. Não posso fazer milagre”, disse o presidente.

Se para bom entendedor meia palavra é mais que suficiente, Paulo Guedes está com um pé dentro da fritura política. O presidente deu à equipe econômica prazo de três dias para a apresentação de nova proposta sobre o Renda Brasil.

Em vez de recorrer ao populismo tosco e barato para garantir sua eventual reeleição, Bolsonaro deveria se debruçar sobre proposta de emenda à Constituição (PEC) que altera o teto de gastos, que se antes da pandemia do novo coronavírus não era eficaz, depois da crise da Covid-19 a suposta eficácia terá desaparecido.

Não se trata de torrar o dinheiro público, mas de aceitar a realidade economia do País e modular os gastos, com o devido freio do Congresso, de maneira que permita a retomada do crescimento econômico. Não será com discursos bravateiros e aumento da carga tributária, como quer Paulo Guedes, que o Brasil sairá do atoleiro.

O momento não é propício para discursos sobre liberalismo econômico, em que pese a necessidade do País de se livrar das amarras da burocracia estatal e perseguir o equilíbrio fiscal. Se nada for feito, o brasileiro deve se preparar para o pior. Lembrando que a conta dessa patacoada bolsonarista será paga mais adiante pelos jovens que acabaram de ingressar no mercado de trabalho. Ou seja, Bolsonaro não quer o melhor para o Brasil, mas o que garanta sua reeleição daqui a dois anos.

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