O fato digo como o fato foi

    (*) Carlos Brickmann

    O presidente Bolsonaro demitiu o ministro da Defesa e os comandantes das três Armas. Cada um fez seu manifesto, seus substitutos assumiram logo em seguida, e o país continuou vivendo sua vida normal, sem crise. Esta é a versão nº 1 do Gabinete do Ódio: os generais caíram e a vida continua. Fora, naturalmente, a economia desorganizada e paralisada, o Congresso forçando Bolsonaro a demitir seu chanceler inacreditável, mas nomeando para outros cargos pessoas por quem nem o Capitão Gancho botaria a mão no fogo. E, se já morreram mais de 300 mil pessoas, que outra crise caberia no país?

    A versão nº 2 do Gabinete do Ódio desmente a primeira: diz que, um dia, Bolsonaro descobriu que seu ministro da Defesa era amigo, veja só, de Dias Toffoli, ministro do Supremo que tinha sido advogado do PT. E conspirava com os comandantes das três Armas para impedir o presidente de governar. Bom, se Bolsonaro não sabia que seu ministro da Defesa tinha sido assessor militar de Toffoli, na época presidente do Supremo, é que não anda lendo nem a propaganda de seu governo. Não aceita divergências eventuais: quem discorda é sempre alguém infiltrado há um tempão só para prejudicá-lo.

    O fato como o fato foi: Bolsonaro, de novo, quis apoio dos generais para seu projeto autoritário. De novo não o teve. Demitiu-os e mandou falar mal deles. E volta a contar soldadinhos de chumbo. Quem sabe um dia dá certo?

    Sem fantasia

    Algum dos caros leitores acha que Bolsonaro precisa de ajuda para não conseguir governar? Há funções que, sozinho, ele exerce muito melhor.

    O bem da família

    Quando Bolsonaro quis nomear seu filho Eduardo “Bananinha” (apelido que lhe foi dado pelo vice, general Mourão) para a Embaixada do Brasil em Washington, disse que era natural que entregasse o filet mignon para a sua família. Pois é: para a população em geral, ele recusou a oferta de vacinas da Pfizer, entrou no consórcio internacional que garantiria vacinas mais baratas com a cota mínima, votou na ONU contra a quebra de patentes das vacinas para permitir que vários países as produzissem, permitindo a imunização de muito mais gente em muito menos tempo, disse que quem tomasse a vacina da Pfizer podia virar jacaré, desprezou a vacina do Butantan por achar que os chineses não sabiam fazer coisa boa, chamou-a de “vachina”.

    Mas sua mãe o presidente mandou vacinar. E sua nora, esposa do senador Flávio Bolsonaro, o filho 01, foi vacinar-se no dia 2. Família merece sempre maior atenção. Já dizia Chico Anysio que o povo é apenas um detalhe.

    As opções

    Frase interessante circulando na Internet lembra o que o deputado Winston Churchill disse dos políticos que o antecederam no governo do Reino Unido e cansaram de adotar opções erradas: “Entre a pandemia e a recessão, Bolsonaro escolheu a pandemia. E está tendo a recessão”.

    Os bons companheiros

    Convenhamos: se Bolsonaro fosse presidente (ou, como é a moda, CEO) de uma grande empresa, dificilmente se manteria no cargo por dois anos. Mas quem se opõe a ele, se estivesse no Conselho da empresa, iria rodar ou ao mesmo tempo ou muito antes. Até o frentista do Imposto Ipiranga sabe que a economia brasileira está em crise. No meio desta crise, militares se abastecem com 80 mil litros de cerveja (em boa parte importada), 700 mil kg de picanha, o Supremo faz aquela concorrência de comida finíssima, com acompanhamento de vinhos premiados internacionalmente, e o Congresso – parece incrível – ainda conseguiu melhorar o seguro-saúde das Excelências.

    A saúde de quem pode

    O parlamentar podia gastar até R$ 50 mil com reembolso automático (mais do que isso, a Presidência da Casa podia autorizar o que fosse necessário. Jamais o negou. O céu sempre foi o limite, e os nobres parlamentares pagam, cada um, R$ 650,00 mensais pelo seguro-saúde da família). Pois bem: os R$ 50 mil passaram para quase R$ 200 mil. E isso não foi questionado pelo pessoal da oposição – aliás, a oposição votou também nos candidatos do Centrão, lançados e apoiados por Bolsonaro.

    Não há santo em Brasília. Pense o que pensar, cada um pensa no que é bom para si.

    Se vira nos 30

    Para a população em geral, a vida é outra. O historiador mineiro Daniel Marques recebeu um boleto cobrando reajustes sobre um plano cancelado no ano passado. Detalhe: Marques cancelou o seguro exatamente porque não era atendido pelo pessoal do plano, tendo de protestar no “Reclame Aqui” e na Agência Nacional de Seguridade Suplementar. Atendê-lo ninguém atendia, mas cobrar reajuste de plano já cancelado há cinco meses, isso eles fazem. Ainda não estou publicando o nome da empresa por não ter tido contato com ela. Mas ainda faremos a publicação com todos os detalhes.

    Há gente que encara o cliente apenas como uma vaca leiteira a ordenhar.

    (*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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